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HRSam: bebê teve clavícula quebrada e mãe foi chamada de “porca e sebosa”

PCDF recebeu quatro novas denúncias de pacientes que teriam sido vítimas de negligência e violência obstétrica na unidade da rede pública

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Rafaela Felicciano/Metrópoles
HRSam – hospital regional de samambaia
1 de 1 HRSam – hospital regional de samambaia - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Bebê com clavícula quebrada, restos de material do parto dentro da mãe e maus-tratos. Os relatos fazem parte de quatro novas denúncias recebidas pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) de negligência médica e violência obstétrica no Hospital Regional de Samambaia (HRSam). Os casos estão sendo apurados pela 26ª Delegacia de Polícia, em Samambaia Norte. O número de ocorrências chegou a 15.

“Todo dia tem alguém ligando”, afirma o delegado Guilherme Sousa Melo, responsável por apurar as denúncias. Segundo ele, depois da divulgação inicial, muitas mulheres estão se sentindo encorajadas a contar o que ocorreu com elas.

Os quatro novos casos, informa o delegado, seguem o mesmo roteiro daqueles que já estão sendo apurados: curetagem malfeita, destrato com pacientes e diagnósticos errados. Um deles, no entanto, chamou atenção pela quantidade de acusações. “A criança teve a clavícula quebrada durante o parto, o médico deixou restos de placenta no útero da mãe e ainda a chamou de sebosa e porca”, disse o delegado.

O problema para a apuração é conseguir identificar, de fato, todos os médicos que agiram de forma negligente. “É muito difícil que as pacientes lembrem o nome de quem as atendeu. Já pedimos a escala dos dias em que ocorreram os casos, só que, mesmo assim, não dá para afirmar que foram os tais profissionais”, explica.

“Já determinamos que seja feito o acompanhamento do caso e vamos fornecer todos os dados aos órgãos competentes pela investigação. Se houver realmente irregularidades, vamos punir esses profissionais”, ressaltou. O titular do Palácio do Buriti determinou a abertura de uma sindicância para apurar os fatos.

O governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB), decidiu manter o diretor do hospital, Luciano Moresco, assim como os médicos sob investigação: “Não podemos punir ninguém já de início, salvo quando existe uma clareza no que está acontecendo, e não pretendemos cometer nenhum tipo de injustiça”, ponderou.

“Tudo está em apuração. Por exemplo, existe uma denúncia de fratura da clavícula de um feto. Mas há a argumentação de que, em certos casos, o médico pode fazer o deslocamento para facilitar o parto. Além disso, o CRM-DF [Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal] também está investigando”, disse.

Disseram que o filho estava morto

Nessa quarta-feira (17/07/2019), o Metrópoles trouxe o relato de uma jovem de 16 anos. A estudante V. G. S. viveu horas de apreensão após, grávida, dar entrada no HRSam apresentando fortes dores na região da barriga. Na unidade pública de saúde, foi recebida e atendida por uma médica que, sem nem mesmo precisar realizar qualquer exame, diagnosticou a morte precoce de seu bebê e receitou um abortivo. Nove horas depois, a gestante entrou em trabalho de parto e, contrariando o diagnóstico da profissional, deu à luz um menino cujo coração ainda batia.

A surpresa e a alegria da mãe e dos familiares duraram exatas uma hora e 40 minutos. Após ela deixar a sala de cirurgia para se instalar no quarto, um médico informou à jovem que seu bebê prematuro, de seis meses, havia sofrido complicações e não resistiu. O óbito foi registrado às 23h30 daquele dia.

A adolescente sustentou que a morte da criança é resultado da negligência dos profissionais e poderia ter sido evitada com um diagnóstico preciso.

