Grupo que faturou R$ 217 mi para dar aula a alunos fantasmas é alvo da PF
Empresas contratadas pela Secretaria de Educação do Piauí não cumpriam requisitos para ministrar supletivo a jovens e adultos
atualizado
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A Polícia Federal deflagrou, nesta sexta-feira (2/9), a Operação Aquarela, que visa apurar irregularidades em contratos firmados entre a Secretaria de Estado da Educação do Piauí (Seduc) e empresas prestadoras de serviços educacionais no programa de alfabetização de jovens e adultos. As contratações suspeitas alcançam o valor de R$ 217 milhões.
São cumpridos 42 mandados de busca e apreensão, expedidos pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região. A ação conta com cerca de 140 policiais federais e sete auditores da Controladoria-Geral da União (CGU). As determinações judiciais ocorrem nos municípios de Alegrete (PI), Campo Maior (PI), Pedro II (PI), São João do Arraial (PI), Teresina (PI), Valença (PI) e Timon (MA).
Projeto
De acordo com as investigações, realizadas mediante parceria entre a Controladoria-Geral da União e o Tribunal de Contas do Estado do Piauí, em julho de 2021, a Secretaria de Estado de Educação lançou edital para seleção de instituições públicas e privadas na prestação de serviços educacionais no âmbito do Programa Alfabetização de Jovens e Adultos (ProAJA), de iniciativa estadual.
Para a execução dos serviços, a Seduc firmou dezenas de contratos milionários com 52 empresas, mediante credenciamento e inexigibilidade de licitação. Os acordos foram custeados com recursos de precatórios do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação Básica (Fundeb). No total, são mais de R$ 217 milhões, em valores empenhados até 19 de agosto de 2022.
Embora a iniciativa ofereça turmas em 223 municípios piauienses, constatou-se que empresas credenciadas pela secretaria não têm, em seu rol de atividades principais, a prestação de serviços educacionais, bem como não detêm capacidade financeira e operacional para desenvolver o projeto. Além disso, após o recebimento dos recursos, os investigados não ampliaram o número de funcionários empenhados em desenvolver as atividades.
Por este motivo, há turmas que não ocupam salas em escolas públicas: as aulas são ministradasem ambientes residenciais, com estrutura física improvisada e inadequada. O uso de material didático, quando ofertado, não é devidamente adaptado ao grupo de alunos. Vale ressaltar que o perfil dos estudantes é marcado pela diversidade de idade, sexo, vivência, qualificação profissional e grau de escolaridade.
A polícia também identificou que há oferta de lanche sem conteúdo nutritivo em relação à quantidade e à qualidade dos alimentos. Os alunos recebem sucos e biscoitos de água e sal, em desacordo com os projetos apresentados no credenciamento das empresas, que continham itens variados, de rico valor nutricional e definidos por profissionais competentes.
Alunos fantasmas
As constantes alterações nos instrumentos legais que regulamentam o programa e a ausência de acompanhamento e fiscalização da execução dos contratos possibilitaram a inscrição de alunos que não atendem aos requisitos de idade, escolaridade e condições financeiras estabelecidos para o programa, inclusive fictícios ou já falecidos. Essa conjuntura causa prejuízos aos cofres públicos.
As ordens judiciais cumpridas na Operação Aquarela têm o intuito de aprofundar as investigações acerca de irregularidades na execução dos contratos e são direcionadas a 19 instituições, órgãos públicos e seus respectivos representantes legais.
Os envolvidos podem responder pelos crimes de associação criminosa, falsidade ideológica, emprego irregular de verbas ou rendas públicas e fraude à licitação.
Aquarela
Aquarela é uma técnica de pintura na qual a adição de água à tinta produz cores leves e casuais, sendo relacionada a métodos utilizados nos primeiros anos de escolaridade. A associação ao nome da operação deve-se ao fato de empresas credenciadas adotarem material pedagógico apropriado ao ensino infantil para alfabetização de adultos.