Parentes de idosos sobre anúncio de fechamento de asilos: “Desespero”
Com novas exigências do GDF, três lares que abrigam idosos ameaça fechar as portas. Instituições não conseguirão se manter financeiramente
atualizado
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Familiares e voluntários estão preocupados com o iminente encerramento das atividades em três asilos no DF. As instituições oferecem moradia, alimentação, atendimento psicológico, serviço de enfermagem, fisioterapia e assistência social a pessoas da terceira idade. Sem condições de receberem os idosos de volta em casa, familiares temem ficar desamparados.
A mãe de José Scigliano Rocha, 38 anos, mora há dois anos no Lar São José, em Sobradinho. Carmen Arlete Scigliano Rocha, 69 (foto em destaque), sofre de demência e precisa de acompanhamento integral. Assustado com a possibilidade de a instituição fechar as portas, o analista de estoque contou ao Metrópoles que, infelizmente, não tem estrutura para receber a mãe em casa, nem condições financeiras de pagar por uma clínica particular.
Com novas exigências do GDF, Lar dos Velhinhos ameaça fechar as portas
“No início, minha esposa deixou de trabalhar para cuidar da minha mãe, mas ela ficou muito debilitada e minha mulher não dava mais conta. Também ficamos com a situação financeira muito apertada, com menos uma renda dentro de casa. Se acontecer do o lar fechar, não sei o que vamos fazer. Uma clínica particular é muito fora da nossa realidade, não temos como pagar. É um desespero muito grande”, lamenta José.
Em fevereiro, o GDF passou a exigir, por meio do Edital nº 006/2022 da Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes-DF), que os Serviços de Acolhimento para Idosos recebam pacientes com doenças infectocontagiosas, dependentes químicos e com transtornos mentais.
O Lar dos Idosos alega não ter infraestrutura e profissionais qualificados para receber pessoas nessas condições. Dessa forma, terão de romper a parceria com o Executivo local e devem fechar as portas por falta de verba. Com o possível fim das atividades, 217 idosos serão afetados diretamente e 194 colaboradores ficarão desempregados.
“Esses três pontos são complicadíssimos de trabalharmos. Temos um ambiente cheio de pessoas com baixa imunidade; então, receber um idoso com qualquer doença infectocontagiosa coloca em risco a vida de outros pacientes. Não somos um hospital ou uma clínica psiquiátrica. Também não temos profissionais nem estrutura para atender idosos com transtornos mentais ou dependências”, ressalta o vice-presidente do Lar dos Velhinhos Maria Madalena, no Núcleo Bandeirante, Nelson Sanchez.
Veja edital completo:
Desamparo
Uma moradora de Planaltina, que preferiu não se identificar, está com a mãe, 65, abrigada há dois anos no Maria Madalena. A filha cuidou da idosa por seis meses, mas após esse período precisou do suporte da instituição. A idosa sofre de esquizofrenia.
“Tenho uma filha pequena e é muito complicado cuidar de uma criança e de um idoso doente. Ela fica agressiva e eu tinha até medo de acontecer alguma coisa. Sei que no abrigo ela tem todo suporte e equipe preparada para cuidar dela. Dentro da minha casa, não tem condição”, revela.
A comerciante também se preocupa com a questão financeira para manter a mãe em outro lugar. De acordo com ela, o salário que recebe não dá para pagar uma clínica particular. “Se eu tivesse condição financeira, seria diferente. Esse amparo, de abrigo, o estado tem que dar. Tem idoso que está lá que não tem nem amigo, eles vão pra onde?”, questiona.
Uma moradora do Guará também está preocupada com a situação da mãe, que tem 80 anos. A idosa está no Lar Bezerra de Menezes, em Sobradinho, e mora no abrigo há quatro anos, desde que a filha não conseguiu mais atender as demandas dela. A mulher sofre de Alzheimer e está acamada.
“Cuidei com todo carinho e amor por anos. Saí do meu emprego e vivia para cuidar da minha mãe. Chega uma hora que não damos mais conta. Foi quando conheci o Lar dos Velhinhos e decidi que seria o melhor para nós duas. Se a instituição fechar, terei de sair do meu emprego novamente e não sei como manterei nós duas financeiramente. Fico abalada só de pensar na possibilidade”, explica.
Ao Metrópoles, a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes-DF) alegou que, independentemente do fim da parceria com as instituições em questão, nenhuma pessoa idosa vai ficar desassistida ou desamparada; uma vez que, caso isso ocorra, “uma nova parceria vai acolher esses cidadãos”.
