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MPT investiga assédio a servidores locais. Há registros desde 2013

Ocorrências incluem, segundo o Ministério Público do Trabalho no DF, desde perseguição de gestores a casos sexuais

atualizado

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importunação sexual
1 de 1 importunação sexual - Foto: Igo Estrela/Metrópoles

O Ministério Público do Trabalho do Distrito Federal (MPT) analisa 20 casos de assédio, entre moral e sexual, contra servidores públicos no âmbito do Poder Executivo brasiliense. Entre denúncias, inquéritos e ações civis, os episódios investigados, que geralmente envolvem perseguição e humilhação, ocorreram nas gestões dos ex-governadores Agnelo Queiroz (PT), Rodrigo Rollemberg (PSB) e na atual administração do governador Ibaneis Rocha (MDB).

O número de investigações deveria ser maior, segundo fontes ouvidas pela reportagem, mas as vítimas geralmente têm medo de denunciar. Além de duvidarem da punição aos responsáveis, muitas temem perder o emprego e serem reprovadas pela família, amigos e colegas.

Este ano, o MPT-DF abriu dois inquéritos civis para investigar um suposto caso de assédio sexual e moral e outro episódio com indício de assédio moral na Companhia de Saneamento Ambiental do DF (Caesb). Também em 2019, existem procedimentos para apurar suspeitas de assédio moral no Sistema Penitenciário e no Hospital Regional do Gama (HRG).

Segundo o MPT-DF, estão em marcha cinco inquéritos para investigar assédio moral em 2018, último ano do governo Rollemberg. Dois apuram suspeitas Secretaria de Saúde. Os demais destrincham denúncias na Polícia Civil, no Sistema Penitenciário e no antigo Instituto Hospital de Base do DF (IHBDF) – atual Instituto de Gestão Estratégica de Saúde do DF (Iges-DF).

Com relação a 2017, também existem investigações em andamento de assédio moral no Hospital Regional de Santa Maria (HRSM), no Instituto Médico Legal (IML) e na Secretaria de Esporte.

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A maioria dos casos denunciados envolve servidores da Saúde

Também faz parte da lista de casos duas ações civis na Justiça. A subsidiária de Distribuição da Companhia Energética de Brasília (CEB) é ré um dos processos envolvendo suposto assédio sexual e moral em 2016, ainda na gestão Rollemberg. Servidores teriam assediado mulheres.

Segundo o MPT-DF, o relatório da comissão de sindicância da estatal comprovou a existência de conduta imprópria, mas não houve provas da autoria e a materialidade. Diante do risco de novos casos, o Ministério Público propôs um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), mas a empresa se negou. Na ação, o MPT-DF cobra multa de R$ 5 milhões, além da adoção de medidas para evitar o assédio na estatal.

Outro processo em andamento busca a responsabilização da ex-administradora regional do Lago Norte, a ex-deputada distrital Sandra Faraj. De acordo com o Ministério Público do Trabalho, entre 2013 e 2014, durante a gestão de Agnelo Queiroz, ela teria praticado discriminação religiosa contra os servidores da administração. Os demais casos em aberto ainda estão na fase de denúncia ou caminham sob sigilo.

Perseguição

Em entrevista ao Metrópoles a procuradora do MPT-DF Renata Coelho contou detalhes de um caso emblemático de assédio moral na Secretaria de Saúde. Para preservar a imagem das vítimas, nomes das partes e local de trabalho não serão revelados. As carreiras de um grupo de médicas estavam sendo prejudicadas pelo gestor. As profissionais eram perseguidas e proibidas de ascender profissionalmente porque criticavam a administração. A perseguição começou na gestão Rollemberg e seguiu até 2019.

Havia um chefe de setor que indeferia férias. Tinha uma vítima há anos sem descanso. Os piores turnos eram para elas. Dobravam, triplicavam os turnos, o que é vedado por lei. Todos os requirimentos, até para estudo, eram indeferidos. Eram práticas de gestão utilizadas para recriminar. Era perseguição. Aquilo era feito porque as médicas criticavam certas irregularidades que viam, denunciavam. Era para perseguir quem procurava Justiça

Renata Coelho, procuradora do MPT-DF

O drama foi resolvido neste ano, a partir do diálogo com o GDF. Resumidamente, todas as partes foram transferidas para outras áreas. E houve um estudo para se evitar novos casos. “Pela primeira vez, houve uma postura resolutiva”, elogiou. Via de regra, segundo a procuradora, no serviço público em geral, a investigação fica amarrada em um mar de burocracia. “E o setor de Saúde no GDF, para mim, é disparado o local com o maior índice de assédio moral e sexual. Os servidores da área estão doentes. As práticas são violentíssimas”, alertou a procuradora .

