Gaeco: quem são os alvos da ação contra corrupção em projeto de Natal
A ordem judicial também determinou o bloqueio do montante de mais de R$ 5 milhões
atualizado
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Os alvos da Operação Krampus, deflagrada pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), na manhã desta segunda-feira (30/12), são empresários e servidores da Secretaria de Estado de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal.
O objetivo da ação é cumprir mandados de busca e apreensão contra suspeitos de envolvimento em um esquema de desvio de recursos públicos por meio da contratação ilegal do projeto Natal Encantado 2024 (Nosso Natal 2024) pela pasta. A ordem judicial também determinou o bloqueio do montante de mais de R$ 5 milhões.
A coluna apurou que os principais investigados são:
- João Filho de Sousa Cândido, subsecretário de Difusão e Diversidade Cultural da Secretaria de Cultura
- Carlos Leandro de Oliveira, coordenador de Planejamento e Monitoramento de Projetos Especiais da pasta
- Fernando Pereira Borges de Andrade, presidente da Associação Amigos do Futuro
- Eduardo de Lima Moreira, representante do Instituto Conecta Brasil (instituto que pode ter colaborado com a seleção da Amigos do Futuro)
Também foram cumpridos mandados de busca e apreensão na sede dos dois institutos e na Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Distrito Federal.
Além dos crimes de licitação, apuram-se, em tese, os delitos de corrupção ativa e passiva, de peculato, de lavagem de dinheiro e de organização criminosa.
Nosso Natal
O projeto consistiu na ornamentação natalina e montagem de estruturas na Esplanada dos Ministérios. Basicamente, um serviço de locação, que se iniciou em 1º de dezembro, com previsão de finalização nesta segunda, e que custou aos cofres públicos R$ 14,3 milhões.
Conforme apurado no âmbito da investigação e explicitado no próprio edital, inicialmente, o Nosso Natal 2024 tinha previsão para ocorrer na Praça do Cruzeiro, na Rainha da Paz, na Praça do Buriti e na Esplanada dos Ministérios.
Com base nesse primeiro formato, a instituição que foi escolhida pela Secretaria de Cultura e Economia Criativa para realizar a ação, a Associação Amigos do Futuro, se comprometeu a adornar todos esses espaços e a fornecer os demais serviços previstos, que contemplavam apresentações de artistas e todo o staff de limpeza, segurança e outros, por exatos R$ 12 milhões.
No entanto, após a seleção da associação para realizar o projeto, o objeto da contratação foi reduzido, passando a prever que o evento ocorreria apenas na Esplanada.
Preço reduzido
Segundo as investigações, considerando a exclusão dos serviços locatícios que seriam disponibilizados na Praça do Cruzeiro, na Rainha da Paz e na Praça do Buriti, o preço da contratação deveria sofrer uma redução proporcional àquilo que foi retirado do negócio.
O Gaeco aponta que, se fossem levados em conta os preços que a própria associação ofereceu para realizar o negócio, o valor da contratação deveria ser de, no máximo, pouco mais de R$ 8 milhões. E esse valor, na visão dos promotores de Justiça, já seria elevadíssimo, não se descartando que também estejam superfaturados.
A Secretaria de Cultura e Economia Criativa, porém, não só não reduziu o valor da contratação, os R$ 12 milhões iniciais, como elevou o valor do negócio para mais de R$ 14 milhões, o que foi feito por meio de um acréscimo ilegal de itens que não estavam originariamente previstos no plano de trabalho da associação.
Tudo só foi possível porque, de acordo com a investigação, houve a conivência de servidores da pasta.
Considerando o valor de quase R$ 8,5 milhões e o valor R$ 14,3 milhões, que prevaleceu ao final, o Ministério Público aponta um superfaturamento de quase R$ 6 milhões, ou um acréscimo de 69% do valor inicial que seria devido.
Além da elevação do valor da contratação, foi apurado que alguns itens previstos no contrato não foram integralmente disponibilizados, como foi o caso dos banheiros químicos.
