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Investigado por mortes em clínica irregular transferiu pacientes para centro clandestino da mãe

A reportagem do Metrópoles ouviu familiares de algumas vítimas que presenciaram maus-tratos dentro do centro terapêutico

atualizado

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Material cedido ao Metrópoles
Centro Terapêutico El Shaddai
1 de 1 Centro Terapêutico El Shaddai - Foto: Material cedido ao Metrópoles

Após a interdição da Clínica de Reabilitação Restituindo Vidas na última terça-feira, em Luziânia, Entorno do DF, pacientes que estavam no local acabaram transferidos para outras comunidades terapêuticas. Alguns dos internos foram alocados no Centro Terapêutico El Shaddai, que fica no mesmo município e pertence à mãe de Tiago de Morais Araújo, dono do espaço denunciado e fechado por maus-tratos e mortes.

O Metrópoles ouviu familiares de algumas vítimas que presenciaram agressões dentro do centro coordenado por Geralda Bezerra de Morais. De acordo com eles, o cenário é semelhante ao que foi visto na clínica clandestina mantida pelo filho da mulher.

A reportagem confirmou que são realizadas internações compulsórias no espaço, mesmo a prática não sendo permitida em centros terapêuticos. A mensalidade varia entre R$ 1.100 e R$ 1.500. Na teoria, é oferecido atendimento aos pacientes com psiquiatras, psicólogos e terapeutas.

Segundo um dos familiares, a maioria dos termos que estão no contrato não é cumprida. “A estrutura do lugar até que é tranquila. Mas mesmo assim ainda tem outros problemas. A alimentação, por exemplo, é muito precária, e não condiz com o valor de R$ 1.300 que pagamos de mensalidade”, contou o parente de um dos pacientes, que pediu para não ser identificado.

Em diversas ocasiões, ainda de acordo com as denúncias, o centro terapêutico oferece, aos pacientes, salsicha como almoço.

O espaço também não conta com o suporte de profissionais de saúde, como psiquiatras, enfermeiros e terapeutas, para dar tratamento e auxílio adequados aos internos.  

“Como lá não tem nenhum profissional da área, um interno cuida do outro. Sendo que eles não têm preparo para isso. Não faz sentido uma pessoa ser auxiliada por alguém que está lá tratando o mesmo problema que ela”, pontuou o familiar. 

“Os internos que estão lá há mais tempo podem virar monitores, mas muitos deles agridem os outros pacientes, porque têm certa autoridade”, revelou. 

A rotina no local também é regada a agressões. De acordo com as denúncias, muitos pacientes são violentados caso se comportem mal ou reclamem de algo em relação ao centro terapêutico.

Quem está internado lá não tem voz, afirmam as vítimas. “Nós já vimos a dona da clínica ameaçar um interno, porque ele fez algumas reclamações. Ela disse que tinha ligação com a polícia e que eles poderiam espancar e ‘sumir’ com o paciente”, relatou a pessoa que não quis ser identificada.

Um dos familiares ouvidos ainda acrescentou que o principal intuito da denúncia é, justamente, tentar ajudar as pessoas que estão sofrendo no local. 

Clínica interditada

A Superintendência de Vigilância em Saúde de Goiás (Suvisa) interditou, na noite de terça-feira (2/5), a Clínica de Reabilitação Restituindo Vidas, situada na região das Chácaras Marajoara, em Luziânia, no Entorno do DF. A fiscalização ocorreu após o Metrópoles procurar os órgãos durante apuração sobre as situações de maus-tratos e tortura a que eram submetidas as vítimas no estabelecimento clandestino.

Vídeos chocantes gravados no local mostram os pacientes nus, sendo obrigados a entrar na água de madrugada, dormir no chão em meio à sujeira e ficar amarrados em posição semelhante àquela em que escravos eram punidos no Brasil há mais de 130 anos.

Veja abaixo alguns vídeos das humilhações:

 

Na clínica, dependentes químicos eram submetidos, diariamente, a humilhações e sessões de tortura que já resultaram até em morte.

De acordo com a Suvisa, cerca de 54 residentes estavam internados no estabelecimento no momento em que ocorreu a interdição e autuação do espaço.

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Uma das vítimas de tortura
Vítima dormindo no chão de clínica clandestina
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Paciente amarrado em clínica clandestina

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Uma das vítimas de tortura

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Vítima dormindo no chão de clínica clandestina

Material cedido ao Metrópoles

Algumas das irregularidades encontradas no local foram falta de documentação para funcionamento da clínica, superlotação, ausência de responsável técnico, condições precárias de higiene e má alimentação dos residentes.

Com a interdição do espaço, a equipe responsável pela reabilitação tem o prazo de três dias para comunicar os familiares dos pacientes sobre a situação deles e realocá-los em outras clínicas de internação.

Antes de abrigar a Clínica de Reabilitação Restituindo Vidas, o local foi sede da Comunidade Terapêutica Restauração (CTR), que também foi fechada por suspeita de maus-tratos a pacientes. O espaço mudou apenas de nome, mas manteve a rotina adotada.

Segundo a Federação Nacional de Comunidades Terapêuticas (Fenact), o estabelecimento, que funcionava de forma clandestina, é administrado por Tiago de Morais Araújo, que se apresenta como enfermeiro.

Para driblar a Justiça, o suposto enfermeiro abriu um Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica (CNPJ) identificando a empresa como uma comunidade terapêutica, mas, na verdade, oferecia serviço de clínica psiquiátrica com internações compulsórias.

Fome, dopagem e mortes

A rotina dentro da casa era de dor e sofrimento. A lista de supostos crimes cometidos por Tiago e seus funcionários é extensa. Ele é acusado de bater, humilhar e permitir circulação de drogas no local.

Ainda de acordo com relatos de “sobreviventes”, não era permitido manter qualquer tipo de contato com a família, e havia a prática de dopagem com medicamentos sem prescrição médica. Em casos mais extremos, muitos, inclusive, disseram passar fome, pois as refeições eram rigidamente controladas por Tiago e seus monitores.

No caso mais aterrorizante, um interno morreu, em março deste ano, após ser obrigado a ingerir doses cavalares de medicamentos controlados.

Cerca de um mês depois, em 24 de abril, outro paciente apareceu morto na Clínica de Reabilitação Restituindo Vidas. Carlos Eduardo Rodrigues, 44 anos, não passou sequer 24 horas sob os cuidados de Tiago. O homem foi internado na tarde do dia 24 de abril pela mãe e, durante a noite, faleceu. O óbito dele é investigado pela PCGO, por meio Grupo de Investigação de Homicídios (GIH) de Luziânia.

Falta de estrutura e superlotação

O espaço disponibilizado aos internos não era apropriado para a quantidade de pessoas que atendia. A casa, com três quartos, alojava cerca de 54 homens. Por falta de estrutura, alguns dormiam no chão. Além disso, a residência tem apenas um banheiro, sem descarga, o que torna a higiene precária.

O local também não contava com a presença de psiquiatras ou enfermeiros para oferecer tratamento e suporte devidos.

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