Murros e xingamentos: 86 LGBTs foram agredidos no DF. Relembre casos
Em 2023, o DF teve 86 casos de homotransfobia, de acordo com a Secretaria de Segurança Pública do DF. Neste ano, já são 46 ocorrências
atualizado
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Logo após comemorar o “direito de existir”, o técnico de enfermagem Rodrigo Pereira, 35 anos, quase morreu. Ele saía da Parada LGBT, em 2023, quando parou em um posto de gasolina no Plano Piloto. Um dos funcionários da loja de conveniência teria proferido ofensas homofóbicas e ameaçado o jovem, que começou a filmar as agressões. Rodrigo foi brutalmente espancado, com golpes de barra de ferro. O caso dele é um dentre os 86 registrados no Distrito Federal em 2023.
Os dados são da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF), e contabilizam ocorrências de janeiro a dezembro do ano passado.
Em 2024, a secretaria apontou uma pequena redução, de 4%, nos primeiros seis meses se comparado ao ano passado. No primeiro semestre deste ano, foram 46 ocorrências, enquanto no ano passado foram 48 casos.
A noite de violência não sai da cabeça de Rodrigo. Momentos antes da agressão, ele estava em meio a 90 mil pessoas em um evento que celebra a diversidade. No entanto, sozinho no posto, Rodrigo virou alvo por ser diferente.
“Enquanto eu estava na fila, tinha um cara que trabalha na entrada da conveniência me chamando de gay e que todo gay tem que morrer”, lembrou. “Isso foi do nada, eu não fiz nada contra ele. Mas aí comecei a filmar e tirar foto dele. Ele, com raiva, pegou uma barra de ferro e começou a me bater na perna , nas costelas e quando foi acertar minha cabeça coloquei o braço”, contou. “Eu pedi socorro, ninguém me ajudou”, relatou.
Rodrigo teve fratura exposta e precisou fazer cirurgia. O homem precisou colocar três pinos e uma placa, e ficou mais de um mês afastado do trabalho pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) .
“Senti medo, muita dor, achei que fosse morrer”, contou Rodrigo. Ele registrou boletim de ocorrência, mas não viu a investigação andar. Neste ano, a história de Rodrigo entrou para Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF), que protocolou um ofício junto à Secretaria de Segurança Pública do DF pedindo que o caso de extrema violência fosse apurado.
“Realizar a apuração do caso, assegurando a investigação dos fatos e a responsabilização dos envolvidos conforme legislação vigente; informar sobre o andamento e as providências tomadas em relação ao caso, garantindo a transparência e o acesso à informação para a vítima”, cita o documento.
O ofício foi enviado em março para a secretaria, mas até hoje não foi respondido. O Metrópoles questionou a instituição, mas também não obteve resposta.
Homicídios
Apesar da gravidade das lesões, o caso de Rodrigo não foi o mais violento de homotransfobia registrado no DF ano passado. Em 2 de novembro, Elisvan dos Santos Morais se incomodou com as expressões de Boaz William da Silva e o espancou com socos e chutes.
O caso foi denunciado por homicídio qualificado pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), que apontou, ainda, que Elisvan torturou a vítima com cabo de vassoura enfiado no ânus. No fim, o suspeito jogou o homem em um colchão e ateou fogo nele, ainda vivo.
Elisvan está preso desde o dia do crime.
Um outro caso é o do assassinato de Júnior de Souza Nascimento, 24 anos. O rapaz foi encontrado morto em um cisterna no Sol Nascente, em 1º de junho do ano passado. De acordo com as investigações, a vítima foi assassinada após “dar uma cantada” no homem que viria a ser seu algoz.
O suspeito, identificado como João Mendes da Silva, teria usado uma picareta para matar Júnior, segundo as investigações; em seguida, jogou o corpo dele, de ponta cabeça, em uma cisterna.
Câmeras de segurança registraram o momento em que os dois se encontraram, na rua. Nas imagens, João aparece de camiseta azul, calça preta, mochila e tênis. Inicialmente, o jovem fica na calçada. Pouco depois, parece conversar com uma pessoa – Júnior – que está do outro lado da pista.
A vítima gesticula e pede para que o indivíduo se aproxime. O criminoso atravessa a avenida, os dois conversam e saem juntos do campo de registro da câmera. Os investigadores ainda não sabem se os dois já se conheciam ou se o primeiro contato entre eles aconteceu no dia do homicídio. João foi preso uma semana após o crime.
Homofobia e racismo
Também no ano passado, a síndica de um prédio em Vicente Pires foi presa em flagrante após xingar homens gays e negros de “viados escrotos”. Os homens tiveram a casa invadida na noite anterior, enquanto estavam em uma festa. Ao perceberem que houve presença de criminosos na residência deles, os dois pediram pela liberação das imagens de câmeras de segurança.
“Ela não quis liberar as imagens. Nos xingou muito e nos chamou de ‘viados escrotos’, além de ter sido racista. Falou que não nos mostraria as imagens por conta da nossa sexualidade”, disse uma das vítimas.
O caso ocorreu em setembro de 2023. Na ocasião, a Polícia Civil prendeu a síndica em flagrante por injúria preconceituosa e homofobia, sem direito a fiança.
Crime
Desde 2019, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu incluir homofobia e transfobia no rol de crimes definidos na Lei do Racismo.
O registro dessas naturezas criminais pode ser feito em qualquer delegacia de área ou na Delegacia Especial de Repressão aos Crimes por Discriminação Racial, Religiosa ou por Orientação Sexual ou contra a Pessoa Idosa ou com Deficiência (Decrin), que fica no Departamento de Polícia Especializada (DPE), no Parque da Cidade.
A Decrin funciona de segunda a sexta, das 12h às 19h. Outro serviço disponível é o da Delegacia Eletrônica, que pode ser acessado pelo site da Polícia Civil.
Canais de denúncia
Em caso de emergência, a Polícia Militar (PMDF) está disponível pelo número 190.
A Polícia Civil (PCDF) também disponibiliza quatro canais de atendimento para registro de ocorrências:
– Denúncia on-line;
– E-mail: denuncia197@pcdf.df.gov.br;
– Telefone: 197, opção 0 (zero);
– WhatsApp: (61) 98626-1197.