Pai que matou o filho no DF é dissimulado e de “poucas palavras”
Paulo Roberto Osório foi descrito assim por conhecidos e policiais. Os investigadores ficaram chocados com a frieza demonstrada na confissão
atualizado
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Frio a ponto de confessar ter matado o próprio filho por vingança, Paulo Roberto de Caldas Osório (foto em destaque), 45 anos, assustou até os investigadores mais experientes da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF). Aos policiais, relatou com tranquilidade e riqueza de detalhes as horas que antecederam o assassinato de Bernardo, morto com apenas 1 ano e 11 meses de idade.
Descrito por autoridades policiais, vizinhos e colegas de trabalho como “introspectivo”, “dissimulado” e “de poucas palavras”, o funcionário do Metrô-DF tinha facilidade para esconder das outras pessoas com quem se relacionava até mesmo os pormenores mais sórdidos da sua vida.
Osório foi capaz de ocultar o assassinato da própria mãe em 1992, do qual foi o autor. Apenas os vizinhos da quadra sabiam da história, ocorrida na mesma residência onde a Polícia Civil acredita que Bernardo tenha sido morto. Foi, inclusive, um morador da 712 Sul que revelou à mãe do bebê, Tatiana da Silva, 30, o homicídio cometido pelo agente de estação do Metrô em 1992.
A mulher só soube desse crime 17 anos após o fato. Pelo assassinato da mãe, Osório cumpriu pena de 10 anos na ala psiquiátrica da Papuda. Na ocasião, ele tinha apenas 18 anos. Segundo a polícia, a vítima foi surpreendida por Paulinho, como era chamado à época, assim que chegou em casa: o então jovem esfaqueou e enforcou a mãe. Em seguida, queimou o corpo dela.
Solto em 2002, Osório voltou ao endereço onde cometeu o matricídio. Dividiu a casa da família com o pai, Paulo Jarbas, até fevereiro deste ano – quando o progenitor morreu, em decorrência de falência múltipla dos órgãos. Sozinho, o homem voltou a apresentar sinais dos transtornos psiquiátricos que o levaram à reabilitação, segundo os vizinhos. Chegou a se afastar do trabalho por licença médica.
Osório usava medicamentos controlados. Para insônia, tomava hemitartarato de zolpidem: remédio que ajuda pacientes com insônia adormecerem.
Aos investigadores da Delegacia de Repressão a Sequestro (DRS), da PCDF, Osório afirmou ter dopado o pequeno Bernardo com o sonífero usado em seu tratamento. A morte, conforme contou, teria sido provocada por uma superdosagem do medicamento.
Em seu relato à polícia, o homem disse ter diluído três comprimidos da substância no suco de uva que deu ao filho.
Saiba como ocorreu o crime, na versão do pai de Bernardo:
De pouca conversa
Os colegas de trabalho nunca desconfiaram do comportamento de Paulo Roberto de Caldas Osório, que atuava como agente de estação da Companhia do Metropolitano (Metrô-DF) na 112 Sul, próximo de onde morava. Para empregados do local, o homem aparentava ser “um cara calado e de pouca conversa”.
A notícia do crime assustou os colegas. “Recebi com surpresa essa notícia. Ele era muito na dele, mas nunca imaginei que fosse capaz de algo tão bárbaro”, diz um funcionário do Metrô que pediu para não ser identificado. “Era muito reservado. Conversávamos sobre música, bichos de estimação. Paulo sempre se disse um amante dos animais”, relembra.
Veja fotos sobre o caso:
“Periculosidade”
Preso na Bahia, o metroviário passou por audiência de custódia nessa quarta-feira (04/12/2019). Na decisão em que converte a prisão de Osório em preventiva, o juiz do Tribunal do Júri de Brasília, Fellipe Figueiredo de Carvalho, ressaltou a crueldade do ato, classificado pelo magistrado como “extremamente grave”. “Cuida-se de homicídio triplamente qualificado e ocultação de cadáver, que o autuado teria cometido contra o próprio filho, criança de 1 ano e 11 meses de idade”, destaca.
Tudo isso demonstra frieza, ousadia ímpar e extrema periculosidade, bem como a necessidade da constrição cautelar para garantia da ordem pública, não sendo suficiente a concessão de liberdade provisória ou a aplicação de medidas cautelares diversas da prisão
Trecho de decisão do juiz Fellipe Figueira de Carvalho, do Tribunal do Júri de Brasília
Para o juiz, Osório não aparentou ter “qualquer tipo de perturbação mental”. “Consciente, localizado no tempo e no espaço, com raciocínio concatenado e fala fluída e harmônica”, diz trecho da sentença.
A mesma frieza observada pela Justiça fica evidente durante o depoimento colhido pelos investigadores da DRS. Na conversa, na qual confessa o crime, Osório admitiu que estava chateado com a mãe da criança, pois a mulher recorreu à Justiça em busca de pensão para o filho. “Eu estava num momento de necessidade. Meu pai tinha morrido. Teve a greve do Metrô. E ela não precisava do dinheiro”, pontuou (veja vídeo abaixo).
