MPC denunciou suposto esquema de corrupção na Saúde do DF em maio
Três meses antes da prisão de seis integrantes do alto escalão da Saúde do DF, o MPC já apontava supostas irregularidades nos contratos
atualizado
Compartilhar notícia
Três meses antes de o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) deflagrar a Operação Falso Negativo, que levou à prisão do então secretário de Saúde do DF, Francisco Araújo, e outros cinco integrantes da cúpula da pasta, o Ministério Público de Contas (MPC) já apontava supostas irregularidades na compra de testes de Covid-19 para a capital.
Em 7 de maio, a procuradora do MPC Cláudia Fernanda de Oliveira Pereira assinou representação pedindo a investigação das aquisições de testes e contratação de empresas, no valor de R$ 71,9 milhões à época.
No documento é solicitada a análise dos contratos e das notas de empenho efetuadas a seis empresas. Um dos destaques do pedido de investigação foi para a Luna Park Importação, Exportação e Comércio Atacadista de Brinquedos Temáticos. A nota de empenho com pedido de investigação refere-se a um contrato no valor de R$ 3,6 milhões para aquisição de testes rápidos.
“É possível notar, por exemplo, empresa do ramo atacadista de brinquedos temáticos, oferecendo o testes. Essa discussão é relevante, já tendo sido detectadas compras de produtos de saúde por empresas que não demonstraram aptidão”, argumenta a procuradora na representação encaminhada para análise do Tribunal de Contas do DF (TCDF).
Houve ainda questionamentos à Secretaria de Saúde sobre contratação de laboratório particular que aludiu à contratação pelo GDF.
Outras representações e apurações
Outros pedidos de investigação, além do feito pelo MPC, foram elaborados acerca das compras de testes de Covid-19. Um do deputado Leandro Grass (Rede), que foi juntado ao processo 897/20, e outro do Sindicato dos Laboratórios de Pesquisas e Análises Clínicas (Sindilab-DF) – ambos com o mesmo teor da solicitação formulada pelo MPC.
Em relação ao processo 657/2020, do MPC, o Plenário do TCDF, em 15 de julho de 2020, determinou o arquivamento dos autos, por ter considerado a perda do objeto. Em decisão de mérito posterior, no entanto, o TCDF autorizou a fiscalização do Contrato n.º 79/2020. Esse contrato foi pactuado entre a Secretaria de Saúde DF e a empresa Biomega Medicina Diagnóstica Ltda., no valor de R$ 19,9 milhões.
Ele prevê a “execução de serviços laboratoriais de análises clínicas, para a realização de 100 mil testes rápidos para o novo coronavírus IgG e IgM”. As fiscalizações estão em curso na Corte de Contas.
No âmbito desse processo, o tribunal fez o registro de representação do Ministério Público junto ao TCDF para subsidiar futuras fiscalizações. Como a representação também tratava de outros, a Corte de Contas entendeu que “em meio a uma pandemia, as supostas falhas indicadas no documento protocolado como ‘atendimentos lotados nos prontos-socorros’ e dificuldade de comunicação pelos telefones disponibilizados pela SES/DF, tratam de questões estruturantes, e não pontuais. Portanto, elas demandam exame mais amplo e aprofundado por meio de auditoria operacional feita em momento oportuno”, informou a Corte ao Metrópoles.
Já a representação formulada pelo deputado distrital Leandro Grass (Rede) sobre possíveis irregularidades relacionadas à falta de transparência dos gastos públicos em procedimentos de compras de testes para verificação da Covid-19, o TCDF determinou à Controladoria-Geral do Distrito Federal ( CGDF) e à Secretaria de Saúde (SES-DF) que apresentasse informações.
A SES encaminhou os dados, que foram analisados pelo corpo técnico do TCDF. O relator do caso, conselheiro Inácio Magalhães, então enviou o processo para manifestação do MPC no dia 13 de agosto, por meio do Despacho Singular 510/2020. Investigação também é feita no âmbito do pedido de medida cautelar, formulada pelo Sindilab-DF, apontando supostas irregularidades na aquisição de testes rápidos para detecção qualitativa específica de IgG e IgM.
“Em relação aos testes para detecção do novo coronavírus, o TCDF está fiscalizando atentamente as aquisições. Há cinco processos em tramitação no tribunal tratando da compra de testes rápidos para detecção qualitativa específica de IgG e IgM e antígeno do COVID- 19”, informou a Corte.
A operação
A investigação do MPDFT apura suposto superfaturamento em cima dos contratos citados anteriormente pelo MPC, que já somam cerca de R$ 73 milhões na compra de testes de Covid-19 pelo Governo do Distrito Federal (GDF).
O prejuízo estimado pelo MP aos cofres públicos é de R$ 18 milhões. O desembargador do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) Humberto Adjuto Ulhôa determinou o bloqueio do montante das contas dos investigados na Operação Falso Negativo.
Além de Araújo, que foi detido em casa, no Setor Noroeste, são alvo de prisão preventiva: Ricardo Tavares Mendes, ex-secretário adjunto de Assistência à Saúde; Eduardo Hage Carmo, subsecretário de Vigilância à Saúde; Eduardo Seara Machado Pojo do Rego, secretário adjunto de Gestão em Saúde; Jorge Antônio Chamon Júnior, diretor do Laboratório Central (Lacen); Iohan Andrade Struck, subsecretário de Administração Geral da Secretaria de Saúde do DF; e Ramon Santana Lopes Azevedo, assessor especial da Secretaria de Saúde.
Veja os investigados:
Entre os alvos, Iohan Andrade Struck não foi encontrado pelos investigadores e, até a última atualização desta reportagem, era considerado foragido. A defesa de Iohan alega que ele está isolado por suspeita de coronavírus.
De acordo com o processo do MPDFT, “há fortes indícios” de que o ex-secretário de Saúde Francisco Araújo teria “escolhido previamente como vencedora a empresa de brinquedos.” A Luna Park Park Importação, Exportação e Comércio Atacadista de Brinquedos Temáticos foi contratada pela pasta para fornecer 90 mil testes por R$ 16,2 milhões, segundo a investigação.
O processo diz que o contrato foi firmado com a empresa “embora [a Luna Park] tenha oferecido o maior valor por unidade de teste na dispensa de licitação, a sua documentação tenha sido oferecida fora do prazo e o parecer inicial relativo à sua proposta tenha sido pela rejeição”.
Outro lado
A Biomega informou, por meio de nota, que “não vendeu ao GDF kits de testes rápidos para detecção da Covid-19″. “A empresa é um laboratório de análises clínicas que participou de um processo licitatório para prestação de serviços de exames laboratoriais de anticorpos para a Covid-19. O serviço incluiu montagem de tendas, disponibilização de mobiliário apropriado e alocação de recursos humanos nas áreas administrativa, técnica e de analistas especializados na leitura dos testes, que assinam os laudos”, afirmou.
Segundo a Biomega, fez parte da prestação de serviço a locação de carros e a contratação de empresa especializada para a remoção do lixo hospitalar. “O contrato firmado previa a realização de exames em 100 mil pessoas, tendo havido aditamento para a inclusão de outras 50 mil pessoas examinadas”, disse.
A Luna Park ainda não se pronunciou. O espaço está aberto a eventuais manifestações.