Gol diz que apura racismo contra homem negro que achou carrapato em voo
Comissário teria dito que bichos poderiam ter caído do cabelo afro de passageiro. Gol diz que não compactua com atitudes discriminatórias
atualizado
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A companhia aérea Gol informou que vai apurar o caso revelado pelo Metrópoles nesta segunda-feira (9/8), em que um homem negro, morador de Vicente Pires, denunciou ter sido vítima de racismo em um avião da empresa. O caso ocorreu com o biólogo Bruno Henrique Dias Gomes, 25 anos, em junho deste ano, durante um voo que saía de Marabá (PA) para Brasília.
Por nota enviada à reportagem, a empresa aérea afirma que “não compactua com quaisquer atitudes discriminatórias, preza pelo respeito e pela valorização das pessoas, e vai apurar o ocorrido”.
Bruno contou que, durante o voo, caíram carrapatos em cima dele e da passageira ao lado. Ao acionar o comissário de bordo, porém, ele relata ter sido constrangido: “Falou que poderia ter caído do meu cabelo”.
Segundo Bruno, ele viajou para o Pará com o objetivo de fazer um concurso da Polícia Miliar, ocorrido em 6 de junho. No dia seguinte, ele voltou para Brasília, onde vive com a esposa.
Durante o voo, ele assistia a uma série no celular, quando um carrapato caiu em cima do telefone. “Eu estava sentado na poltrona ao lado do corredor. Do nada, caiu uma coisa em cima do celular. Eu e a passageira ao lado ficamos observando e, depois, ele caiu no chão. Passou uns três, quatro minutos e caiu outro, no ombro dela. Eu tirei, com a mão mesmo, coloquei sobre a bancada e chamei o comissário. Falei que já era o segundo que caía, aí ele: ‘Você tem certeza?’ Eu mostrei o que estava na minha mão, aí ele saiu e voltou”, narra.
“Mais uns cinco minutos e caiu outro na minha mesa. Fui tentar pegar e ele caiu no chão. Chamei o comissário de novo e começou um burburinho na aeronave, porque na minha poltrona e na da frente todo mundo levantou para ver se tinha caído sobre os bancos. Quando chegaram esses dois comissários, eles trocaram um pessoal [de assento] e eu continuei na minha poltrona. Aí, nesse momento, um deles falou assim: ‘Pode ter caído de qualquer lugar, até do seu cabelo’. Meu cabelo é afro”, completa.
Bruno diz que após desembarcar procurou um guichê da companhia aérea, mas não conseguiu registrar reclamação. “Eu estava meio atordoado com os carrapatos caindo e não guardei a fisionomia do comissário”, diz.
“A moça falou: ‘Isso não dá nada, não, pode acontecer porque [o carrapato] pode vir em bagagem de cliente’. Aí eu falei: ‘Mas eu fui constrangido’. E ela disse: ‘infelizmente, não temos o que fazer’. Aí, voltei para casa, mas como eu estava atordoado com essa questão do concurso, nem pensei em registrar ocorrência. Depois, eu estava conversando com a minha tia e ela alertou: ‘isso é racismo'”, conta.
Ele, então, fez uma reclamação no site da Gol, no consumidor.gov.br e no Reclame Aqui. Porém, diz que não teve retorno pelo site da companhia aérea.
Por meio do consumidor.gov.br, Bruno recebeu contato da Gol, oferecendo bônus de R$ 500 para compra de outra passagem. Contudo, ele não conseguiu usar, uma vez que o prazo de validade era até 31 de julho.
“Eles mandaram essa mensagem falando que dariam o bônus. Mas isso não repara. Eu falei para eles que não queria dinheiro, queria um pedido de desculpas pelo constrangimento que passei”, comenta.
Confira a troca de mensagens entre Bruno e a companhia aérea após a reclamação do passageiro:
Segundo Bruno, após a viagem de avião, ainda levou um tempo para ele entender o que havia acontecido e, então, tomar alguma medida. “Eu tive Covid no início, por 15 dias. Depois disso, foi quando tive contato com a minha tia, conversei com ela e abri a reclamação no site. Quando tive um retorno deles [da Gol], aí eu entendi que, se eles assumiram o erro e pagaram [o bônus], eles sabem que fizeram uma coisa errada”, afirma. “Pensei que, se foi difícil para eu entender, outras pessoas podem passar pela mesma coisa também sem perceber”, acrescenta o biólogo.
Nos próximos dias, Bruno pretende denunciar o caso à polícia. “Sou de religião de matriz africana e tem uma época do ano em que não posso chegar em aeroporto ou rodoviária. Então, por conta da minha religião, não posso ir agora ao aeroporto nos próximos dias. Daqui 10 dias eu vou lá na Polícia Federal [ao lado do Aeroporto de Brasília] fazer a ocorrência”, finaliza.
O que diz a Gol
Além de informar que apuraria o caso, a Gol disse acreditar que os insetos possam ter sido transportados acidentalmente em alguma mala de mão. “Todas as aeronaves da companhia passam por procedimentos diários e rigorosos de sanitização, e a dedetização das aeronaves é realizada periodicamente, em curtos intervalos de tempo, como parte da rotina mandatória de manutenção.”