metropoles.com

IML não vai mais liberar corpos de quem morreu de causas naturais

Decisão causará transtornos com acúmulo de cadáveres, uma vez que 40% dos óbitos analisados pelo instituto não têm relação com violência

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
RAFAELA FELICCIANO/METRÓPOLES
Máfia-fune1
1 de 1 Máfia-fune1 - Foto: RAFAELA FELICCIANO/METRÓPOLES

A partir desta semana, o Instituto Médico Legal (IML) deixará de manipular e liberar cadáveres de pessoas que morreram de causas naturais. A função, por lei, deveria ser exclusiva do Serviço de Verificação de Óbitos (SVO), da Secretaria de Saúde, mas, sucateado, opera de forma precária no DF.

Com a nova determinação, o prenúncio é de caos, pois cerca de 40% dos falecimentos analisados pelos funcionários públicos do instituto não têm relação com violência.

No último dia 20, a Associação dos Técnicos em Necropsia do IML (Asten) e o Sindicato dos Servidores Públicos Civis da Administração Direta, Autarquias, Fundações e Tribunal de Contas do DF (Sindireta) encaminharam a diversos órgãos da capital, ao Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) e ao Ministério da Saúde o Ofício nº 72, de 2017.

O documento denuncia que trabalhadores do IML estariam atuando como assistentes de médicos-patologistas, quando, por força da Lei nº 2.758, de 2001, só poderiam auxiliar peritos e médicos-legistas.

O comunicado ainda cita a resposta do Governo do DF ao Metrópoles, que, em reportagem publicada no dia 5 de novembro deste ano, garantiu o funcionamento pleno do SVO no Hospital Regional da Ceilândia (HRC).

“Os agentes de atividades complementares de segurança decidem que, no prazo de 15 dias úteis — vence em 4 de dezembro — , interromperão as atividades de auxílio a médicos-patologistas nos exames de corpos de responsabilidade do SVO, considerando que não é atribuição desses servidores e que o serviço dispõe de pessoal para o desempenho dessas funções, conforme afirmou a Secretaria de Saúde em entrevista a um veículo (Metrópoles) de alcance nacional”.

A referida matéria revelou que o MPDFT investiga o paradeiro de R$ 646 mil que deveriam ser aplicados na modernização do SVO no DF. O recurso começou a ser repassado pela União à Secretaria de Saúde em 2009 e seria para financiar montagens de estrutura e equipe. No entanto, o dinheiro foi desviado e aplicado em outros setores da Pasta.

Subnotificações
Na ocasião, a Pasta alegou que havia feito 825 laudos de SVO entre 2016 e 2017. O presidente da Asten, José Romildo Soares, rebate. Segundo ele, desse total informado, um número ínfimo de cadáveres, de fato, passou por necropsia, exame fundamental para descobrir com precisão a causa da morte. Sem ele, óbitos provocados por doenças como hantavirose e dengue, por exemplo, podem ficar subnotificados.

As estatísticas oficiais de doenças podem estar erradas, pois praticamente não há abertura de cadáveres de mortes naturais. O patologista, na maioria das vezes, emite laudo baseado apenas em conversas com parentes ou em exame superficial.

José Romildo Soares, presidente da Asten

Ultimamente, o SVO que funciona no HRC só recebe corpos de pessoas que faleceram em hospitais. Óbitos registrados na rua ou em residências são todos levados ao IML. Além de o serviço de verificação no DF não ter estrutura própria suficiente para atender toda a demanda, não funciona 24 horas por dia, como determina a Portaria nº 1.405, do Ministério da Saúde.

O Metrópoles teve acesso à escala do mês de abril dos patologistas. São apenas dois profissionais que aparecem, somente duas vezes por dia: às 11h e às 17h, para assinar atestados de óbito no IML. Veja:

 

Sobrecarga nas delegacias
A ausência de um SVO eficiente também faz com que uma pilha de inquéritos policiais inúteis se acumulem nas delegacias. Como o IML é responsável por analisar mortes violentas, torna-se necessária a abertura de um boletim de ocorrência toda vez que um cadáver fica sob a responsabilidade da unidade. Ou seja, mesmo em casos de pessoas que padeceram de mal súbito, um agente de polícia é obrigado a ir até o local da morte.

A reportagem teve acesso ao livro do IML onde são computados todos os óbitos. De 1º janeiro a 1º de novembro de 2017, o instituto recolheu 1.072 corpos de pessoas que morreram sem violência. Em todas, um registro policial teve de ser aberto.

Mercado clandestino da morte
A ausência do SVO na capital do país serviu de combustível para a atuação da Máfia das Funerárias, que ocupava justamente o espaço que deveria ser preenchido por ele.

Os papa-defuntos da organização criminosa chegavam primeiro aos locais onde as mortes ocorriam e cobravam dos familiares do falecido valores inflacionados. Até mesmo atestados de óbitos — documento público e gratuito — eram vendidos pela quadrilha.

Em nota, a Polícia Civil do DF — órgão hierarquicamente superior ao IML — diz que tem buscado diálogo para evitar transtornos à população. “A PCDF está ciente da manifestação dos técnicos de necropsia do IML e das tratativas com a Secretaria de Saúde, bem como com a Secretaria de Segurança para que o Serviço de Verificação de Óbito seja realizado dentro da mútua cooperação entre os órgãos, a fim de garantir que não haja qualquer prejuízo ao bom andamento dos exames”.

A reportagem encaminhou demanda para a Secretaria de Saúde na quinta-feira (23/11), mas a Pasta não havia respondido aos questionamentos até a última atualização desta matéria.

 

7 imagens
Funerária Pioneira, que funcionava em Taguatinga, foi outro alvo da PCDF
Donos de funerárias são acusados de integrar esquema criminoso no DF
Entrada de funerária suspeita de integrar Máfia das Funerárias
Funerária Tanatos foi investigada por integrar mercado da morte no DF
Policiais apreenderam documentos e computadores    em uma das funerárias investigadas
1 de 7

Funerária Universal foi alvo da Operação Caronte

Michael Melo/Metrópoles
2 de 7

Funerária Pioneira, que funcionava em Taguatinga, foi outro alvo da PCDF

Michael Melo/Metrópoles
3 de 7

Donos de funerárias são acusados de integrar esquema criminoso no DF

Michael Melo/Metrópoles
4 de 7

Entrada de funerária suspeita de integrar Máfia das Funerárias

Michael Melo/Metrópoles
5 de 7

Funerária Tanatos foi investigada por integrar mercado da morte no DF

Michael Melo/Metrópoles
6 de 7

Policiais apreenderam documentos e computadores em uma das funerárias investigadas

RAFAELA FELICCIANO/METRÓPOLES
7 de 7

Batida policial em uma das funerárias investigadas

RAFAELA FELICCIANO/METRÓPOLES

Compartilhar notícia

Quais assuntos você deseja receber?

sino

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

sino

Mais opções no Google Chrome

2.

sino

Configurações

3.

Configurações do site

4.

sino

Notificações

5.

sino

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comDistrito Federal

Você quer ficar por dentro das notícias do Distrito Federal e receber notificações em tempo real?