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Pai denuncia que filho autista é mantido em sala de aula para não “prejudicar imagem da escola”

Servidores alegam que a determinação de fechar em sala veio para que a criança não fosse vista quando em crise. Pai aponta negligência

atualizado

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Fachada da escola classe da 111 da Asa Sul. Escola colorida em frente a prédios reidenciais
1 de 1 Fachada da escola classe da 111 da Asa Sul. Escola colorida em frente a prédios reidenciais - Foto: Google maps/Reprodução

Deitada no chão, uma criança de 10 anos, diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista (TEA), grita e geme. Trata-se de uma crise, com duração de aproximadamente 40 minutos, causada pelo transtorno e também por hipersensibilidade auditiva. A sala estava fechada, apenas com o educador e a professora no local. Segundo o pai, o aluno foi isolado naquele espaço por determinação da diretora da Escola Classe 111 Sul, em Brasília.

Servidores alegam que a determinação de manter o menino em sala durante as crises surgiu para que a criança não fosse vista naquela situação. A iniciativa tem por objetivo não “prejudicar a imagem da escola”. O caso teria ocorrido no terceiro dia de gestão da nova diretora. Diante da situação, Everton Venâncio de Souza, pai do garoto, formalizou uma denúncia de negligência por parte da instituição para com o seu filho.

“A diretora determinou que fosse levado à força para a sala de aula, o que aumentou sua crise e gerou um comportamento agressivo”, detalhou o pai. Everton conta que, ao chegar ao colégio, o filho estava deitado, abraçado a um cabo de vassoura. “Eu fui para a escola correndo ver meu filho. Quando chego lá, a diretora quer conversar comigo primeiro.” O pai disse, ainda, que, ao ver a criança naquela situação, estranhou a proporção que a crise tinha tomado. “Ela afirmou que, em casos de crise de alunos autistas na frente da escola, a norma é retirar os alunos para que vizinhos não filmem o ocorrido”, relatou Everton.

“Esta orientação, além de desumana, é completamente inaceitável, colocando a imagem institucional acima do direito e bem-estar da criança”, acrescentou. O pai protocolou denúncias no Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), na Ouvidoria da Secretaria de Educação do DF e na Corregedoria-Geral do DF. Diante das reclamações, servidores disseram que a diretora teria começado uma perseguição ao aluno. Para isso, a gestora teria removido a professora que oferecia atendimento individualizado a alunos especiais e afastado o educador social que a criança tinha criado um vínculo afetivo. “Ela está fazendo tudo isso porque não quer que o menino fique na escola”, acusa uma das professoras da unidade, que pediu anonimato. A percepção é a mesma dos pais e de servidores que conversaram com a reportagem.

“Quando os professores informaram sobre o ocorrido, a diretora repreendeu a professora do meu filho, levando a um conflito que resultou em seu pedido de transferência da escola. Além disso, a diretora removeu o educador social do suporte, alegando falta de competência para trabalhar com alunos especiais”, relatou o pai em uma das denúncias. “Essas ações representam abuso de direito, assédio e discriminação contra a criança e sua família, além de uma postura incompatível com a gestão de uma escola pública.”

Relatório médico, de janeiro deste ano, aponta que a criança tem déficit no processo de reciprocidade emocional e que ficou 1 ano e meio fora da escola. O laudo indicava que seria necessário tentar um novo retorno à unidade de ensino, “lento e gradual, respeitando os limites do paciente”, conforme aponta em documento. Veja:

laudo médico orientando que a criança retorne à escola
Laudo médico

Apontado pelo pai como uma pessoa de confiança e de grande vínculo com o aluno, o educador social Wanderson Gonçalves Silva, 39 anos, disse que também se viu perseguido pela diretora. Ele chegou a registrar boletim de ocorrência contra ela, relatando que, ao ser desligado, a gestora da instituição o teria acusado de ter pisado no garoto. Dessa forma, Silva alegou sofre calúnia por parte da professora e contou que a história não foi essa. “Ela me chamou do nada e perguntou se eu queria ir para outra escola e disse que decidiu me tirar”, revelou.

Uma professora que também pediu anonimato por sofrer represálias da diretora conta que trabalha há mais de 20 anos com crianças que tenham algum tipo de deficiência e que, nesse tempo, nunca havia sido orientada a isolar uma criança com crise em uma sala para se acalmar sozinha. “Levá-lo para a sala não foi uma boa opção. Ele se recusava a entrar”, detalhou.

“Ela falava que perto da escola havia prédios residenciais e que as pessoas, vendo o estudante em crise, poderiam filmar e que ela queria preservar a imagem da escola.”

Em 12 de julho, nove servidores da escola classe assinaram uma ata ao Conselho Regional de Educação do Plano Piloto que pedia mudança na atual diretoria do colégio.

Como reagir

“A hipersensibilidade auditiva é um Transtorno do Processamento Sensorial, algo que deixa o cérebro com dificuldade para compreender, filtrar e escolher como reagir a alguns estímulos”,  explica a psicóloga Paola Rodrigues, do Instituto de Medicina e Psicologia Integradas (Impi).

“Esse transtorno faz com que a pessoa fique mais sensível e seja fortemente afetada pelos sons do ambiente em que está ou, até mesmo, os sons do próprio corpo”, explica. De acordo com a profissional, é importante que, em uma crise, a criança seja afastada, a fim de protegê-la e evitar que a criança com TEA se machuque.

A profissional ressalta, também, a importância de as crianças com essa hipersensibilidade usarem fones abafadores de ruídos. O vídeo acima está borrado para preservar a imagem do menino, mas, nas imagens originais, o garoto está usando fones.

Histórico

Esta não seria a primeira vez que a escola se viu inserida em polêmicas. Pai de outro aluno, Bruno Faria Albuquerque, alegou que o filho de 8 anos, com Transtorno do Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), quase foi agredido por uma professora. Em denúncia também enviada ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, ele conta que, no ano passado, a docente teria tentado agredir o aluno após ter feito uma brincadeira com outra criança.

“Após esse episódio, fiquei uma semana com Miguel em casa por sugestão da antiga diretora da escola classe, que, de acordo com ela, seria pela integridade dele e dos outros alunos”, relata a documentação. O pai informou que tirou o filho da instituição em seguida.

O MPDFT confirmou a denúncia feita via ouvidoria e que a representação foi remetida para a Promotoria de Justiça de Defesa da Educação (Proeduc), que requisitou informações à unidade de ensino e aguarda resposta.

A  Secretaria de Educação do DF também informou que recebeu a denúncia por meio da Ouvidoria e que a Corregedoria da SEEDF já apura o caso. A pasta esclarece que os fatos serão apurados em relação a todos os servidores envolvidos e que adotará todas as medidas cabíveis nos termos da Lei Complementar nº 840/2011.

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