Pais pressionam GDF a não interromper processo de oralização de surdos
Pais encaminharam ofício ao GDF pedindo para que acordo que prevê a alfabetização de forma oral de crianças surdas seja mantido
atualizado
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Os pais de crianças surdas estão apreensivos com mudanças que a Secretaria de Educação teria proposto fazer em acordo de cooperação com o Centro Educacional da Audição e Linguagem Ludovico Pavoni (CEAL-LP).
Na quarta-feira (13/9), a Associação dos Pais e Amigos do CEAL (APAC) encaminhou um ofício à pasta pedindo que não haja mudanças no atual modelo, garantindo a qualidade no processo de alfabetização por meio da oralidade aos meninos com deficiência auditiva. O acordo de cooperação atual tem vigência até dezembro, quando completa 60 meses.
“Fomos surpreendidos com a informação de que a SEEDF não teria a intenção de renovar o acordo em sua integralidade, extinguindo com ao menos um dos serviços ali previstos: a oferta de educação especial para os três primeiros anos do Ensino Fundamental (o Bloco Inicial de Alfabetização – BIA)”, destaca o documento.
O bloco é voltado para atender crianças com deficiência auditiva que sabem se comunicar pela fala, chamadas de oralizadas. São crianças em processo de aquisição da Língua Portuguesa em suas modalidades escrita e oral.
“A possível descontinuidade do programa prejudicaria a alfabetização de ao menos 70 crianças ao longo dos cinco anos de vigência do acordo, em uma fase em que os erros e acertos na educação têm efeitos duradouros e consequências para toda a vida”, reforça também a documentação.
“Todos os seus alunos têm pais, mães e responsáveis ouvintes, estando plenamente inseridos na cultura oral”, conforme documento. A associação dos pais informa no ofício destinado à secretaria que está disposta a recorrer a todos meios legais e instâncias cabíveis para assegurar o direito dessas crianças a uma educação ajustada às necessidades.
Dispositivo para ouvir
“O programa BIA está sendo muito importante para minha filha”, informou o presidente da associação, o servidor público Márcio Claudino Bessa, 51. Ele explica que a filha Isabela Martins Cirilo Bessa, 6 anos. “Ela é deficiente auditiva profunda bilateral e utiliza implante coclear bilateral”, isso significa que ela tem grau profundo de surdez nos dois ouvidos e para dar um conforto na audição usa um dispositivo que é implantável e permite restaurar a função auditiva.
“A aprendizagem dela está em constante evolução e penso que mudanças no programa BIA poderá afetar a inserção segura dela no ensino regular”, detalha Bessa. Segundo ele, o objetivo do ofício é sensibilizar a secretaria de que o programa BIA deve continuar como escola especializada, podendo ofertar a um número pequeno de estudantes o modelo de ensino.
A dona de casa Galba dos Santos Silva, 39, sai às 4 horas da manhã de segunda a sexta para levar o filho Caio, 10, às aulas no CEAL. Ele colocou o implante aos 3 anos e antes disso não falava nada. “O processo é lento e gradual. Começa com as vogais e o método das boquinhas, aí vai evoluindo começa a introdução das consoantes é em seguida palavras”, detalhou a mãe.
Enquanto aprende a falar, Caio aprende a ouvir. Enquanto uma criança sem deficiência auditiva começa a ter estímulos auditivos ainda no útero, a criança começa a aprender somente após o contato com o implante. Dessa forma, os pais alertam que ter uma educação voltada para esse modelo e com poucos alunos na sala é o ideal para o desenvolvimento dos filhos.
Inclusão faz de conta
“Posso dar um exemplo bem ilustrativo da diferença que faz aplicar as técnicas certas com uma criança surda usuária de aparelho”, explica a servidora pública, Roberta Lima Ferreira, 48, mãe de Letícia, 6.
“Se, na primeira escola, levou quase um ano letivo inteiro para Letícia falar os nomes de sua professora e de alguns alunos, no CEAL, ela já voltou do primeiro dia de aula falando o nome da professora e não levou uma semana para aprender os nomes de todos os coleguinhas da turma. Daí logo fez os seus “melhores amigos” e criou laços mais profundos com a turma e a escola”, conta.
Ela ressalta que o trabalho feito com o programa BIA é para desenvolver as habilidades iniciais de alfabetização, assim preparar essas crianças para que possam seguir os estudos numa escola regular e inclusiva.
“Essa é a inclusão de verdade, dar assistência, ensinar corretamente, Não só ‘jogar’ uma criança com eficiência ou necessidade especial numa turma de 20 alunos e esperar um intérprete de libras apenas ou que o professor se vire para atender às demandas específicas de cada um”, explica.
“Minha filha escuta, está lendo e fala”, comemora a dona de casa Evani de Souza Lopes, 42, sobre o progresso da filha Danyelle, 8, que ficou até os 5 anos sem falar. “Eu estou com o coração na mão, se mudar tenho medo de regressão em tudo que ela conseguiu”. Ela conta que a Danyelle antes só apontava com o dedo o que queria. “Lembro como foi quando ela começou a falar pela primeira vez, estava em clima natalino e parecia milagre.”
Também dona de casa Efigênia Rodrigues, 37, explica que a escola inclusiva para a filha Maria Clara, 7, seria uma falsa inclusão. “Eu tenho medo de encerrar o modelo atual e não tenho condição de dar o suporte igual”.
Outro lado
Procurados, o CEAL informou que as tratativas com a Secretaria de Educação estão em andamento e que até o momento o que se discute é se o modelo do BIA seria de escola especial – podendo ter turmas reduzidas – ou de escola inclusiva – sendo obrigado a ter mais de 20 alunos por turma.
Segundo o centro, há conversas e reuniões para que a demanda dos pais seja levada à secretaria e que a pasta tem se mostrado interessada em ouvir e a participar das discussões.
O Metrópoles procurou a Secretaria de Educação e aguarda resposta.