MPF: propina no BRB pagou festa de casamento e camarote no Rock in Rio
Segundo o Ministério Público Federal, ex-dirigentes do Banco de Brasília receberam vantagens ilícitas
atualizado
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No rol de benefícios recebidos pelos diretores e ex-diretores do Banco de Brasília (BRB), segundo operação da Polícia Federal deflagrada nesta terça-feira (29/1), estão o pagamento de uma luxuosa festa de casamento em Brasília e de um camarote na disputada abertura do festival Rock in Rio.
Os gastos teriam sido arcados pelo empresário Ricardo Siqueira Rodrigues, apontado como o maior operador de fundos de pensão no país e um dos delatores do esquema criminoso envolvendo a cúpula do banco brasiliense.
A operação, batizada de Circus Maximus, investiga o suposto pagamento de mais de R$ 40 milhões em propinas a dirigentes do BRB para viabilizar negócios.
As informações fazem parte do processo que resultou no pedido de 14 prisões preventivas e temporárias e mandados de busca e apreensão em 34 endereços no Distrito Federal, no Rio de Janeiro e em São Paulo
Entre os investigados, estão o ex-presidente do BRB Vasco Cunha Gonçalves, recém-nomeado para presidir o Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes), e os agora ex-diretores Financeiro e de Relações com Investidores, Nilban de Melo Júnior, e de Serviços e Produtos, Marco Aurélio Monteiro de Castro. Os três são alvo de mandados de prisão, expedidos pela 10ª Vara da Justiça Federal em Brasília e foram afastados do banco nesta terça (29).
Segundo os investigadores, o dinheiro ilícito bancou a festa de casamento da filha de Nilban, Ana Cláudia Melo, em dezembro de 2015. O relatório do Ministério Público Federal apresentado à 10ª Vara da Justiça Federal traz um trecho da delação de Ricardo Rodrigues, no qual o empresário diz ter pago R$ 50 mil à dona do buffet contratado para a cerimônia.
Nilban era, até o escândalo vir à tona, cotado para assumir um cargo de confiança na Secretaria de Fazenda, Planejamento, Orçamento e Gestão do GDF.
Rodrigues afirmou que o objetivo era “se aproximar” do pai da noiva, então diretor Financeiro e de Relação com Investidores do BRB. No mesmo episódio, o empresário afirma ter entregado R$ 60 mil em notas de R$ 100 para Nilban. O objetivo da propina seria destravar a liberação de uma linha de crédito de R$ 20 milhões do BRB para a empresa responsável pela construção do hotel LSH Lifestyle, na Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro.
Segundo os promotores, no episódio, Nilban praticou crime previsto no artigo 317 do Código Penal: solicitar, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem ilícita ou aceitar promessas de tal vantagem. A pena prevista é de um a oito anos de reclusão e multa.
Já a conduta de Rodrigues poderia ser enquadrada no artigo 333: oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício. A punição é de um a oito anos de detenção e multa.
Rock in Rio
O delator Ricardo Rodrigues afirmou ter convidado Vasco Gonçalves e Nilban Júnior para um camarote VIP do primeiro dia do disputado festival de música Rock in Rio em 2015. A principal atração da noite foi a banda Queen. As passagens para o evento também foram custeadas pelo empresário.
Segundo o relatório do MPF, o objetivo do empresário era conversar com os dirigentes do BRB sobre novos aportes ao empreendimento carioca. No dia seguinte aos shows, Nilban e Vasco teriam encontrado Rodrigues nas instalações inacabadas do hotel. Segundo o delator, na reunião, ele falou sobre a necessidade de R$ 50 milhões para a finalização da obra.
O projeto levava o sobrenome do presidente dos Estados Unidos, Trump. Mas, devido a entraves contratuais e com a Polícia Federal no encalço de pessoas ligadas à LSH, o grupo norte-americano desfez a parceria. Em 2016, o Trump Hotel Rio passou a se chamar LSH Lifestyle.
Veja trechos da investigação do MPF:
Entenda o caso
O LSH Barra Empreendimentos Imobiliários S.A., responsável pelo LSH Lifestyle Hotels, ex-Trump Hotel Rio, criou, em 2012, o Fundo de Investimento em Participações (FIP) LSH a fim de viabilizar o projeto.
A LSH foi ao mercado e lançou debêntures (títulos de dívida) junto a instituições financeiras para captar recursos destinados à construção do hotel na Barra da Tijuca, bairro nobre da capital fluminense.
A operação totalizou R$ 80 milhões em valores corrigidos, conforme noticiou a Coluna Radar, da Revista Veja, em julho do ano passado. Desse total, 42% são do BRB (R$ 33,6 milhões). A instituição financeira adquiriu, administrou e custodiou o fundo por quase quatro anos, entre 2013 e 2017.
Segundo balanço publicado em março de 2018, o banco teve outra participação no negócio. A BRB-DTVM Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S.A., coligada do BRB, fez um aporte de R$ 18,5 milhões no fundo criado pela empresa LSH. Esse valor, contudo, foi a título de investimento e não é cobrado na ação judicial movida pelo Banco de Brasília.
Os problemas começaram a aparecer com o desenrolar, nos últimos anos, de investigações da Polícia Federal que apontavam irregularidades na gestão da empresa carioca. A situação complicou-se a ponto de o hotel que ostentava a marca de Donald Trump precisar mudar de nome.
O outro lado
Sobre a denúncia de que Ricardo Rodrigues teria pago o buffet do casamento da filha de Nilban, o advogado Rodrigo Alencastro afirmou que o serviço foi pago pelos próprios noivos. “Temos as notas fiscais. E o valor foi mais modesto. R$ 36 mil”, afirmou o defensor.
Alencastro negou que o ex-diretor do BRB tenha recebido R$ 60 mil em dinheiro, como afirmou o delator, e que a viagem de Nilban para o Rio de Janeiro durante o Rock in Rio foi custeada por Ricardo Rodrigues.
“O Nilban sempre esteve à disposição das autoridades e prestará todos os esclarecimentos”, afirmou o advogado, que também considerou como “drástica” a prisão de seu cliente.
O BRB afirmou, em nota, apoiar e cooperar “integralmente com todos os órgãos competentes que conduzem a operação”. Informou, também, que a ação corre em segredo de Justiça e todas as informações serão repassadas exclusivamente às autoridades policiais. “O BRB adotará todas as medidas judiciais cabíveis visando preservar o banco e suas empresas controladas”, completou.
Segundo o LSH Hotel, os fatos investigados referem-se a um período anterior à atual administração da companhia. Pontuou, ainda, que a empresa colabora com a PF e o MPF. “O LSH Hotel se mantém operando normalmente e sem impacto para os hóspedes”, concluiu.
As defesas dos demais citados não haviam sido localizadas até a última atualização desta reportagem