Ibama admite ao MPF que Centro de Triagem de Animais do DF é “precário e insalubre”
MPF havia pedido explicações após receber denúncias de maus-tratos a animais no local. Instituto admitiu certos problemas, mas fez ressalvas
atualizado
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O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) admitiu ao Ministério Público Federal (MPF) que a situação no Centro de Triagem de Animais Silvestres do Distrito Federal (Cetas-DF) é insalubre e precária. Ao justificar os problemas, porém, o órgão fez uma série de ressalvas, dizendo que a unidade “historicamente funciona com dificuldade de lotação de servidores analistas ambientais”.
O Ibama foi questionado após o MPF receber denúncias de maus-tratos a animais e de várias irregularidades no Cetas-DF, conforme revelado pelo Metrópoles.
No ofício expedido em 4 de setembro (veja abaixo) foi dado prazo de 20 dias para o órgão se manifestar sobre o conteúdo da representação. O instituto, porém, não respondeu todas as questões e solicitou mais 20 dias para completar os esclarecimentos. O pedido está sob análise do Ministério Público.
Veja, abaixo, os documentos:
Justificativas
O Metrópoles teve acesso ao processo no Sistema Eletrônico de Informações (SEI) em que constam as respostas do Ibama ao MPF. Quanto à denúncia de que os recintos no Cetas-DF apresentam precárias condições de acomodações e habitabilidade, o instituto disse que a afirmação “é desprovida de qualquer subsídio técnico”.
Apesar disso, confirmou que “as instalações são usadas” e “desgastadas”, alegando, no entanto, que seguem “em viável e pleno funcionamento”. “Melhorias estruturais estão sendo realizadas em contrato de manutenção que a Autarquia possui”, acrescentou.
Servidores ainda relataram que o ambiente do Cetas-DF é insalubre, situação confirmada pelo Ibama. O órgão, entretanto, justificou que no local “há manejo de animais silvestres, o que realmente caracteriza risco de contaminação aos prestadores de serviço e servidores”, e que, por isso, eles recebem adicional de insalubridade.
A situação do Cetas passou a chamar a atenção das autoridades durante as investigações da Polícia Civil do DF sobre tráfico internacional de animais. A apuração teve início depois que o estudante de medicina veterinária Pedro Krambeck foi picado por uma cobra Naja. Ele, a mãe e o padrasto se tornaram réus na Justiça. Responderão por associação criminosa, venda e criação de animais sem licença e maus-tratos contra animais.
Veja, abaixo, imagens do Cetas-DF:
Alimentação e limpeza
Outro ponto relatado por servidores é que o Centro de Triagem do DF não estaria fornecendo alimentos aos animais. O contrato para a alimentação das espécies teria vencido em dezembro de 2019 e, desde então, as comidas estariam sendo doadas por outras instituições.
Em resposta ao MPF, o Ibama admitiu o problema, mas disse que, agora, há um processo de licitação em fase final. “A demora no processo se deu por problemas internos […] Em breve, o fornecimento de alimentos aos animais voltará à normalidade”, assinalou.
O instituto ainda confirmou ter mantido a alimentação das espécies, de janeiro a setembro deste ano, com doações do Zoológico de Brasília e de feiras de produtores. Entretanto, disse que, com a pandemia do novo coronavírus, restringiu o recebimento de animais apenas àqueles com necessidade de atendimento imediato. Isso ocasionou uma redução de 60% do total recebido anteriormente.
“Sendo assim, a ausência de contrato de alimentos não foi prejudicial aos animais, sendo garantido o seu bem-estar por meio das doações recebidas”, justificou-se.
Além disso, funcionários denunciam que o local sofre com falta de limpeza. Neste ano, foi feita uma nova licitação para contratação de empresa que cuidará da conservação e limpeza de imóveis do Ibama no DF. Segundo o Termo de Referência (veja abaixo), os serviços agora serão executados “semanalmente” no Cetas.
Este foi um dos pontos da representação que o Ibama pediu prorrogação de prazo para enviar resposta. O instituto também pediu mais 20 dias para explicações sobre a denúncia de o telefone do Cetas-DF estar desligado por falta de pagamento e sobre a alegação de que uma reforma está sendo executada irregularmente no local.
Novas denúncias
Após a reportagem do Metrópoles sobre relatos de irregularidades no Cetas-DF, novas denúncias de servidores do Ibama reforçam casos de maus-tratos a animais no local. Funcionários chegaram a registrar imagens para mostrar a situação nas instalações (veja abaixo).
“Há reprodução de espécies dentro do próprio órgão, porque não há separação de sexo entre os indivíduos”, disse uma servidora que pediu para não ser identificada.
Nas fotos, é possível ver baratas dentro de baldes onde há alimentos para aves e um pássaro morto em uma gaiola. “No balde azul, é painço (cereal) com baratas e no verde é mistura de alimento para passeriformes também com presença de baratas”, descreveu ela.
Animais estão sendo tratados no Zoológico
O Cetas-DF atende, em média, 7 mil animais por ano, mas somente cerca de 10% chegam ao local provenientes de operações do Ibama. Outros 45% são de fiscalizações do Batalhão da Polícia Militar Ambiental do DF (BPMA) e do Instituto Brasília Ambiental (Ibram), 27% de recolhimento/resgate, e 12% de entregas voluntárias.
Conforme o próprio Ibama, a situação na capital “é precária quanto ao quadro de profissionais, dominado por técnicos administrativos, sem condições de decisão para a função precípua de um Cetas”.
Para diminuir o problema, então, o órgão criou uma parceria com a Universidade de Brasília (UnB), para que médicos veterinários do Programa de Pós-graduação de Residência em Clínica e Cirurgia de Animais Silvestres acompanhem animais que precisam de tratamento. Segundo a UnB, o convênio prevê triagem, internação e cuidados parentais.
Com o início da pandemia, contudo, os veterinários deixaram de ir ao Cetas e passaram a receber os animais no Hospital Veterinário. Até 14 de agosto, o tratamento e a reabilitação das espécies eram realizados na unidade. Porém, com o retorno do calendário acadêmico, os trabalhos passaram a ser feitos nas dependências do zoológico, que informou estar “prestando todo o apoio e suporte para o Cetas com animais que necessitam de tratamento veterinário”. Ao MPF, o Ibama disse que o atendimento no zoo ocorre apenas “em caráter excepcional” atualmente.
O Metrópoles procurou o Ibama para o órgão esclarecer, portanto, que serviços, de fato, ainda são realizados no espaço do Cetas-DF, bem como comentar as imagens enviadas por servidores e as denúncias, mas não teve respostas. O espaço permanece aberto para eventual manifestação posterior.