Chantagem eleitoral

A procuradora também relatou dois casos de assédio moral em empresas estatais. Nestes episódios, os assediadores buscavam coagir politicamente os trabalhadores em busca de votos para determinada candidatura em eleições passadas. “Eram coagidos no local de trabalho, por orientações verbais. Quem não seguia passava a ser perseguido, receber piadinhas como: ‘Ó, sua cabeça vai rolar. Depois das eleições, vocês vão rodar'”, ressaltou. Em um dos casos, não houve provas suficientes. Outro está em aberto.

O Metrópoles também ouviu os relatos de servidores que relatam ter sofrido assédio moral atualmente. Os casos, contudo, ainda não chegaram ao MPT-DF. Novamente, as identidades serão mantidas em sigilo. “No começo da gestão, fomos taxados como um dos piores setores do governo. Questionamos e ficaram com raiva da gente. Passamos a viver como se fossemos bandidos”, contou um servidor. A perseguição constante custou a saúde dele. A vida familiar também foi comprometida.

“O objetivo era prejudicar. Começaram a investigar nossa vida pessoal. Usam o poder para perseguir as pessoas de forma covarde”, desabafou. Outro trabalhador da área da Saúde vive drama semelhante. Mesmo doente, é alvo de chacota e discriminação dos gestores Mas, apesar do tormento, teme denunciar. “Pode virar uma represália. Tenho medo. Tem muito servidor que, ao invés de apoiar os demais, puxa o saco do gestor. O que a gente mais vê é isso”, lamentou.

Igo Estrela/Metrópoles

 

Problema crescente

Do ponto de vista de Renata Coelho, o assédio moral e sexual vem crescendo ao longo dos últimos 30 anos, com formas cada vez mais fluidas e quase invisíveis. As práticas são sutis, diz ela, como isolar o trabalhador ou não dar tarefas para ele. “Ou o gestor dá funções muito acima da capacitação da pessoa”, explicou. A falta de tipificação do assédio moral complica a investigação.

No caso do assédio sexual, o assediador manda mensagens, vídeos e links para a vítima. “Já tive caso de links. A pessoa mandava e, quando a mulher acessava, eram imagens de órgãos sexuais. O assédio ocorre sem o contato físico, sem testemunhas”, detalhou.

O local de trabalho tem que ser um ambiente em que a pessoa entra sã e sai sã. Você percebe que as pessoas pararam de dizer que o trabalho dignifica o homem. Perdeu-se o sentido da atividade laboral como realização. Hoje, o trabalho enlouquece. As pessoas chegam aqui com o seguinte sentimento: meu trabalho está me matando

Renata Coelho, procuradora do MPT-DF

Canais de denúncias

Vítimas podem fazer denúncias anônimas ou sigilosas no site do MPT-DF. A plataforma permite o anexo de áudio, vídeo e imagens. Outro canal e no próprio GDF, pelo telefone 162, presencialmente ou pelo site da Ouvidoria.

Os sindicatos recebem denúncias de assédio semanalmente. Segundo o presidente do  Sindicato dos Servidores Públicos Civis da Administração Direta, Autarquias, Fundações e do Tribunal de Contas do Distrito Federal (Sindireta-DF), Ibrahim Yusef, a instituição pediu a transferência de área de 10 vítimas de assédio neste ano. “É um problema muito sério. Conhecemos casos de pessoas que estão pensando em se suicidar”, assinalou.

Para a presidente do Sindicato dos Enfermeiros do DF, Dayse Amarílio, o assédio é alimentado pelo aparelhamento político do governo. “Os gestores estão mais preocupados com os conchavos políticos e colocam pessoas completamente despreparadas nas chefias. A crise também agrava a situação. Muito gestor fica sem saber o que fazer e acaba virando um assediador”, ponderou. Desde abril deste ano, o sindicato recebe cinco denúncias de assédio por mês.

