No DF, promessas da Copa e das Olimpíadas não ficaram prontas até hoje
Nem mesmo o Mané Garrincha foi entregue segundo o projeto inicial. Especialista fala em falta de planejamento e desperdício de verba pública
atualizado
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O primeiro jogo que o reconstruído Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha recebeu válido pela Copa do Mundo foi no dia 15 de junho de 2014. Bem antes, no início de 2009, o Distrito Federal já sabia que sediaria jogos da principal competição de futebol do mundo. Em agosto do ano passado, a capital do Brasil voltou a sediar partidas importantes, dessa vez, válidas pelas Olimpíadas. Mesmo assim, acredite: tanto tempo depois, várias obras prometidas como legados da Copa do Mundo e dos Jogos Olímpicos ainda são maquetes.
Na área central de Brasília, o glorioso Mané Garrincha está lá, imponente. A arena mais cara construída para o Mundial — a R$ 1,8 bilhão — hoje custa R$ 13 milhões anuais ao Governo do Distrito Federal em manutenção. Mesmo assim, ainda deixou para trás vários detalhes prometidos na época de sua construção. A estrutura no teto para abrigar a usina fotovoltaica está lá, mas a geração de eletricidade por meio da energia solar nunca virou realidade.
“Não foi dado prosseguimento ao projeto porque o governo, diante da crise econômica, decidiu por não instalar as placas de energia solar”, informou, por meio de nota, a Secretaria de Esporte, Turismo e Lazer, responsável pela arena. O custo estimado da usina era de R$ 15 milhões. Lá dentro, o bicicletário também ficou só nas promessas de criar um estádio sustentável, assim como o projeto inicial para a captação da água da chuva.
Do lado de fora da arena esportiva, o projeto original previa ainda um belo jardim. No entanto, o paisagismo foi logo cortado das obras iniciais e nem chegou a ser orçado.
Túneis subterrâneos e Jardim Burle Marx
E quem não se lembra da promessa de criar túneis subterrâneos ligando o Eixo Monumental ao Parque da Cidade? A preço estimado de R$ 285 milhões, essa obra também ficou no rascunho, e foi totalmente esquecida.
Ali por perto, um projeto grandioso chegou a ser iniciado. O Jardim Burle Marx, inspirado no paisagismo de um dos artistas mais importantes na história da criação de Brasília, trará plantas nativas do cerrado, ciclovias e espelhos d’água.
No entanto, atualmente, no local que fica entre a Torre de TV e a Rodoviária, o que se vê é água parada, entulho e lama. O jardim começou a ser construído em 2013 e deveria receber os turistas na época da Copa do Mundo. No entanto, nunca teve as obras finalizadas.
O Metrópoles questionou o GDF sobre o prazo de conclusão das obras do Jardim Burle Marx. Segundo o governo, a primeira etapa recebeu investimentos de R$ 5,835 milhões e estava paralisada aguardando recursos financeiros, mas já foi retomada. “A segunda etapa, com investimentos na ordem de R$ 5,008 milhões, está em execução”, afirmou.
Veículo Leve sobre Trilhos
Outra promessa que virou fumaça teria impacto direto no dia a dia dos brasilienses, pois aprimoraria a mobilidade urbana: o Veículo Leve sobre Trilhos (VLT). O meio de transporte sairia do Aeroporto, passaria pela W3 Sul e chegaria ao Mané Garrincha.
Essa obra foi retirada da Matriz de Responsabilidade — compromissos firmados junto ao Comitê Organizador da Copa — em 2012. Isso porque, em abril de 2011, a Justiça determinou a anulação do contrato da obra e a realização de nova licitação, devido a fraudes no processo.
Apesar do desmando, a ideia não está totalmente descartada. Por meio de nota, o Metrô-DF informou que licitou estudos e projetos para a implantação do VLT Monumental. “Os estudos, que servirão para coleta de dados e macrossimulações em toda a área central do Distrito Federal, ainda estão sendo realizados”, informou.
O VLT ficou só no desenho. Obras chegaram a ser iniciadas e foram interrompidas
Nem Copa, nem Olimpíada
Parece piada, mas o Estádio Antônio Otoni Filho, conhecido como Estádio do Cave (Centro Administrativo Vivencial e de Esporte), no Guará, recebeu investimentos tanto do GDF quanto do Ministério do Esporte para a implementação de melhorias em 2012. O local seria usado durante a Copa do Mundo e, depois, na Olimpíada, mas, até hoje, as intervenções nunca foram finalizadas.
O gasto com a reforma do Cave, que seria um legado da Copa, já ultrapassa os R$ 7 milhões. Foram investidos R$ 6.166.632,96 por meio do Ministério do Esporte e mais R$ 1.024.568,75 vindos dos cofres do GDF.
Ainda assim, atualmente, o local está sem vestiários. Procurada pela reportagem, a Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap) informou que o projeto da estrutura do vestiário do estádio está sendo adequado e, logo que for concluído, as obras serão reiniciadas. “A previsão é que as adequações sejam concluídas em um prazo de até 60 dias”, completou a pasta.
Por que tanta demora?
Para Frederico Flósculo, professor de arquitetura e urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), falta comprometimento por parte do governo e sobra desorganização. “Esse tipo de obra nunca pega uma cidade desavisada. Mas só dá certo se tiver planejamento, já que envolve segurança, infraestrutura e outras áreas”, explica.
Segundo o especialista, tudo isso demonstra apenas que falta comprometimento com o dinheiro público. “Eu ensino meus alunos para que saibam o preço de cada janela, cada tijolo. Mas os governantes parecem não saber o valor das coisas. Não param de perder milhões de reais. Eles nem querem saber do preço, do que é desperdiçado, do prejuízo que isso causa para a população”, completou o professor.
Expresso DF (BRT)
Embora não estivesse previsto na matriz de responsabilidade da Copa, o Expresso DF saiu do papel, graças ao evento, ao receber recursos no PAC da Mobilidade. A obra foi inaugurada em junho de 2014, mas até hoje não está completamente concluída.
O serviço ainda está longe de transportar com conforto e dignidade os mais de 100 mil passageiros que utilizam o sistema todos os dias. Inaugurado com o intuito de reduzir o tempo de viagem de regiões administrativas mais distantes (como Santa Maria e Gama) até o Plano Piloto, o transporte é alvo de inúmeras reclamações.
Os problemas vão da demora para embarcar nos coletivos e superlotação à desorganização das filas, esbarrando em falhas na infraestrutura das estações. Um prejuízo, já que o sistema custou R$ 659.227.845,16 aos cofres públicos e não atende plenamente aos usuários.
Quatro dos 10 terminais prontos estão abandonados. Há vidros quebrados, portas soltas, estrutura pichada e lixo acumulado.