Ela tem todos os requisitos para adotar. Mas, solteira, não consegue
Rosineide Lima é servidora pública e já acumula quase 1.800 dias de ansiedade para se tornar mãe. No DF, há 117 crianças à espera de um lar
atualizado
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Pais biológicos esperam nove meses, ou cerca de 270 dias, para concretizarem o desejo de ter um filho. Para aqueles que almejam adotar uma criança, no entanto, não há limite de prazo até a conclusão do processo. A economista Rosineide Simões Lima, 52 anos, é um exemplo dessa realidade. Ela acumula quase 1,8 mil dias de ansiedade devido à vontade de se tornar mãe. Entrou com o pedido de adoção em 2013, foi habilitada pela Justiça em 2014, mas, até hoje, não formou sua família como sonha.
“Eu iniciei [o processo] cheia de esperanças e sonhos. O curso foi muito bacana para desmistificar algumas questões que envolvem a adoção. Após a visita e a conclusão da habilitação, a minha expectativa foi a mil”, conta Rosineide. Nas aulas preparatórias, ela conheceu um casal, que só foi habilitado depois dela, mas já conseguiu adotar.A luta para adotar uma criança começou quando decidiu entrar com o pedido na Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal. Segundo ela, o processo foi rápido: entregou os papéis, fez um curso, recebeu visitas de assistentes sociais e foi, finalmente, habilitada para o acolhimento do novo integrante da família.
Confira o relato da economista:
Mesmo preenchendo todos os requisitos para adoção – como estabilidade financeira e emocional, residência fixa e um perfil adotante flexível –, a servidora pública ainda não atingiu seu objetivo. “Apesar de não poder confirmar que o motivo seja esse”, ela acredita que o fato de ser solteira tem influenciado na demora da chegada de seu filho (ou sua filha).
Para tentar facilitar o processo, Rosineide abriu mão, inclusive, de adotar um bebê – quer uma criança de até 5 anos. “O sexo é irrelevante, assim como a cor da pele. A única restrição é quanto à saúde do meu primeiro filho”, ressalta.
Álbum da criança
Enquanto aguarda na fila da adoção, Rosineide tem se preparado como futura mamãe. A servidora pública fez um álbum de fotografias da família. A coleção mostra como a criança é esperada e, o mais interessante, tem páginas em branco, ainda sem fotos, para serem preenchidas com os momentos vividos ao lado do filho.
O outro lado
De acordo com a Vara da Infância e da Juventude do Distrito Federal, o número de adoções bateu recorde em 2017, com 88 crianças sendo acolhidas por novas famílias: seis dos processos foram internacionais, e o restante ocorreu no Brasil. Entretanto, o órgão não sabe informar quantos dos novos pais e mães – tanto os já contemplados quanto aqueles ainda na fila de espera – são solteiros.
O supervisor da Seção de Adoção da Vara, Walter Gomes, explica que o estado civil não é fator determinante no processo. Segundo ele, o grande desafio é flexibilizar as características estabelecidas pelas famílias.
A fila de adoção tem pouca mobilidade em razão do perfil pretendido ser diferente ao das crianças que estão nos abrigos. De todas as 524 famílias que temos habilitadas no DF, por exemplo, nenhuma deseja adotar um adolescente. Isso dificulta
Walter Gomes, supervisor da Seção de Adoção da Vara da Infância e da Juventude do DF
Até janeiro, havia 117 meninos e meninas aguardando acolhimento. De acordo com Gomes, se uma família se propuser a adotar uma criança de 5 a 10 anos, será imediatamente chamada. “A adoção tardia sempre foi vista como uma modalidade cheia de desafios. De fato, exige mais tolerância e mais capacidade de diálogo para enfrentar as crises de adaptação. Por isso, algumas famílias não estão dispostas a enfrentar essas ‘dificuldades’ e acabam esperando mais tempo”, explica.
Confrontado sobre o caso de Rosineide Simões Lima, o supervisor disse que é normal um perfil como o dela esperar entre 5 e 7 anos até a conclusão do processo de adoção. “Essa é a média para esse tipo de perfil. Isso [a espera] é comum. O fator saúde e idade são determinantes no tempo na fila de adoção. Temos casos em que o período é curtíssimo, porque a família aceita uma criança com microcefalia, por exemplo”, esclarece.
Segundo Gomes, a Justiça não avalia nem se baseia no estado civil, na orientação sexual ou na opção religiosa dos adotantes. “Buscamos pessoas que queiram dar afeto às crianças que estão disponíveis. Os adotados não podem mudar o que são, mas os perfis desejados pelas futuras famílias podem”, pondera.