Alvo de investigação, amantes tentaram blindar André Clemente
O presidente do instituto responsável pelo Brasília Iluminada e a chefe de gabinete de Clemente teriam atuado juntos, segundo investigações
atualizado
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Alvo da Operação Tenebris, que apura supostas irregularidades no projeto Brasília Iluminada, dupla teria atuado nos bastidores para blindar o conselheiro do Tribunal de Contas do DF (TCDF) e ex-secretário de Economia do Distrito Federal, André Clemente.
A Secretaria de Economia contratou o Instituto Idheias para a montagem do cenário iluminado na Esplanada dos Ministérios por R$ 14 milhões. A segunda fase da operação foi deflagrada nessa quarta-feira (2/2) e teve como alvo, pela segunda vez, o ex-secretário de Economia.
Conforme as investigações do Ministério Público do DF (MPDFT), o presidente do Instituto Idheias, Geraldo Marcelo Sanches, e a chefe de gabinete de Clemente, Edileide Oliveira Santos, seriam amantes e teriam usado a proximidade para favorecer a assinatura do contrato. Para os promotores, Edileide teria atuado como “ponte” entre Geraldo e Clemente. “Vale dizer, nada mais nada menos, de que o braço direito de Clemente é amante do presidente do instituto por ele contratado”, destaca um trecho da apuração ao qual o Metrópoles teve acesso.
Conversas no WhatsApp
Documentos que embasam a Operação Tenebris revelam o vazamento de informações antes que houvesse a primeira busca e apreensão. A suspeita do MPDFT é que os investigados tinham conhecimento não apenas do objeto da medida cautelar – busca e apreensão – como também do seu conteúdo.
Segundo informações obtidas com exclusividade pelo Metrópoles, o vazamento consta em conversas por aplicativo obtidas de celulares apreendidos durante a primeira fase da operação, no dia 25 de janeiro.
Um dos diálogos encontrados é do dia 27 de dezembro de 2021, entre os supostos amantes. Após uma ligação para Geraldo, Edileide pede ao empresário que não revele o que ela lhe contou. Depois, a mulher acrescenta: “Só fiquei imaginando seu celular ou o meu apreendido e as nossas conversas sendo expostas kkkkk”.
Dois dias depois, em 29 de dezembro, Geraldo encaminhou para Edileide emendas do deputado distrital Leandro Grass (Rede) usadas para termos de fomento diversos. O empresário disse: “Isso é bom para demonstrar que ele também direciona recurso para fomentos, ou seja, tem que fazer busca e apreensão na casa dele também”. Foi Grass quem denunciou ao Ministério Público as supostas irregularidades no contrato.
Veja alguns trechos dos diálogos:
Confira imagens da instalação da estrutura do Brasília Iluminada:
Mensagens apagadas
No dia 30 de dezembro, Clemente orientou Geraldo a procurar um advogado criminal. Na conversa com o empresário, o conselheiro do TCDF disse que “o processo está andando e deve ter alguma decisão depois do dia 7 (fim do recesso)”. “Apesar de não ter nada errado, temos que nos movimentar”, acrescentou. Para os investigadores, esses diálogos indicam que Clemente acompanhava todos os movimentos do processo sigiloso.
No mesmo dia, os promotores flagraram Clemente dizendo a Geraldo: “Temos que nos movimentar rs. Brasil”, ao que Geraldo responde: “Ok”. Para a força-tarefa, tal diálogo reforça que os investigados “já tivessem conhecimento prévio de que havia contra eles uma investigação em andamento”.
Após ter acesso às informações vazadas, Clemente teria trocado de aparelho celular recentemente e apagado quase todas as mensagens do novo telefone. Para o MP, tais ações seriam uma forma de atrapalhar as apurações.
O outro lado
André Clemente afirmou ao Metrópoles estar sendo vítima de uma “farsa” construída “sem elementos” e em decorrência da indicação para o cargo na Corte.
