Padre Moacir recebeu R$ 950 mil a pedido de Gim e Agnelo. Ouça áudio
Um recibo no valor de R$ 350 mil endereçado à OAS arrastou um dos padres mais populares do Distrito Federal para dentro da Lava Jato
atualizado
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No último dia 4 de abril, o padre Moacir Anastácio de Carvalho recebeu um ofício do Ministério Público Federal do Paraná. O documento cobrava explicações do religioso sobre uma suposta doação feita pela OAS à Paróquia São Pedro, em Taguatinga Sul, que ele comanda.
Nesta segunda-feira (11/4), o padre Moacir respondeu ao ofício. Em quatro páginas, organizadas em 14 tópicos, a que o Metrópoles teve acesso, ele relatou a origem e a destinação desse dinheiro. Mais que isso, revelou que além de a sua paróquia ter recebido os R$ 350 mil da OAS, também foi agraciada com R$ 300 mil da Andrade Gutierrez.Em entrevista exclusiva ao Metrópoles, padre Moacir revelou ainda que a paróquia recebeu outros R$ 300 mil da Via Engenharia, como doação para a realização da festa de Pentecostes. Segundo afirmou o padre Moacir, a doação da OAS foi feita a pedido do ex-senador Gim Argello, preso na manhã desta terça-feira (12/4), durante a 28ª fase da Lava Jato.
Quanto às doações da Andrade Gutierrez e da Via Engenharia, o padre fez uma revelação surpreendente. Quem teria intermediado o pedido de doação para a festa de Pentecostes, agora na mira da Polícia Federal, foi o ex-governador do DF Agnelo Queiroz (PT).
O padre Moacir afirmou que as doações, que somaram quase R$ 1 milhão, foram todas feitas em 2014, ano de eleições e de Copa do Mundo. As três empreiteiras eram responsáveis pela construção de estádios utilizados no Mundial, agora também no escopo de investigações da operação da PF e do MPF.
Há 19 anos, o padre Moacir comanda a paróquia de São Pedro, em Taguatinga. Há 17, ele organiza a festa de Pentecostes na cidade. O religioso nunca havia recebido uma quantia tão robusta como as doações de 2014. Ele diz que ficou “admirado”, que recebeu o valor “com gratidão” e que “não tinha a obrigação de saber a origem do dinheiro”.
Leia a íntegra da entrevista que o religioso concedeu ao Metrópoles:
Padre Moacir, por que a igreja está sob os holofotes da Lava Jato?
Na festa de Pentecostes nós fazemos uma campanha que começa na Quarta-feira de Cinzas, com a distribuição de envelopes e venda de camisetas, pedindo ajuda a empresários e a pessoas físicas também. Em 2014, um dos coordenadores da semana de Pentecostes foi o deputado Washington Mesquita. Na época, ele pediu ao senador Gim para arrumar empresas que pudessem nos ajudar. E ele arrumou a OAS, que nos doou R$ 300 mil. A empresa depositou diretamente na conta da Paróquia de São Pedro, e eu mandei um recibo para a empresa. Está contabilizado. Com outras empresas, mais umas duas, aconteceu a mesma coisa. A Andrade Gutierrez também doou uma quantia, de R$ 300 mil reais, a pedido do governador Agnelo. Agnelo também pediu (dinheiro) para a festa da Pentecostes, e foi nos doado também. Então, foi tudo por doação diretamente na conta da Paróquia de São Pedro. E eu mandei os recibos das doações.
O ex-governador Agnelo Queiroz também pediu…
Pediu para a André Gutierrez (uma terceira pessoa corrige o padre)… Sim, para a Andrade Gutierrez
Para a empreiteira, não é isso?
É para a empreiteira pediu também.
No valor de quanto?
De R$ 300 mil.
O senhor falou que ainda tem um terceiro pedido. Qual seria?
É um terceiro pedido, só que esse terceiro pedido eu não sei se está, se essa empresa está na Lava Jato.
Qual seria?
Parece que… espera só um minutinho… a Via, a Via Engenharia. O governador também pediu para ela nos doar. Ela doou R$ 300 mil diretamente na conta da Paróquia São Pedro, e eu mandei entregar o recibo.
Então, nos três casos, o senhor agiu da mesma forma e mandou o recibo?
Da mesma maneira. Não fui eu que pedi, não fui eu que pedi. A primeira aí, de R$ 350 mil da OAS, foi o senador Gim que conseguiu, com o conhecimento dele, porque ele é frequentador de Pentecostes há mais de 10 anos. E essas outras duas (doações) aí, foram o ex-governador Agnelo (que pediu). Ele também frequentava a Pentecostes e propôs nos ajudar, já que eu não aceito nada público, nenhum dinheiro público, nenhuma emenda pública. Nunca aceitei, e trabalho exatamente com doações, como estou fazendo agora com a Pentecostes. Nós estamos pedindo doações para todo o mundo, (fazendo) envelope, venda de camisetas, enfim…
Padre, essas doações — uma de R$ 350 mil e depois mais duas cotas de R$ 300 mil — foram referentes à Pentecostes de que ano?
