Jardineiros proibidos em cemitérios: saiba o que alegam as partes
Campo da Esperança acusa autônomos por falhas em serviços, enquanto clientes contratam jardineiros pela falta de manutenção em túmulos
atualizado
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Na batalha pelos trabalhos nos cemitérios do Distrito Federal, de um lado, a Campo da Esperança Serviços Ltda. acusa jardineiros autônomos que atuam nesses locais por supostas falhas na prestação dos serviços, intimidações de frequentadores e furtos em jazigos; de outro, famílias que perderam entes queridos reclamam da manutenção prestada por funcionários da concessionária, apesar de estarem em dia com os pagamentos das tarifas pelos cuidados com os túmulos.
Nesta segunda-feira (11/11), o Metrópoles jogou luz à guerra judicial entre 365 jardineiros e a Campo da Esperança Ltda., responsável pela administração dos seis cemitérios existentes no Distrito Federal. Mesmo com uma decisão que barra o trabalho de autônomos nas áreas sob gestão da empresa, os trabalhadores continuam a atender famílias que os contrataram por fora.
A Campo da Esperança alega que havia proposto um acordo aos jardineiros autônomos, na tentativa de disciplinar o trabalho deles, cadastrá-los, treiná-los, padronizar os serviços e oferecer uniformes. Porém, a categoria não teria aceitado as medidas e, segundo a empresa, “além de não aceitarem acordo”, estariam atrapalhando os serviços de manutenção “de forma proposital”.
“Como não são fiscalizados e não têm obrigações com o Estado, esse grupo produz entulho e o deixa espalhado pelos campos, quebra tampas de jazigos de clientes com pagamentos atrasados, aborda visitantes de maneira inapropriada, oferece produtos fora dos padrões estabelecidos por lei, entre outras irregularidades”, acusou a empresa.
Argumentos à Justiça
Em julho deste ano, a 1ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) decidiu que profissionais autônomos não podem fazer serviços de jardinagem nos cemitérios.
O processo que levou à determinação foi protocolado pela Organização Social de Jardineiros de Cemitérios do Distrito Federal (Osjacem, antiga Ajacem), sob alegação de que funcionários da Campo da Esperança estariam ameaçando jardineiros autônomos e tentado impedi-los de entrar nesses espaços para trabalhar.
Contudo, a Justiça considerou que os autônomos ferem as regras da concessão pública ao trabalharem nos cemitérios sem autorização. A Osjacem recorreu, com base na Lei Distrital nº 1.349/1996. O artigo 1º afirma: “Fica assegurado aos profissionais vinculados à Associação dos Jardineiros dos Cemitérios do Distrito Federal (Ajacem) e aos familiares do falecido o livre acesso aos cemitérios públicos, bem como à infraestrutura existente, com o objetivo de executarem serviços de limpeza e manutenção dos túmulos”.
No entanto, em 17 de outubro último, o desembargador Waldir Leôncio Júnior, presidente do TJDFT, indeferiu o recurso extraordinário apresentado. Ainda assim, a batalha continuará, promete a Osjacem.
Enquanto os jardineiros se basearam naquela legislação, a Campo da Esperança usou a Lei Distrital nº 2.424/1999, que regulamenta os serviços cemiteriais no DF, como argumento para se posicionar durante a tramitação do processo. Quanto ao efetivo responsável pela manutenção dos jazigos, a empresa diz que “dispõe de 84 funcionários responsáveis pela limpeza, conservação e manutenção das áreas coletivas e das sepulturas”.
“A manutenção individual dos jazigos é feita mediante contrato dos proprietários de cada unidade. A contratação é opcional (R$ 85,52 por mês ou R$ 918,75 por ano), e apenas 20% dos jazigos têm contrato vigente no momento. A contratação vale por prazo indeterminado, podendo ser cancelada a qualquer momento pelo usuário. Caso a família não queira contratar o serviço oferecido pela empresa concessionária, ela precisa se responsabilizar pela manutenção do local”, destacou a empresa.
Concessão dos cemitérios públicos
Desde 2002, a Campo da Esperança Serviços administra dos seguintes cemitérios do DF: Asa Sul, Brazlândia, Gama, Planaltina, Sobradinho e Taguatinga. Muito antes, porém, os jardineiros autônomos cuidavam dos túmulos. De acordo com a Osjacem, os profissionais atuam no ramo desde 1985.
Quem não tinha condições de visitar e cuidar do túmulo da pessoa falecida com frequência, ou até quem não conseguisse ou quisesse fazer esse trabalho, buscava um jardineiro autônomo para cuidar do jazigo. O acordo era informal, direto entre familiar e profissional, moldado pelos próprios envolvidos, na forma que melhor atendesse as partes.
Como a Campo da Esperança Serviços fechou contrato com o Governo do Distrito Federal (GDF) para cuidar dos cemitérios da capital do país, entendia-se que, a partir dali, a empresa cuidaria da manutenção dos túmulos. Iniciou-se, então, uma negociação entre a concessionária e os autônomos, para que se chegasse a um consenso. Vinte e dois anos depois, as partes não chegaram ao denominador comum.
Atualmente, quem paga por um túmulo tem a opção de contratar, junto à Campo da Esperança, o serviço de manutenção de jazigo. A empresa oferece dois pacotes: um mensal, de R$ 85,52, e um anual, de R$ 918,75, com 10% de desconto em relação ao primeiro. O pagamento não é obrigatório, porque o cliente também pode, por conta própria, cuidar do espaço da forma que preferir.
Enquanto isso, jardineiros autônomos cobram entre R$ 70 e R$ 80 para aparar e regar a grama, plantar e cultivar flores e fazer reparos de outros tipos. Cada profissional tem autonomia para cobrar quanto preferir e negociar diretamente com o contratante. Alguns deles também fazem manutenção na estrutura do túmulo, por valor combinado junto ao cliente.
Se findarem os recursos e a Justiça decidir que os jardineiros autônomos não poderão mesmo continuar trabalhando nos cemitérios, a maioria ficará sem renda, segundo o presidente da Osjacem, Agnaldo Monteiro.
“Se formos impedidos, estaremos todos na rua. Esse trabalho é nossa principal fonte de renda. A maioria de nós trabalha apenas nos cemitérios, diariamente”, relatou Agnaldo, que calcula salários de R$ 3,5 mil e R$ 6 mil por mês para os autônomos.
O presidente acrescentou que a manutenção ofertada pela Campo da Esperança é “precária e insatisfatória” e que a empresa dispõe de poucos funcionários. “As pessoas nos contratam pela insatisfação do serviço precário da concessionária. Eles têm cerca de 20 jardineiros para os seis cemitérios do DF”, destacou o representante da Osjacem.
Agnaldo também lembrou que os jardineiros autônomos amparados pela Osjacem se dividem entre cinco dos seis cemitérios da capital do país. “Somos, em média, 200 funcionários na Asa Sul; 40 em Taguatinga; 40 no Gama; 20 em Planaltina e 20 em Sobradinho”, completou.