Segundo o Gaeco, a própria forma de contratar eleita pela Secretaria de Cultura e Economia Criativa também é questionável, já que a pasta contratou a associação sem licitação.
O Ministério Público ainda aponta indícios de que o grupo, que foi escolhido pela SECEC-DF, seria uma entidade de fachada, pois não tem qualquer empregado cadastrado em bancos oficiais e no endereço da sede indicada pela entidade não teria havido consumo de energia no último ano.
Segundo o plano de trabalho apresentado pela associação, apenas o aluguel da estrutura da árvore de Natal, que é basicamente formada por estrutura metálica e um tecido que a reveste, custou R$ 1 milhão.
Também o Ministério Público de Contas do Distrito Federal entrou com uma ação contra o Natal Encantado 2024 perante o Tribunal de Contas. No dia 23 de dezembro, a Corte determinou à SECEC-DF a suspensão dos pagamentos para a associação.
A operação desta segunda, fruto de investigação conduzida pelo Gaeco do Ministério Público do Distrito Federal, contou com o apoio operacional do Departamento de Combate à Corrupção da Polícia Civil (Decor-PCDF).
Krampus
O nome da operação remete ao personagem da mitologia europeia que seria a “versão do mal” do Papai Noel. Ele é o mais famoso entre os ícones natalinos alternativos, uma criatura que faz parte do folclore na Alemanha e na Áustria desde o século 17 – e até em cidades dos Estados Unidos.
Krampus é o oposto do Papai Noel. Enquanto a figura carismática do velhinho de cabelos e barbas brancas entrega presentes para as crianças no Natal, premiando-as pelo bom comportamento ao longo do ano, o espírito maligno chega para punir aquelas que não se comportaram.
Trata-se de uma figura demoníaca, com longos chifres e barba de bode, lembrando algumas representações clássicas do diabo. Em resumo, Krampus é o demônio do Natal.
O outro lado
Confira a íntegra da nota enviada pela Secretária de Cultura e Economia Criativa:
“A Secretária de Cultura e Economia Criativa recebeu com surpresa a informação de que está em curso uma investigação do MPDFT, e tem colaborado com as autoridades. Porém, mesmo diante do inesperado, está colaborando com as autoridades competentes com serenidade e tranquilidade, por que é a maior interessada na resolução e apuração dos fatos.
Inclusive, o Ministério Público de Contas do DF já havia solicitado informações a cerca do edital de Natal, e tem acesso, desde o início, a todo o processo. A Secretaria tem prestado todas as informações que lhe são solicitadas, enfatizando a transparência e lisura de todo o processo.
Neste sentido, a Secretaria de Cultura reforça que tem a ciência de que entregou o melhor evento de Natal que os brasilienses já presenciaram. O Nosso Natal 2024 reuniu mais de 1,2 milhão de pessoas, com uma média de 40 mil visitantes diários. Um evento que teve uma estrutura três vezes maior do que a do ano anterior, além de ter oferecido mais de 200 atrações culturais locais e de diversas outras atrações que encantaram o público de todas as idades, durante 29 dias, o dobro do período da festividade no ano passado.
Todos os valores que constam no plano de trabalho estão de acordo com o preço público. Ressaltamos que o processo de instrução administrativo foi devidamente pautado pelos princípios que regem a administração pública, em conformidade com a legislação que define os moldes de editais públicos.
A Secec reforça que tem a convicção de que fez todos os esforços para garantir um mês inteiro de celebração, de cultura e de movimento para a economia do DF, gerando impactos positivos a todos os brasilienses.”
O que diz o instituto
Em nota, o Instituto Conecta Brasil alegou que não é responsável pelo projeto Natal na Esplanada, que participou de edital e não teve a proposta contemplada. Segundo a organização, após o encerramento de edital, não houve envolvimento com órgãos responsáveis nem qualquer relação com a instituição vencedora do chamamento.
O instituto ainda ressaltou que refuta o “equívoco publicado sobre a possibilidade de conluio” e que já participou de editais anteriores. A entidade acrescentou que colabora coma as investigações.