A presidente do Sindicato dos Servidores da Saúde local (SindSaúde-DF), Marli Rodrigues, compartilha da avaliação dos demais sindicalistas. “O assédio moral é um dos causadores da depressão do suicídio”, afirmou. Neste contexto, o sindicato criou um centro de tratamento psicológico para os servidores, vítimas não apenas de perseguição, mas das doenças de mente, o Centro de Atendimento e Estudos da Saúde do Servidor Público do DF (Caessp-DF) – Espaço NovaMente.

Localizado no Guará, o local atende trabalhadores de todo GDF. Desde a inauguração neste ano, 60 pessoas foram auxiliadas. Além das sessões in loco, a equipe multidisciplinar, incluindo fisioterapeuta e assistente social, por exemplo, também se desloca até a residência do paciente. Segundo a psicóloga do instituto Jaqueline Marques, o assédio não é praticado apenas pela chefia, mas também pode ser feito por colegas. “O dano é, principalmente, psicológico”, declarou. A cura costuma demandar muito tempo, além do afastamento do trabalhador do local de assédio. A ajuda da família é fundamental.

Na versão clássica, o assédio poderia ocorrer através de sucessivos ataques contra a honra do trabalhador. Mas, segundo o novo entendimento da Organização Internacional do Trabalho (OIT), o abuso pode ser caracterizado por apenas um ato.

Outro lado

O Metrópoles entrou em contato com o GDF sobre a questão. No entanto, até o fechamento desta reportagem, não houve resposta. Também procuradas, Polícia Civil e a ex-administradora regional Sandra Faraj não se manifestaram.

A CEB Distribuição enviou nota sobre o assunto. Diz que foi instaurada sindicância, na qual “não ficou caracterizada a prática de assédio sexual”. A assessoria de Comunicação e Eventos afirmou que a companhia já promovia campanhas internas sobre o tema. “As ações culminaram, em junho de 2019, na aprovação em Diretoria Colegiada do Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e Moral na CEB. O programa, que será lançado em 14 de outubro de 2019, já foi encaminhado ao Ministério Público para conhecimento”. Sobre o TAC, segundo a nota, o Ministério Público constatou que a CEB adotava medidas preventivas para o assédio sexual e moral. Por isso, não havia a necessidade do termo.

A Caesb não comentou os casos, mas afirmou que responde às solicitações do MPT-DF e se posiciona nos autos do processo. “A Companhia tem uma série de normas e procedimentos internos de apuração e correção, que tramitam internamente. Realizamos ações preventivas, como campanhas de esclarecimento e palestras. A Caesb também presta apoio psicológico e mantém um atendimento na Ouvidoria para receber queixas e denúncias dos empregados”, comentou por nota.

A Subsecretaria do Sistema Penitenciário (Sesipe) informou que foi instaurado procedimento preliminar, em 25 de setembro deste ano, para apurar um possível caso de assédio moral. Segundo o órgão, apenas após o fim da apuração, em sigilo, será possível constatar se houve falta disciplinar. “Um outro procedimento apuratório, iniciado em 2018, foi arquivado após não serem constatadas irregularidades”, pontuou. “A Sesipe ressalta que não se coaduna com nenhuma prática de assedio ou perseguição a servidores”, completou.

A pasta do Esporte afirmou que repudia qualquer prática de assédio. “A denúncia feita ao MPT é um caso antigo da gestão passada, que ocorreu em 2016. Até o momento, não chegou à nova administração nenhuma denúncia desse tipo”, argumentou. O Iges-DF disse não ser possível comentar o caso. Mas também enfatizou que não admite qualquer tipo de conduta relacionada a assédio moral por parte de seus colaboradores.

A Secretaria de Saúde destacou que denúncias recebidas na Controladoria Setorial de Saúde são encaminhada à Corregedoria da Saúde. Caso seja comprovada a denuncia, é aberto Procedimento Investigativo Preliminar (PIP) e posterior Processo Administrativo Disciplinar (PAD), preservando o sigilo das informações, autonomia e independência da comissão de apuração.

“A pasta esclarece que mantém os cuidados de promoção e preservação da saúde de seus servidores. Aproximadamente 100 profissionais distribuídos na rede pública de saúde possuem, entre outras responsabilidades, manter canal de comunicação direto e aberto para colher denúncias de qualquer forma de assédio. Ao menor sinal de alerta, as equipes comparecem no local de lotação dos servidores para colher mais informações e fazer um diagnóstico mais preciso da situação”, comentou a pasta por nota.

Confira a cartilha do MPT-DF sobre assédio sexual no trabalho:

Cartilha sobre assédio sexual no trabalho by Metropoles on Scribd

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