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O dia em que uma bomba-relógio tentou calar o teatro em Brasília

Documentos liberados pelo Arquivo Público do DF mostram as estratégias usadas para sabotar artistas que tentavam denunciar o regime militar

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bomba ditadura
1 de 1 bomba ditadura - Foto: Arquivo Público do DF/ Reprodução

O ano era 1979 e a repressão da ditadura militar ainda pairava como uma nuvem pesada sobre artistas do Brasil e de Brasília. Na capital do país, uma bomba-relógio foi usada para tentar calar atores e atrizes, sob comando da diretora Ruth Escobar, que interpretavam a peça “Revista Henfil”, no Teatro da Escola Parque da 308 Sul.

O texto, assinado pelo desenhista em parceria com Oswaldo Mendes, causava arrepios aos militares. A peça já havia sido proibida na cidade três meses antes, pois, para a censura oficial, o conteúdo era considerado subversivo. A história do atentado é contada em detalhes pelo então assessor da Coordenação de Informações, Planejamento e Operações (CIPO) da Secretaria de Segurança Pública do DF, capitão Carlos Alberto Cardozo, em relatório feito a pedido da direção do órgão.

Os documentos sobre a atuação dos órgãos de repressão da ditadura militar em Brasília foram digitalizados e colocados à disposição da população pelo Arquivo Público do Distrito Federal. A ação faz parte da iniciativa Memórias Reveladas, que busca trazer à luz fatos e investigações do “anos de chumbo” no Brasil.

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Chargista Henfil é o autor da peça que foi alvo de atentado

 

A primeira ameaça à peça “Revista Henfil” se deu ainda na estreia do espetáculo em Brasília, em 5 de junho de 1979 . “Tomou-se conhecimento através dos Órgãos de difusão da Capital, que elementos supostamente radicais teriam lançado nos estacionamentos próximos ao teatro uma quantidade considerável de pregos “tri-dentes”, provocando furos nos pneus dos veículos que por ali se deslocavam. Segundo ainda essas agências noticiosas, a prática desse ato teria como objetivo sabotar a apresentação da referida peça teatral na Capital da República”, descreve o capitão Carlos Alberto Cardozo.

Junto aqui tambêm (sic) xerox de uma nota do ‘Henfil’ publicada no ‘Jornal de Brasilia’ de hoje, de onde se depreende que, possivelmente, no próximo dia 15 será lido o tal manifesto dos presos em todos os palcos do Brasil. Tudo isto nos leva a uma natural preocupação sobre a conveniência, ou não, e a oportunidade da apresentação da ‘Revista do Henfil’, na próxima semana, no novo Teatro da Capital da Republica

Ruy Pereira da Silva, diretor da Fundação Cultural do DF, ao pedir a censura da peça três meses antes
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Bomba
No dia seguinte à estreia, em 6 de junho, foram enviadas equipes da polícia militar e o próprio Carlos Alberto Cardozo esteve na apresentação da peça. No entanto, por volta de 21h, o evento teve um atraso inesperado.

“A sra. Ruth Escobar se dirigiu aos presentes anunciando que o espetáculo teve de ser retardado por alguns minutos, segundo determinação da Polícia Federal, porque fora localizado no recinto duas bombas de característica militar, em foma de lata de ‘spray’ e que, segundo os policiais, as mesmas teriam um grande poder explosivo, podendo ocasionar ferimentos ou até mortes de vinte a trinta pessoas”, relatou Cardozo.

Apesar dos alertas, os presentes teriam se mantido no local até que os policiais retirassem os artefatos. Uma hora depois, após desabafo da diretora, a peça seguiu. Cardozo, posteriormente, teve acesso aos dois explosivos, localizados próximo ao palco e sob uma das poltronas da plateia.

Nos dias seguintes, as intimidações seguiram. Ruth Escobar informou ter recebido uma ligação anônima de um grupo intitulado Brigada Anti-Comunista (BAC) que ameaçava explodir o teatro caso continuassem com a apresentação da peça “Revista Henfil”. A diretora avisou às autoridades, que se comprometeram a intensificar a fiscalização nas proximidades.

Mas não foi o suficiente. Na quinta-feira (7), uma nova ameaça de bomba chegou aos ouvidos dos responsáveis pela segurança. Por volta de 21h10, uma equipe da polícia esteve no local e encontrou outro explosivo.

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O artefato, dessa vez, era formado por três bananas de dinamite armadas com um relógio. A bomba estava acionada para detonar às 22h, momento em que os artistas estariam no palco. Os peritos conseguiram desarmar o dispositivo cerca de 15 minutos antes da explosão programada. Por precaução, o grupo teatral fez a encenação ao ar livre na quadra 308 Sul, próxima ao teatro.

Repercussão
A peça continuou sua programação, com exibições até 10 de junho, mas as seguidas tentativas de atentados e ameaças repercutiram nos jornais e na política. Senadores, como Marcos Freire, do então MDB, posicionaram-se a favor dos artistas e exigiram atitudes do Ministério da Justiça.

A Polícia Federal chegou a instaurar uma sindicância na época, porém, pouco foi feito para localizar os autores das ameaças, como apontam os registros disponibilizados pelo Arquivo Público.

 

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