Mossoró: empresa investigada tem contrato com prisão onde Marcola está
Empresa de manutenção é investigada pela suspeita de usar “laranjas”. Ministério pede apuração rigorosa sobre denúncias após fuga em Mossoró
atualizado
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A empresa responsável por obras de manutenção no presídio federal de Mossoró (RN), que registrou as duas primeiras fugas da história em uma prisão do tipo, também tem contrato com a Penitenciária Federal de Brasília.
Apontada por suposto esquema de “laranjas”, a R7 Facilities, agora alvo de investigação, tem contrato assinado com a União de mais de R$ 2 milhões (R$ 2.088.591,60) para atender “as necessidades da penitenciária” na prestação de serviços continuados de apoio técnico e administrativo. O acordo tem vigência até 9 de março deste ano.
Localizado no Distrito Federal, o presídio abriga o líder do Primeiro Comando da Capital (PCC), Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola.
Investigações da Polícia Federal já identificaram ao menos três planos de fuga para libertar o chefe da facção. Um deles foi interceptado em 2022 e previa resgate cinematográfico no presídio federal de Porto Velho (RO), onde Marcola estava preso à época.
Relembre como era o audacioso plano de resgate de Marcola em Brasília
Já os fugitivos de Mossoró são matadores do Comando Vermelho (CV), facção rival do PCC. Os criminosos conseguiram escapar de uma unidade federal utilizando estratégia que ainda é alvo de diligências policiais.
Contratos
Em nota, o Ministério da Justiça e Segurança Pública, responsável pela administração das penitenciárias federais, informou que vai pedir investigações aos órgãos competentes federais sobre a lisura da R7 Facilities (veja abaixo as íntegras das notas).
Presídio de Mossoró (RN) já foi interditado por defeitos estruturais
Apesar das desconfianças, a pasta informou que não há preceitos de legalidade para suspender ou rescindir contratos vigentes sem o devido processo legal.
A manifestação do ministério ocorreu após o jornal O Estado de S. Paulo revelar que, apesar dos contratos milionários com o governo federal, o sócio-administrador da empresa recebeu auxílio emergencial e tem dívidas ativas em valores inferiores a R$ 10 mil.
As denúncias, publicadas pelo jornal nesta quarta-feira (21/2), foram confirmadas pelo Metrópoles.
Serviços oferecidos
Contratada por meio de pregão eletrônico, a empresa deve oferecer serviços terceirizados de auxiliar administrativo, assistente administrativo, motorista de viatura oficial, recepcionista e controle de estoque (almoxarifado).
A abertura do pregão eletrônico ocorreu em 5 de janeiro de 2023, já no governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), sob a gestão do então ministro Flávio Dino.
Já o contato para prestar serviços de manutenção na Penitenciária de Mossoró (RN) ocorreu em abril de 2022, enquanto Anderson Torres comandava a pasta, no governo de Jair Bolsonaro (PL).
No ano seguinte, o contrato foi renovado por Dino – sucessor de Torres após a mudança de governo.
Suspeita de “laranjas”
A R7 Facilities tem vencido licitações públicas desde 2016; e recebeu quase R$ 373 milhões (R$ 372.867.335,98) em repasses do governo federal.
A empresa também tem participado de licitações com o Governo do Distrito Federal, arrecadando quase R$ 11 milhões (R$ 10.788.811,77) dos cofres públicos brasilienses a partir do mesmo período.
Apesar dos montantes, o sócio-administrador da empresa é Gildenilson Braz Torres, que recebeu R$ 4,5 mil em auxílio emergencial.
Em 2020, Gildenilson recebeu cinco parcelas de R$ 600 e quatro de R$ 300. Em 2021, foram pagas três parcelas de R$ 150, mas o sócio da empresa milionária teve de devolver uma delas para o governo federal.
No ano em que a empresa faturava milhões em contratos com o governo federal, Gildenilson recebeu sentença de penhora em bens para pagar uma dívida de R$ 8,6 mil. O processo está no Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios.
Aberta em 2009 por Ricardo de Souza Lima Caiafa, a empresa foi registrada com o nome dele na época. Em 2022, Caiafa recebeu 3.879 votos e foi eleito suplente pelo Partido Liberal (PL) na Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF).
Fuga em Mossoró
Em 14 de fevereiro, Rogério da Silva Mendonça, de 35 anos, e Deibson “Tatu” Cabral Nascimento, de 33, fugiram da Penitenciária Federal de Mossoró (RN). Desde então, seguem foragidos.
A força-tarefa para encontrar a dupla conta com cerca de 300 agentes federais e estaduais, helicópteros e drones. Apesar do esforço, apenas rastros e pegadas, roupas e restos de alimentos foram encontrados na zona rural.
Deibson “Tatu” Cabral foi sentenciado a 81 anos de prisão em 2015. Ele tem condenações por assaltos, furtos, roubos, homicídio e latrocínio. Apontado pela polícia como fundador do CV no Acre, “Tatu”, já participou de uma quadrilha que teria cometido 12 sequestros, incluindo um prefeito da Bolívia.
Rogério da Silva, por sua vez, foi condenado a 74 anos de prisão e responde por diversos processos judiciais, que envolvem roubos, associação a facção criminosa e assassinatos.
Investigação
O Ministério da Justiça e Segurança Pública destacou, em nota, que a empresa atendeu aos requisitos técnicos para assinatura do contrato.
Veja nota na íntegra:
“O MJSP informa que a empresa citada em reportagem atendeu todos os requisitos técnicos para a assinatura do contrato, realizada em abril de 2022, tendo apresentado todas as certidões de conformidade junto a órgãos públicos, como Receita Federal, Tribunal de Contas da União, Tribunal Superior do Trabalho, Ministério da Gestão, Inovação e Serviços Públicos, entre outros.
Sobre o serviço prestado, de acordo com nota técnica emitida pela fiscalização do contrato, a empresa vinha cumprindo todas as suas obrigações, obedecendo aos parâmetros pré-estabelecidos legalmente.
Ainda assim, o Ministério da Justiça e Segurança Pública irá acionar os órgãos competentes federais para que seja realizada rigorosa apuração referente à lisura da empresa citada”.
Versão da R7
Por nota, a R7 Facilities negou qualquer ato ilegal. A empresa afirmou que não atuou presta serviços de construção para o Presídio Federal de Mossoró, mas sim de manutenção. Atualmente, por exemplo, trabalha no reforço das luminárias das celas.
“Se houvesse suspeita, sequer estaríamos com essa atividade dentro das celas de segurança máxima”, afirmou a empresa. Segundo a R7, as acusações não procedem e os fatos foram distorcidos.
A empresa ressaltou que sempre se pautou pela ética, boa moral e probidade. A R7 destacou que não recebeu qualquer manifestação ou questionamento do presídio federal.
“Não recebemos qualquer apontamento, notificação, advertência ou questionamento por parte dos fiscais do contrato, tampouco do atual interventor naquela unidade prisional”, declarou a R7.
A empresa se colocou a disposição para colaborar com a Justiça para elucidar a situação.