Mãe de menino morto no DF: “No lugar errado, na hora errada”
Emocionada, Joselina Tavares fala de Sharley e conta que doou as córneas dele. Garoto tinha apenas 14 anos e foi assassinado no Sol Nascente
atualizado
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A mãe de Sharley Ângelo Andrade Sirqueira, menino de 14 anos assassinado no Sol Nascente, em Ceilândia, na última sexta-feira (29/11/2019), ainda tenta digerir o que aconteceu. Ela não dorme nem se alimenta direito desde o dia do crime.
De acordo com os familiares, Sharley parou para conversar com um ex-cunhado, de 21 anos, no fim da tarde. Naquele momento, um homem se aproximou e começou a atirar. A 19ª Delegacia de Polícia investiga o caso.
A família não teve contato com o rapaz, que também levou os tiros – ele nega que tenha feito Sharley de escudo. “Sei que ele não atirou, mas meu filho estava no lugar errado, na hora errada. Não tenho sentimento de vingança e confio em Deus. Se a justiça da Terra falhar, sei que a celestial vai acontecer”, afirma Joselina Tavares Sirqueira, 40, mãe de Sharley.
A lembrança traz a tristeza, mas não foi o suficiente para Joselina deixar de lado a solidariedade. A mãe doou as córneas do filho, após a tragédia familiar. “Tinha uma pessoa precisando e ele sempre quis ajudar o próximo. Acho que ele ia gostar”, contou, com lágrimas nos olhos.
Joselina, que passou a última noite na cama do filho, conta que ele era inspiração. “O Sharley era um menino de ouro, maravilhoso. Eu não digo isso por que era meu filho, mas por que todos que o conheciam são prova disso. Ele abraçava todo mundo. Quando chegava em casa, dizia pra mim: ‘Fofa, cheguei’. Agora, cadê meu filho para me chamar de fofa”, desabafa.
Organizado
O quarto de Sharley tem várias medalhas. Segundo a família, ele gostava de esportes. Tem premiações de natação e adorava jogar futebol e queimada. Era tão ativo, que já sabia o que queria ser quando crescer: bombeiro.
A mãe conta que Sharley também era muito organizado e gostava da casa limpa. Ele cuidava de tudo e cozinhava para que, quando a mãe chegasse, tivesse comida pronta. O menino catava latinhas para ajudar a família.
“Sempre que ele queria ou precisava de algo, ia trabalhar para conseguir. Se não tinha refrigerante em casa, ele saía para separar o lixo em vários lugares, até que voltava com a bebida. E dividia com todo mundo”, conta a irmã mais velha de Sharley, Shayenne Andrade Sirqueira, de 16 anos.
Ela conta que o irmão adorava refrigerante e biscoito recheado. Também gostava muito de feijão e não comia carne. Só gostava da carne moída que a irmã preparava. “Ele era muito humilde, do bem. A saudade aperta porque um pedacinho da gente se foi. Parte o coração. E ele tinha um coração puro”, comenta Shayenne.
Estudioso
A mãe conta que o filho já estava aprovado na escola. “Um menino maravilhoso, estudioso, dedicado. Todo mundo da escola amava ele, fizeram várias homenagens pro Sharley”, disse Joselina.
A mãe do garoto assassinado foi à Escola Classe 40 nesta terça-feira (03/12/2019), onde foi recebida com muito carinho pelos colegas e professores que conviveram com Sharley antes de ele começar a estudar no CEF 19. Nessa última, também deixaram diversas cartinhas para a vítima.
“Ele queria ser o homem da casa. Trazia bolo e refrigerante. Todo mundo amava, não tinha nenhum defeito. A gente fica com um sentimento de revolta. Nós, que somos do bem, temos que nos esconder. O coqueiro (próximo de onde Sharley foi assassinado) está cheio de bala até agora. Não consegui ir lá ainda. Queremos justiça”, lamentou Joselina.
Querido
A família tem recebido ajuda de pessoas que gostavam da criança. “O motorista do ônibus que ele costumava pegar pra ir à escola passou aqui e deixou um dinheiro. Ele gostava muito do menino e sentiu falta”, lembrou a mãe.
Joselina lembra que esse carinho que muitos sentiam por Sharley ajudou a família financeiramente em um momento tão triste. Amigos, professores, parentes e vizinhos ajudaram para dar ao menino um enterro digno. A despedida aconteceu no domingo (01/12/2019), no Cemitério de Taguatinga.
Esse apoio segue inspirando a mãe do garoto. No lote em que Sharley morava, há diversas famílias e cerca de 12 crianças, com quem o menino brincava muito. Dona Joselina diz que seria legal fazer uma campanha de Natal. “O legado dele é de ensinamento, humildade e compartilhar com o próximo. Ele é um anjo e sentimos falta dos abraços fortes dele.”