Primeiro caso de feminicídio em Ceilândia será julgado nesta quarta
O réu, Jailson Guedes Ferreira, matou a companheira em abril de 2015 e agora vai a júri popular
atualizado
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Um dos primeiros casos de feminicídio registrados no Distrito Federal será decidido nesta quarta-feira (29/3). A partir das 9h30, Jailson Guedes Ferreira será julgado no Tribunal do Júri de Ceilândia por homicídio qualificado pelo crime de feminicídio, motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima. Há quase dois anos, ele aguarda o julgamento detido.
Um júri popular composto por sete pessoas vai ajudar a decidir qual será a pena do réu. Se condenado por feminicídio, ele pode pegar de 12 a 30 anos de prisão. Por ser crime hediondo, o condenado deve cumprir metade da pena detido, para só então solicitar progressão de regime.
Em 15 de abril de 2015, por volta das 12h40, a policial militar reformada Neide Rodrigues Ribeiro, então com 49 anos, foi assassinada com um tiro de uma pistola calibre 380 dentro de casa, na QNN 24, na região da Guariroba, em Ceilândia.Logo após matar a companheira com a qual dividiu a vida por 20 anos e tentar suicídio, o também policial militar reformado Jailson, na época com 50 anos, disse aos policiais da 23ª DP que atirou porque Neide o provocou dizendo que ele “não era homem”.
Feminicídio
O caso é o primeiro feminicídio registrado em Ceilândia e um dos primeiros no DF. Na época do assassinato, a tipificação tinha sido incluída no Código Penal (Lei 13.104/2015) há apenas seis dias. Esse tipo de crime é praticado contra vítimas em razão de serem do sexo feminino, em contexto de violência doméstica familiar ou quando há menosprezo ou discriminação.
O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) é o autor da denúncia contra Jailson (acesse aqui o processo). O inquérito policial que acompanha a denúncia diz que Neide era vítima de violência doméstica e tentava se separar de Jailson, mas o marido não se conformava.
O denunciado, tomado por sentimento egoístico de posse, efetuou disparos de arma de fogo contra a companheira. O crime foi praticado contra mulher por razões da condição de sexo feminino, em contexto de violência doméstica e familiar (feminicídio)
Denúncia apresentada pelo MPDFT ao TJDFT
A delegada-chefe da Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam), Ana Cristina Melo Santiago, diz que as mortes de mulheres vítimas de feminicídio são cruéis. “Enquanto os homens são mortos em espaços públicos, vítimas de armas de fogo, as mulheres estão sendo mortas dentro de suas casas, mediante tortura, golpes de faca… Há todo um sofrimento adicional para elas”, considera.
Histórico violento
Na época do assassinato, a família de Neide acusou Jailson de fazer abuso de álcool e drogas. O PM reformado também estava com o porte de armas suspenso por apresentar problemas emocionais.
Uma prova do descontrole de Jailson teria acontecido cinco anos antes da morte de Neide, em 1º de outubro de 2009. Na ocasião, o policial reagiu a um assalto na QNM 5, em Ceilândia, e foi baleado nas costas, além de levar um tiro de raspão na cabeça.
Julgamento
O promotor de justiça do Tribunal do Júri de Ceilândia, João Antônio de Sá Lima, adianta que o Ministério Público defenderá a condenação do réu por homicídio triplamente qualificado e pelo crime de porte ilegal de arma de fogo.
“O contexto de violência doméstica e familiar é comprovado por evidências que, mesmo antes do crime, a mulher já era submetida à situação de violência física, psicológica, moral e/ou econômica”, explicou o promotor.
A defesa, representada pelos advogados Mário Batista, Alex de Oliveira e César Augusto Pimentel, assume que será difícil livrar Jailson da acusação de feminicídio, mas poderá recorrer em segunda instância.
Vamos tentar desqualificá-lo dos outros crimes [motivo torpe e uso de recurso que dificultou a defesa da vítima]. Hoje em dia tudo é feminicídio. Isso é, de certa forma, uma discriminação com o homem que está em situação de desigualdade nessa lei
Alex de Oliveira, advogado de Jailson
Pensão
Após a morte de Neide, Jailson entrou com o pedido de inventário e partilha de bens no valor de R$ 100 mil na 1ª Vara de Família de Ceilândia. Somente em 3 de junho do ano passado, o juiz responsável pelo trâmite incluiu detalhes sobre o crime no processo.
O MPDFT entrou com um pedido de antecipação de tutela na 1ª Vara Cível de Ceilândia para barrar o pagamento de pensão por morte a Jailson. Enquanto ele não é condenado, ele pode receber o benefício. A última decisão foi tomada na sexta-feira passada (24), quando o juiz solicitou a suspensão do pagamento. O processo aguarda manifestação do Ministério Público.
Primeira condenação
A primeira condenação de feminicídio no DF foi no Riacho Fundo, em 10 de dezembro de 2015. João Paulo Miranda pegou 34 anos de reclusão por homicídio triplamente qualificado. Ele matou a companheira, Maria de Fátima Cardoso dos Santos, e o vizinho, Gilvane Bezerra Marinho, cinco meses antes de ser condenado. Ele também foi julgado por motivo fútil e uso de recurso que dificultou a defesa da vítima.
Repercussão
Outro caso que comoveu os brasilienses foi o assassinato da estudante da Universidade de Brasília (UnB) Louise Ribeiro. Ela foi morta aos 20 anos, por asfixia, no laboratório de biologia da UnB. O crime ocorreu em 10 de março do ano passado. A jovem foi atacada por Vinícius Neres Ribeiro, assassino confesso, após rejeitar reatar o relacionamento.
Vinícius será julgado por júri popular em 3 de abril. Ele vai responder por homicídio quadruplamente qualificado, por motivo fútil, meio cruel, recurso que dificultou a defesa da vítima e feminicídio; além de ocultação de cadáver.