“A médica apenas tocou na minha barriga e disse que meu bebê tinha morrido. Sem fazer exames, me medicou. Mais tarde, por volta das 19h, outro médico me examinou, com um estetoscópio, e disse que não conseguia ouvir os batimentos cardíacos. Mesmo assim, meu filho nasceu vivo. Se fosse em qualquer outro hospital ou qualquer outro médico, ele poderia estar comigo hoje”, desabafou a jovem.

Gaze esquecida na vagina

Erika Pereira Nascimento, 25 anos, foi outra a denunciar o HRSam. Não bastasse o trauma de perder o primeiro filho por complicações na gestação, de acordo com a mulher, os médicos responsáveis pelo parto do natimorto esqueceram, em seu útero, duas gazes utilizadas no procedimento cirúrgico.

Erika relatou ter procurado a unidade após realizar exame de ultrassom que apontou a morte precoce do bebê. Diante da comprovação, a equipe optou pela internação da jovem. “Eles [médicos] disseram que não tinham como fazer mais nada. Fizeram os procedimentos de internação, mas só fui fazer o parto no dia seguinte, por volta das 5h.”

Dois dias após o parto, a autônoma recebeu alta médica e voltou para casa. No entanto, durante a recuperação, começou a ter complicações. “Fiz todo meu resguardo da maneira como me foi recomendado e, no final dele, comecei a sentir umas dores e percebi que saía um líquido com odor forte e sangue da minha vagina. No início, achei que fazia parte do próprio resguardo”, conta.

Cinco dias após ela apresentar os sangramentos na região uterina, as dores se intensificaram, levando-a a procurar novamente o HRSam. “Eu sentia uma dor muito forte. Quando tocava, parecia ter um caroço. Fui ao hospital ver o que era, e o médico retirou de dentro da vagina a primeira gaze, que estava podre, e em seguida outra.”

Segundo Erika, o profissional responsável pela extração dos materiais hospitalares omitiu a informação no prontuário, em uma tentativa de “tentar esconder o erro médico”. À reportagem, a jovem disse ter procurado a PCDF no dia seguinte, para denunciar o fato, e ter se sentido “esquecida”.

Foi tudo muito difícil. Primeiro, perdi meu primeiro filho, em um hospital que não tinha atendimento bom, que foi negligente. Fui esquecida e minha irmã teve de procurar os médicos para que eles me atendessem. Depois do parto, quando estava me recuperando e sofrendo meu luto, ainda tive que passar por tudo isso, inacreditável

Érika Pereira Nascimento
O que diz a Secretaria de Saúde

Em nota, a Secretaria de Saúde disse que o HRSam realizou, nos seis meses e meio deste ano, 2.581 partos naturais, cerca de 370 por mês, com baixo percentual de mortalidade: 9,2 óbitos fetais a cada 1 mil nascidos vivos, sendo que o ideal estabelecido pelo Ministério da Saúde é abaixo de 10. O índice de partos normais realizados é de 83%, bem acima do recomendado pelo ministério, que é de 70% a 75%.

A pasta ainda informou que, dos nove boletins de ocorrência encaminhados pela polícia ao hospital, um diz respeito à Clínica Médica e já foi resolvido. Os oito restantes já eram de conhecimento da Superintendência da Região de Saúde Sudoeste e estavam ou estão sendo apurados, caso a caso, respeitando-se o sigilo previsto na legislação.

Desses oito, afirma a secretaria, dois foram resolvidos em juízo. Em um terceiro, “a paciente assegurou que iria retirar a ocorrência e agradeceu à equipe médica pela conclusão do atendimento recebido”, informa a nota.

Em relação aos outros cinco casos, a Saúde diz que “há aqueles que configuram complicações e/ou intercorrências inerentes à patologia de base e que possuem evidências científicas suficientes para corroborar tal afirmação”. Há, também, de acordo com a resposta enviada ao Metrópoles, casos de maior complexidade, “que exigem apuração investigativa por parte do Conselho Regional de Medicina (CRM), assegurado ao profissional acusado o direito de apresentar defesa e contestações”.

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