2014.
Foi a primeira vez que o senhor recebeu esse tipo de doação de empresa para a realização da festa de Pentecostes?
Não, eu sempre recebo doações, mas dessas empresas, acho que foi a primeira vez. Dessa OAS, foi a primeira vez, através do senador, nunca tinha recebido. Então, em 2014, foi só isso.
Nos outros anos, o senhor recebia o mesmo volume de dinheiro?
Não, não. Só em 2014 que teve isso.
O fato de ter ocorrido justamente em um ano eleitoral não parece estranho para o senhor?
Não, porque a gente faz a festa de Pentecostes todo ano, e pede para todo mundo todo ano, como eu estou fazendo agora, pedindo também para os empresários e as pessoas.
Quando é a festa de Pentecostes deste ano?
Começa no dia 8 de maio e termina no dia 15.
Então está prestes a acontecer…
Prestes a acontecer, e nós estamos na campanha, vendendo camisetas, distribuindo envelopes e pedindo para as empresas, pedindo para todos.
Neste ano, o senhor já conseguiu quanto das empresas?
Olha, eu ainda não sei porque só tenho promessas até agora. Até agora, só tenho conseguido promessa.
O senhor acabou envolvido em suspeitas investigadas no âmbito da Lava Jato. Como o senhor, que tem uma grande influência na comunidade do Distrito Federal, especialmente em Taguatinga, se sente? O que o senhor acha que aconteceu, Padre Moacir?
Simplesmente, acho que a Lava Jato está fazendo o trabalho dela, pesquisando, com muito sucesso. E deve ter encontrado — eu acho que eles encontraram — o recibo que eu havia dado em 2014 para a OAS. Aí, a partir disso, eles pesquisaram. Eu respondo pela paróquia, e falei para eles isso. Só posso falar a verdade.
A Lava Jato descobriu esse recibo e o senhor relatou para a gente outros dois episódios. Um envolvendo a Andrade Gutierrez e outro envolvendo a Via Engenharia. O senhor também entregou aos procuradores os recibos referentes a essas duas empresas?
A gente mandou uma, porque eu não sabia… Agora que eu estou sabendo que a Via também está envolvida. Eu não sabia, a gente não sabe se ela está envolvida ou não está envolvida na Lava Jato. As duas (Andrade e a OAS) eu sei que estão, e das duas eu mandei o recibo.
O senhor mandou esses recibos hoje (terça, 12/4), é isso?
Mandei ontem (11).
O senhor acha que fez alguma coisa errada ao receber esses valores, sabendo agora que são empresas envolvidas na Lava Jato?
Eu só fiquei sabendo que tinha ganhado essa, que a paróquia tinha recebido essas doações, quando entrou o dinheiro na conta, porque aí eu vi que tinha vindo dessas empresas. Eu não sabia. E, imediatamente, eu mandei o recibo de doação porque… Pela conta da paróquia para elas, como a gente até fala das contas. Quando eu recebi, eu fiquei admirado, eu fiquei admirado por causa dessa quantia. Eu recebi com gratidão também, porque, na verdade, eu não tenho a obrigação de saber a origem do dinheiro. E em 2014 não tinha nada contra essas empresas.
O senhor e a paróquia podem ter sido usados para lavagem de dinheiro?
Nunca, nunca, nunca, nunca, nunca. O dinheiro entrou na conta da paróquia para gastar com a festa de Pentecostes, com as coisas da paróquia.
E o senhor utilizou todo esse dinheiro em Pentecostes?
Com o dinheiro de Pentecostes, nós pagamos todas as contas. E o restante que sobra, a gente investe em construção, em evangelização, enfim, numa série de necessidades que existem dentro de uma paróquia. Agora não existe essa de lavar dinheiro na paróquia. Isso é conversa. Existe dinheiro de doação que foi gasto com as coisas da paróquia e com a festa.
Duas questões chamam a nossa atenção: o fato de essas doações terem ocorrido em 2014, justamente em ano de eleições, e o valor. Agora, sabe-se, feitas por empresas envolvidas na Operação Lava Jato. Diante de todos esses elementos, não parece que o senhor pode ter sido usado?
Tanto o senador Gim quanto Agnelo — que frequentam muito o encontro e sabem da necessidade do encontro — pediram doações. Agora, eu não sei se eles disseram: ‘Olha, você me dá R$ 350 mil?’. Isso eu não sei explicar. Pedi essa doação. Se deram essa doação desse tamanho, eu não sei por quais razões doaram. Mas essas doações, com certeza, foram bem-vindas para a paróquia. O que eu estou te confirmando é que eu não sei o tamanho da doação que eles (Gim e Agnelo) pediram, entende? Se eles marcaram: “Olha, me dê R$ 300 mil, R$ 350 mil”, isso eu não sei. Foi lá entre eles. E talvez eles não pediram isso, pediram doação (inaudível) lá para a empresa. E olha, essa quantia, para nós, ficamos agradecidos, porque ajudou muito. Agora a gente não sabia. Eu, por exemplo, fiquei sabendo, há pouco tempo, que essa gente estava envolvida nisso.