Paciente luta na Justiça para conseguir transporte para hemodiálise
Zuleide de Carvalho, 58 anos, precisa de transporte particular para clínica visto que, com a saúde debilitada, não consegue usar ônibus
atualizado
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A família de Zuleide de Carvalho (foto em destaque), 58 anos, está lutando na Justiça para que a Secretaria de Saúde do Distrito Federal (SES-DF) arque com o transporte da paciente renal, que precisa realizar sessões contínuas de hemodiálise em uma clínica conveniada à rede pública, em Santa Maria.
Por conta da dificuldade de locomoção, a dona de casa precisou ser internada há 10 dias, no Hospital Regional do Gama (HRG), após não conseguir comparecer a uma das sessões de tratamento e passar mal.
A mulher é moradora do Riacho Fundo II e realiza hemodiálise três vezes por semana. Cada sessão tem duração de 4 horas. Para conseguir realizar o procedimento em Santa Maria, ela precisaria pegar dois ônibus na ida e dois na volta. Mas, diante da condição renal, a família tem gasto cerca de R$ 650 por mês com transportes por aplicativo para que ela compareça à hemodiálise.
De acordo com a filha da paciente, Elaine Cristina Carvalho, 39, a família acionou a Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF) para que a mãe conseguisse ser transportada para as sessões pela própria SES-DF. Por estar desempregada e morar longe de Zuleide, ela também não consegue ajudá-la diante da dificuldade financeira.
“A Secretaria de Saúde alegou à Justiça que não tinha transporte para buscá-la em casa e levá-la à clínica. Entramos com recurso para, pelo menos, tentar que arquem com os custos de um transporte particular para ela. Minha mãe também não tem condições de trabalhar, vive apenas do Bolsa Família e eu, infelizmente, não tenho carro para transportá-la”, alega Elaine.
Zuleide também tem um relatório médico no qual a nefrologista que a atende alega que o uso de transporte coletivo oferece riscos para a mulher. Segundo a especialista, após a terapia de hemodiálise a paciente pode apresentar hipotensão, tontura, síncope, hipoglicemia, fraqueza e cãibras. Sendo assim, necessário uma locomoção que garantisse a segurança dela.
“Já não sabemos mais o que fazer. Minha mãe tem uma doença renal em estágio final. Ela precisa realizar o tratamento para viver. Eu sou a única pessoa responsável pelos cuidados dela. A clínica de Santa Maria ainda é o local mais próximo da residência dela. Não tem nenhuma clínica particular conveniada ao governo perto da minha mãe”, lamenta a filha.
A dona de casa teme que não consiga realizar a terapia por falta de um carro para transportá-la de casa para o hospital. “Eu só queria um transporte para ir ao hospital e voltar para minha casa. Fica muito difícil para mim depender do transporte público. Tanto que agora eu estou internada por causa disso”, conta a paciente.
Paciente com saúde debilitada
Em outubro de 2022, a 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal determinou que o DF disponibilizasse transporte individualizado a uma paciente que estava com saúde debilitada para que pudesse realizar tratamento de hemodiálise.
O colegiado concluiu que, no caso, o programa passe livre para o transporte coletivo não se mostrava suficiente e adequado.
O Distrito Federal, em sua defesa, afirmou que a lei distrital assegura aos portadores de doenças renais crônicas direito à gratuidade de transporte coletivo. Informou que a política de saúde pública não assegura aos pacientes em tratamento de diálise o transporte individual da casa até a unidade de saúde.
A única exceção, de acordo com o réu, se refere aos casos de urgência e emergência, ocasião em que o transporte do paciente é realizado por uma ambulância do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu).
Ao analisar o recurso da autora da decisão que julgou o pedido improcedente, a Turma pontuou que, no caso, o uso do transporte público gratuito não se mostrava suficiente, “tendo em vista o risco elevado de complicações durante o procedimento de hemodiálise”. Para o colegiado, “resta evidente a excepcionalidade, capaz de justificar a imposição ao réu do dever de fornecer transporte” à paciente.
Uma decisão colegiada do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT), também publicada na mesma época desse processo, prevê que “comprovada nos autos a impossibilidade financeira do autor de arcar com os custos do transporte privado, bem como que a fragilidade de sua saúde impede o deslocamento por meio de transporte público, deve ser o Distrito Federal obrigado a custear o transporte especial do paciente para as sessões de hemodiálise para assegurar a continuidade do tratamento”.
Protocolo para transporte de paciente renais
A Defensoria Pública do DF e o Ministério Público recomendaram, em 2020, a criação de um protocolo para transporte de pacientes renais.
Na época, o órgão recebeu crescente demanda por auxílio jurídico de pacientes portadores de doenças renais crônicas que precisam de transporte para realização de seu tratamento. O objetivo da recomendação era criar regras para evitar a judicialização dos pedidos.
De acordo com a recomendação, parte da necessidade de transportar os pacientes estava relacionada à distância entre o local de residência e as unidades de saúde com vagas para hemodiálise.
Por isso, a SES-DF deveria apresentar cronograma de ampliação da oferta de vagas e da cobertura territorial desse tipo de tratamento. Também deveria fazer levantamento de todos os pacientes que usam serviço de transporte e daqueles que o solicitaram, mas não conseguiram.
A Defensoria e o MPDFT recomendaram, ainda, que a Secretaria de Saúde do DF avaliasse os pacientes que usam ou solicitaram o serviço para verificar se existe necessidade de transporte sanitário individualizado e se poderiam receber diálise peritoneal, que pode ser realizada em casa.
O que diz a SES-DF
Procurada pela reportagem do Metrópoles, a SES-DF informou que não foi acionada judicialmente sobre o caso.
Segundo a pasta, os pacientes renais, portadores de doenças crônicas, têm direito assegurado ao transporte público coletivo gratuito. “Pacientes que apresentam baixa renda e realizam hemodiálise, têm direito ao transporte público gratuito (passe livre) e, em situações em que o paciente apresenta elevado grau de dependência, o acompanhante também tem direito ao passe livre quando estiver junto ao paciente”, diz a secretaria.
Já a Secretaria de Transporte e Mobilidade (Semob) reforçou que as pessoas com insuficiências renal e cardíaca crônica, assim como os portadores de câncer, de vírus HIV e de anemias congênitas (falciforme e talassemia) e coagulatórias congênitas (hemofilia) podem ser beneficiárias do Passe Livre.
“A Semob esclarece que, para o uso do benefício, é exigido o uso do cartão especial. O cadastro pode ser feito por meio digital no sistema web Passe Livre ou presencialmente no posto BRB Mobilidade da Estação do Metrô da 112 Sul. Se for comprovada a necessidade, o acompanhante do PNE também terá direito”.