Com reservatórios cheios, população cobra fim de racionamento
A expectativa é que o anúncio seja feito na semana que vem. Brasilienses contam os dias para que a estiagem das torneiras acabe logo
atualizado
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O percentual de domicílios com abastecimento diário de água no Distrito Federal caiu de 99,7% para 43,3% em 2017. O dado do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) reflete o impacto do racionamento no dia a dia dos brasilienses. Levando em consideração o número de consumidores locais, mais de meio milhão de imóveis deixaram de ter água disponível todos os dias. O índice de endereços que ficaram “na seca” entre quatro e seis vezes na semana passou de insignificante 0,2%, em 2016, para 54% no ano passado.
Com os níveis dos reservatórios bem acima do que no mesmo período de 2017, o DF entrou em contagem regressiva para o fim do rodízio, já que todas as metas estipuladas foram ultrapassadas com folga e não há mais justificativas para o governo manter o rodízio. A expectativa é que o anúncio seja feito na semana que vem.
Uma reunião está marcada, no Palácio do Buriti, após o feriado de 1º de maio para discutir o assunto
Quem também não vê a hora de encerrar o racionamento é a Companhia de Saneamento Ambiental do Distrito Federal (Caesb). A empresa afirma ter registrado queda de 34,8 milhões de metros cúbicos no consumo de água em 2016 e 2017, o que teria representado um impacto negativo de R$ 155,7 milhões em sua receita. Tanto que solicitou reajuste duplo na tarifa, de 0,51% e 9,96%, para entrar em vigor a partir de 1º de junho.
O primeiro seria referente ao ajuste anual já previsto. O segundo, extraordinário, seria destinado a recompor as perdas da empresa em função da diminuição de arrecadação por conta do racionamento. Além da queda da receita, a empresa teve aumento de gastos com o racionamento, uma vez que precisa fazer ajustes diários no sistema para desligar e religar os registros, o que mobiliza grande parte de sua mão de obra.
Queda no faturamento
O prejuízo para os empresários também é estratosférico. Segundo a Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio-DF), um dia de suspensão do abastecimento por semana representa 10% de queda no faturamento do setor.
O dano pode ser maior ainda, dependendo da atividade. Cerca de 11% dos salões de beleza do DF tiveram redução de 3% no faturamento, o equivalente a um prejuízo total de R$ 2 milhões desde que a rodízio foi adotado. Alguns precisam fechar as portas no dia em que a água não chega.
Um estudante do Centro de Ensino Unificado de Brasília (UniCeub) abordou o tema em seu Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). Marcos Vinícius de Oliveira Nunes, 23, que se formou em administração, justificou a opção. “Eu escolhi falar sobre o racionamento por uma situação que passei em uma padaria. Não puderam me servir um lanche, pois a água havia acabado. E optei pelos salões de beleza porque são comércios que dependem diretamente da água para funcionar”, contou.
Edson Barreto é um dos donos do Realeza, localizado no Núcleo Bandeirante. Ele diz que, mesmo com as dificuldades, estão conseguindo atender os clientes: “Tem que se virar nos 30. Nossa água vem da rua e, nos dias de racionamento, estamos fazendo uso de baldes, galões e comprando também para consumo”.
Já no Orange Beauty Studio, que fica na 205 Sul, foi feito um investimento de R$ 8 mil em caixas d’água e bombas de pressão. “Quando o racionamento cai aos sábados é complicado. O movimento nos finais de semana é maior. Nesse período, precisamos reduzir o atendimento em 10%, pois um dos nossos lavatórios é abastecido com a água que vem da rua”, relata Milena Infantini, responsável pelo salão.
Em outros setores, a expectativa também é pelo fim do racionamento. Como o presidente do Sindicato da Indústria de Lavanderia e Tinturaria do DF e dono da Lavanderia Água Azul, na Asa Norte, Cláudio Mendes. Para ele, não há mais necessidade de a população enfrentar o rodízio, pois os níveis dos sistemas que abastecem os brasilienses superaram as projeções da Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa).
Nas residências, a situação não é diferente. “O problema não é ficar um dia sem água. O que gera transtorno é que no fim das contas ficamos até três dias sem. Pois ela demora a voltar e é muito difícil não conseguir, sequer, tomar banho”, reclama a dona de casa Célia Alves, 42 anos, moradora de Vicente Pires.
Cautela
Na contramão de todo o movimento pelo fim das restrições, estão especialistas em recursos hídricos. Para eles, o momento ideal para se tomar a medida seria apenas no segundo semestre, após o período da estiagem.
“O racionamento tem que continuar. Não pode fazer a conta pelo volume que está agora. A conta é de quanto estará no final da seca, lá para novembro. Se a seca for acentuada e o consumo aumentar, como estará o Descoberto? Voltará a ficar com 5%?”, questiona Gustavo Souto Maior, especialista em Economia Ambiental e professor da Universidade de Brasília (UnB).