O homem revelou como deu a medicação para Bernardo, quando descobriu que o filho havia morrido e por que decidiu descartar o corpo às margens da rodovia que liga os estados de Goiás e da Bahia: “Pensei na merda que ia dar”. Toda a história é contada sem emoção, com frieza.
Questionado sobre a sensação sentida ao ver o filho morto, Osório falou que evita pensar no assunto. “Ele [Bernardo] era minha alegria. Tudo que eu tinha era ele”, disse. O momento da declaração é o único em que o homem se impacienta na cadeira e mostra alguma sensibilidade.
Confira:
Obsessão pelo filho
Mesmo desconfiados de Paulo Roberto Osório, os vizinhos jamais imaginariam que ele seria capaz de assassinar o próprio filho. O homem foi descrito pelos moradores da quadra do Plano Piloto onde mora como “um bom pai”. Demonstrava carinho e apreço por Bernardo. “O pai era apaixonado pelo menino e o filho, por ele. Era tanto apego que [o bebê] só queria colo. [Osório] Rodava a quadra toda para fazer ele dormir. Dói no fundo da alma, é algo sem explicação”, ressalta uma vizinha.
Para os investigadores, não há dúvidas de que o pai era obcecado pelo garoto. No celular apreendido com o metroviário, policiais da DRS verificaram inúmeras fotos do menino na galeria de imagens. No histórico de pesquisas do aparelho, os investigadores constataram que o homem realizava diversas buscas na internet sobre locais para levar Bernardo, brinquedos e brincadeiras que eventualmente faria com o filho.
A obsessão destoa da tranquilidade com que o homem narrou o momento da morte do menino. O relato surpreende, também, especialistas. Para a psicóloga Chris Borges, a frieza do acusado diante da situação chama a atenção. “Eu não o conheço profundamente e, por isso, não posso afirmar que ele é ou não um psicopata. Traçar um perfil sem conhecê-lo seria injusto. No entanto, quando leio o relato, frio e distante, ele me dá sinais de alguém antissocial, talvez psicopata ou esquizofrênico paranoide”, pontua.
Segundo a especialista, mesmo após ficar 10 anos internado em ala psiquiátrica, Osório não poderia estar sem acompanhamento psicológico.
“Uma pessoa com um histórico anterior não pode ser solta sem voltar a ser tratada. É necessário acompanhamento constante. Ele, claramente, tem um transtorno que não tem cura. Me surpreende muito o fato de ter conseguido a aprovação no concurso público e acesso a medicamentos controlados para dormir. É preciso perguntar qual profissional os receitou e quem não observou seu histórico na hora da contratação [no Metrô-DF]”, criticou Chris.
A psicóloga se refere à aprovação de Paulo em seleção pública do Metrô. Três anos após deixar a ala psiquiátrica da Papuda, o homem foi admitido no concurso para integrar quadro de funcionários da Companhia do Metropolitano do Distrito Federal. Em documento obtido pela reportagem, o nome do assassino confesso de Bernardo aparece entre os selecionados no “resultado provisório na avaliação de aptidão física e na avaliação psicológica”. A publicação, de 28 de março de 2005, é da banca organizadora do certame na época.
Antes de fugir com o garoto, no entanto, o agente de estação pediu afastamento do trabalho por 60 dias com base em “licença psiquiátrica”.
Vingança
A polícia não tem dúvidas de que o crime foi planejado por Paulo Roberto Osório como vingança contra a ex-mulher. Os investigadores também acreditam que a criança morreu na casa do pai, na 712 Sul. O homem disse que misturou três comprimidos de medicação controlada em um suco de uva. Ele deu a bebida para o filho quando o pegou na escola, na Asa Sul, na tarde de sexta-feira (29/11/2019). O objetivo era que Bernardo dormisse durante o trajeto até Minas Gerais. A criança, porém, teria passado mal, vomitado e, depois, morrido.
“Fizemos buscas na residência [do acusado] e encontramos uma caixa de remédios [para dormir], copo de água infantil e muitos resquícios de vômito. O material foi encaminhado à perícia”, explicou o delegado-chefe da Divisão de Repressão a Sequestro, Leandro Ritt, durante coletiva de imprensa nessa quarta-feira (04/12/2019).
Paulo sempre tinha o costume de buscar o filho na creche e depois devolvia, à noite, para a mãe, no Lago Sul. Na sexta, mudou os planos. “Ele afirmou que sempre teve vontade de pegar o filho e sumir, só não fez antes pois estava trabalhando e não tinha dinheiro. Atualmente, ele estava em licença psiquiátrica com afastamento de 60 dias do trabalho”, completou o responsável pela investigação do caso.