Justiça condena DF a indenizar preso que ficou cego após tiro de bala de borracha
Caso ocorreu em 2019. Juiz decidiu que vítima deveria receber R$ 35 mil por danos morais e pensão vitalícia de um terço do salário mínimo
atualizado
Compartilhar notícia
O Distrito Federal foi condenado a indenizar um preso que perdeu a visão do olho direito após ser atingido por uma bala de borracha no Centro de Detenção Provisória. A decisão é do juiz da 1ª Vara da Fazenda Pública do DF e ainda cabe recurso da sentença.
Conforme informou o autor da ação, ele cumpria prisão provisória e, em agosto de 2019, estava no pátio tomando banho de sol, quando dois internos iniciaram uma briga. Os policiais penais entraram no local e efetuaram disparos com balas de borracha.
Um dos tiros atingiu o olho direito dele, o que provocou lesão que acarretou na cegueira de um dos olhos. Ele conta ainda ter sido levado ao hospital apenas cinco dias após o incidente e que precisou passar por procedimento cirúrgico.
No processo, o ex-detento sustenta ter sido lesionado de forma injusta e pede para que o DF seja condenado a indenizá-lo por danos morais e ao pagamento de pensão mensal vitalícia.
Ao apresentar defesa, o DF argumentou não ser possível comprovar que a ação provocou a lesão no olho do autor e que a responsabilidade somente pode ser imputada se for demonstrado o nexo causal. O réu disse ainda que não houve omissão no socorro, uma vez que prestou o atendimento médico necessário.
O juiz que analisou o caso destacou, no entanto, que está “devidamente configurada e provada a responsabilidade civil objetiva do ente público, ante a conduta comissiva dos agentes, o dano causado ao autor, e o nexo de causalidade existente entre um e outro”.
No caso, de acordo com o magistrado, o autor faz jus à reparação por danos morais, uma vez que houve violação ao direito de personalidade. “O caso presente se trata de dano moral puro, que prescinde de qualquer prova a respeito, uma vez que é presumível a profunda amargura do indivíduo quanto à perda de sua visão”.
O pedido de pagamento de pensão mensal vitalícia foi acatado parcialmente. O ex-preso pedia dois salários mínimos, mas a decisão entendeu que um terço seria o suficiente.
Caso parecido ocorreu na Papuda
Pelo menos dois internos do Complexo Penitenciário da Papuda teriam ficado cegos após ação da polícia penal dentro do presídio, em maio de 2020. Durante tentativa dos agentes de conter uma briga no pátio da cadeia, detentos receberam tiros de borracha a um metro de distância, conforme laudo ao qual o Metrópoles teve acesso, e perderam completamente os globos oculares. Também tiveram ferimentos pelo corpo.
Durante a ação policial penal, Elvis Gabriel, 27 anos, e Elcimar Júnior Alvez Evangelista tiveram os corpos, olhos e cabeças atingidos por balas de borrachas disparadas pelos agentes que tentavam conter a briga no pátio do presídio.
Documentos do Hospital de Base e de clínicas de olhos apontam que os médicos responsáveis pelo atendimento dos detentos só puderam, em cirurgia, retirar “os restos” dos olhos dos pacientes.
Desde então, as famílias tentam levar remédios para os internos, pedir uma apuração rigorosa dos fatos e que os culpados pelo que consideram “atrocidade” sejam punidos, mas dizem não receber respostas.
Veja:
Além disso, a órbita foi fraturada e a visão do olho esquerdo, completamente perdida. Pouco despois da cirurgia, o olho de Elvis começou a expulsar uma secreção purulenta, de acordo com relatório médico do Hospital de Base do DF, onde o interno recebeu atendimento.
Há receituário médico para aplicação de colírio no olho esquerdo do paciente, mas a família diz não conseguir entregar o remédio ao jovem. O pai de Elvis chegou a escrever uma carta a entidades de direitos humanos, relatando seu desespero.
“A enfermeira Angra pediu o colírio Moura Brasil, mas não consegui entregar. Como ele pode ser tratado se não tem colírio lá dentro? Não conseguimos nem videoconferência com ele”, diz o pai, em trecho da carta.
Leia:
Na mesma ação, Elcimar Júnior também perdeu um olho.
Na época, sobre esse caso, o MPDFT informou: “Há um procedimento que tramita no Núcleo de Controle e Fiscalização do Sistema Prisional (Nupri/MPDFT) sobre esse caso. Como o feito é sigiloso, não podemos passar detalhes. Os internos já foram ouvidos mais de uma vez pelos promotores, além de outras testemunhas”.
A Secretaria de Administração Penitenciária do Distrito Federal (Seape-DF) informa que um Procedimento Investigatório Preliminar (PIP) foi aberto para apurar todas as circunstâncias do ocorrido.