Além disso, a pasta ressalta que o acolhimento institucional sem discriminação para idosos com doença infectocontagiosa, transtorno mental e dependência química é uma exigência legal previstas pelo Sistema Único de Assistência Social (Suas).
Aumento da renda per capita
O edital também prevê reajuste de 13,51% no repasse por idoso atendido. De acordo com Nelson Sanchez, o valor não é suficiente para suprir os gastos da instituição Maria Madalena. O último reajuste havia sido em 2016. “O valor repassado não acompanha os custos. Basicamente, o repasse do GDF apenas paga a folha de pagamento. Com o início da pandemia, tivemos um gasto mensal de R$ 35 mil só com Equipamento de Proteção Individual (EPIs)”, pontua.
Segundo o vice-presidente, mesmo com o apoio financeiro do governo, o local sempre recorreu a almoços beneficentes, bazares e outros eventos de captação de recursos e doações da comunidade. Apesar do repasse insuficiente do GDF, as instituições alegam que não conseguirão manter as portas abertas sem a parceria.
“Nosso problema é de estrutura. Mesmo se o GDF aumentar a ajuda per capita, a gente não consegue receber esses idosos. E, se não tiver mais a parceria, infelizmente, não conseguimos manter a instituição”, lamenta Rodrigo Lima, coordenador do Lar São José.
Leia nota do GDF na íntegra
“A Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes) informa que o Instituto Integridade Lar dos Velhinhos Maria Madalena é instituição parceira desta pasta na oferta do Serviço de Acolhimento para Idosas, da Política Pública de Assistência Social.
Acerca dessa parceria, vale frisar que:
– Não existem repasses em atraso;
– O chamamento público de um novo edital é uma obrigação legal que a Sedes está cumprindo;
– O GDF está com edital de chamamento público aberto para recebimento de propostas, a qual a instituição em questão pode participar;
– Existe, nesse novo edital, a ampliação de vagas de 249 para 330;
– A Sedes atualizou o valor de referência com base no IPCA. De 2019 a 2022 o valor de referência foi reajustado em 19,85%;
– O edita foi elaborado com base nas normas e legislações do Sistema Único de Saúde;
– O quantitativo de vagas foi planejado conforme demanda existente.
Esclarecimentos feitos, é importante destacar que, independentemente, do fim da parceria com a instituição em questão, nenhuma pessoa idosa vai ficar desassistido ou desamparado; uma vez que, caso isso ocorra, uma nova parceria vai acolher esses cidadãos.
É importante ressaltar também que, está estabelecido em edital o acolhimento aqueles com dependências ligadas a álcool ou a drogas, ou que tenham doenças contagiosas.
Mais do que estabelecido em edital, o acolhimento institucional sem discriminação para essas pessoas é uma exigência legal previstas pelo Sistema Único de Assistência Social (Suas), inclusive para recebimento por parte do GDF de repasse federal adicional de 5 a 15% para tais casos.
Neste momento, está aberto edital de chamamento para acolhimento de pessoas idosas, o qual a secretaria enfatiza a necessidade de atendimento a idosos de diversos perfis, sem discriminação por condição de mental, física ou de saúde, conforme item 1.4.4 do anexo V do edital 6/2022.
Qualquer instituição que tenha inscrição no Conselho de Assistência Social pode se candidatar para oferta do serviço de acolhimento par pessoas idosas, nos termos do edital. Por fim informamos que a Sedes está em tratativa com a Secretaria de Saúde para o atendimento institucional de idosos por meio de parceria.
Para conhecimento, seguem alguns dos itens acerca do Edital 6/2022:
1.2.4. Nos termos do art. 19 do Decreto Federal n.º 9.921/2019, as Pessoas Idosas que tenham doenças que exijam assistência médica permanente ou assistência de enfermagem intensiva, cuja falta possa agravar ou pôr em risco a sua vida ou a vida de terceiros, não poderão ser acolhidas no Serviço de Acolhimento Institucional de que trata este Edital, devendo tal situação ser atestada por meio de avaliação médica.
1.2.5. É vedada a recusa de acolhimento em decorrência das situações elencadas no item 1.4.4 do Anexo V.
1.4.4. Será vedado o indeferimento de acolhimento em decorrência de:
a) necessidade de cuidados de saúde excepcionais, não intensivos (ostomias, sondas e curativos);
b) outras necessidades que não demandem de assistência médica permanente ou assistência de enfermagem intensiva;
c) doença infectocontagiosa;
d) uso abusivo de álcool e outras drogas;
e) falta de documentação civil;
f) ausência de benefícios sociais e/ou eventuais;
g) ausência de benefícios de caráter permanente;
h) curatela;
i) possuir transtorno mental;
j) possuir deficiência”.
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