“Os fatos ocorridos hoje só reforçam o que falei anteriormente e, aos poucos, os elementos dessa farsa vão se tornando públicos. Como prevíamos, tudo gira em torno da disputa pela vaga do Tribunal de Contas do DF. Tudo começa quando um deputado de oposição e candidato ao GDF denuncia 17 colegas e o secretário de Economia, alegando que esses venderam a indicação do TCDF, acreditem, em troca de emendas para uma festa de Natal. Não traz absolutamente nenhum elemento, apenas suposições infundadas”, afirma Clemente.
O ex-secretário de Economia do DF indica suposta combinação entre integrantes do MP e que a nova decisão, de juízo de primeiro grau, teria contrariado o posicionamento da presidência do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT).
“No dia seguinte, o promotor e o procurador alinhados entram com pedidos de busca. O presidente do Tribunal de Justiça do DF e, depois, sua vice negam, porque não existe nenhum indício de nada. Dias depois, a juíza de primeira instância, sem competência para tanto, autoriza duas buscas em menos de uma semana, contrariando o que disse o próprio TJ”, argumenta.
“O Brasil já viu essa história recentemente. Quando promotor, procurador e juíza se unem para fazer política, não tem como um cidadão de bem se defender. Resta buscar o amparo das medidas judiciais cabíveis. E, depois, a responsabilidade pelos abusos e pelos danos à honra”, finaliza.
Grass se pronuncia
Embora Clemente não tenha citado oficialmente o nome de nenhum deputado, o distrital Leandro Grass se sentiu diretamente ofendido porque é o único que até o momento se apresentou como candidato ao GDF na CLDF.
Em nota, Grass disse que levou ao MPDFT, em dezembro do ano passado, “preocupações com o projeto Brasília Iluminada, que custou cerca de R$ 14 milhões para a população do DF”. “Esse valor é quase o dobro do que foi gasto no ano anterior com o mesmo propósito”, pontuou.
“Ao contrário do que o ex-secretário publicou em nota, eu não fiz denúncia contra nenhum parlamentar nem questionei as emendas apresentadas. Também não afirmei que a indicação ao TCDF foi ‘vendida’, conforme ele aponta”, assinalou o distrital.
Segundo Grass, o que o motivou a procurar o MPDFT e falar sobre o projeto “foi a forma pouco convencional como tudo tramitou no GDF”. “O programa foi executado por uma secretaria que não detém a expertise técnica necessária e, além do valor fora dos padrões para uma ação feita por uma organização da sociedade civil, o tempo entre a aprovação e a execução foi recorde”, salientou.
TCDF
Por meio de nota, o TCDF comunicou que fiscaliza o projeto de ornamentação desde agosto de 2021. Sobre as buscas no gabinete de Clemente, a Corte explicou que vai buscar informações com o Judiciário, “colaborar com as investigações, se colocar à disposição para eventuais esclarecimentos e continuar cumprindo seu dever legal de fiscalizar os gastos públicos distritais”.
Veja a nota na íntegra:
“Em relação ao Brasília Iluminada, o Tribunal de Contas do Distrito Federal esclarece que fiscaliza o projeto de ornamentação de fim de ano desde agosto de 2021 – por meio dos processos 8074/21 e 13466/21 -, ao analisar as representações protocoladas pelo Ministério Público junto ao TCDF.
A Corte verifica a ocorrência de supostas irregularidades na celebração e na execução do Termo de Fomento nº 21349/2021, firmado entre a Secretaria de Estado de Economia do DF – SEEC/DF e o Instituto de Desenvolvimento Humano, Empreendedorismo, Inovação e Assistência Social – IDHEIAS por meio do Processo 00600-00013466/2021-30.
Em janeiro, inclusive, o corpo técnico do TCDF fez visitas in loco às instalações do Brasília Iluminada no Eixo Monumental para verificar a conformidade da execução do contrato e, neste momento, os auditores do TCDF analisam a documentação relativa à contratação.
Em relação à Operação Tenebris, que envolve um membro da Corte, o Tribunal de Contas informa que vai buscar informações junto ao Judiciário, colaborar com as investigações, se colocar à disposição para eventuais esclarecimentos e continuar cumprindo seu dever legal de fiscalizar os gastos públicos distritais.
O TCDF também lembra que um dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito e da Constituição Federal é a presunção de inocência. Diante disso, o TCDF aguarda o andamento das investigações e o posicionamento da Justiça.”