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“Está passando, mãe. Foi só um teste”, disse a gamer induzida ao suicídio por grupo na internet

Segundo a mãe da vítima, a jovem sofria de depressão profunda e estava sendo acompanhada por especialistas e pela família

atualizado

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Hugo Barreto / Metrópoles
Depressão
1 de 1 Depressão - Foto: Hugo Barreto / Metrópoles

Permanecem, na memória da mãe da vítima, as últimas palavras da estudante, estagiária e gamer, de 21 anos, morta após ingerir um produto, incentivada pelo grupo acusado de induzir jovens a cometer suicídio. “Não precisa chamar ninguém. Já está passando. Foi só um teste, mãe”, contou, emocionada, a mulher de 41 anos, em relato ao Metrópoles.

A mãe e o pai da vítima vivem juntos no Paranoá e ainda tentam superar a tragédia que acometeu a família, em 3 de fevereiro deste ano. A filha do casal morreu após ingerir uma substância tóxica. Segundo as investigações, a vítima tinha o objetivo de testar os efeitos do produto em seu organismo, mas não tinha a intenção de cometer suicídio na ocasião.

“Ela tinha uma depressão profunda, mas esse grupo incentivou. Eu li muita coisa, porque o computador estava aberto no dia. Não foi decisão dela. Ela falou para gente que era um teste e pediu socorro para gente. Na hora ela falou. E perguntei: ‘Como você faz um teste para morrer?’. E ela disse: ‘Foi só um teste, mãe'”, relatou a mulher.

Segundo a família, a jovem lutava contra a depressão havia cinco anos, aproximadamente. Ao identificar a gravidade da doença, os pais providenciaram tratamento psicológico e psiquiátrico para a filha. Além do acompanhamento, familiares redobraram a atenção no dia a dia. A gamer cursava faculdade, fazia estágio e frequentava academia.

A família pensava que estava a jovem estava se recuperando e não tinha conhecimento das investidas do grupo criminoso. “É muito doído para gente. É muito doído. Eu tento ser forte, mas estou só uma capa”, chorou a mãe. Familiares mantêm, até hoje, o quarto da moça, com os pertences dela. E não planejam mexer no local.

O tempo parou

No dia da tragédia, a família manteve o computador e o celular da jovem ligados. Nos aparelhos, constam conversas da vítima com os criminosos. Os pais entregaram todo material para a polícia e as provas foram fundamentais para a prisão do grupo na última quarta-feira (29/9), na megaoperação deflagrada pela 6ª Delegacia de Polícia (Paranoá).

“Para mim, a prisão foi um alívio, porque não vai trazer a minha filha de volta. Não vai acabar com a dor que estou sentindo. Não vai acabar com o vazio que estou sentindo. Porque ninguém tem ideia do que a gente está passando. Para as outras pessoas, passou muito tempo. Para mim, não. Para mim, o tempo parou naquele dia”, afirmou.

Tristeza solitária

Na leitura da mãe, a tristeza da jovem estudante era marcada pela solidão. “Ela se isolava muito. Não queria sair de casa, nem conversar”, lamentou.

A jovem ia completar 22 anos em 6 de fevereiro e a família preparava uma festa para a moça. “Ela já tinha passado por períodos graves da depressão e os sinais estavam bem melhores ultimamente. Ela teve uma recaída no ano passado, chegou a me falar e a gente continuou com o tratamento”, comentou. A jovem também tinha dificuldades para dormir. “Essa doença tira a alegria de viver”, resumiu.

Após meses com amizades predominantemente virtuais, a jovem estava se recuperando e conquistando amigas na vida real. Um dia de cada vez, a mãe comemorava os avanços no tratamento. Com o passar do tempo, a jovem passou a gostar de sair para comer em bons restaurantes. Sua refeição predileta era churrasco.

Orgulho

“Ela estava, sim, tentando mudar a vida dela. Foi ela quem pediu ajuda. Alguns amigos me avisaram, mas ela me contou. E os médicos diagnosticaram a depressão profunda. Depressão não é algo simples de explicar. Às vezes você está super feliz e daqui a 10 minutos não está. A mudança de humor é muito grande”, ponderou.

A mãe tinha muito orgulho da filha e diz que havia criado uma pessoa muito correta. “Minha filha era muito boa e, para mim, ela está sempre aqui comigo”, disse a mulher. A jovem sonhava em completar os estudos e morar fora do Brasil, e tinha preferência por estabelecer residência no Canadá.

Estejam atentos

A mãe da vítima faz um alerta para evitar que outras famílias vivam tragédias semelhantes. “O que eu tenho para dizer é: estejam atentos. Nós estivemos, mas é muito difícil controlar um jovem. Não tem como controlar 24 horas por dia”, aconselhou. “Às vezes a gente acha que está tudo bem, e nem sempre está”, completou.

“Até o momento, eu não assimilei. A gente perde muito a felicidade de viver. Estamos lutando um dia de cada vez, porque só Deus para manter aqui. Eu só consigo pensar no dia em que vou reencontrá-la”, assinalou a mãe da vítima.

Para a dona de casa, a postura de todas autoridades envolvidas no caso foi exemplar. A única crítica dela é a ausência do antídoto Azul de Metileno na rede pública. A substância poderia ter salvado a jovem, mas não havia doses disponíveis. Por isso, ela cobra o abastecimento nos hospitais públicos, para poupar eventuais vítimas no futuro.

Busque ajuda

O Metrópoles tem a política de publicar informações sobre casos de suicídio ou tentativas que ocorrem em locais públicos ou causam mobilização social. Isso porque é um tema debatido com muito cuidado pelas pessoas em geral. O silêncio, porém, camufla outro problema: a falta de conhecimento sobre o que, de fato, leva essas pessoas a se matarem.

Depressão, esquizofrenia e o uso de drogas ilícitas são os principais males identificados pelos médicos em um potencial suicida. Esses problemas poderiam ser tratados e evitados em 90% dos casos, segundo a Associação Brasileira de Psiquiatria.

Está passando por um período difícil? O Centro de Valorização da Vida (CVV) pode te ajudar. A organização atua no apoio emocional e na prevenção do suicídio, atendendo voluntária e gratuitamente todas as pessoas que querem e precisam conversar, sob total sigilo, por telefone, e-mail, chat e Skype, todos os dias, 24 horas.

 

Arte/Metrópoles

 

Disque 188

A cada mês, em média, mil pessoas procuram ajuda no Centro de Valorização da Vida (CVV). São 33 casos por dia, ou mais de um por hora. Se não for tratada, a depressão pode levar a atitudes extremas.

Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS), a cada dia, 32 pessoas cometem suicídio no Brasil. Hoje, o CVV é um dos poucos serviços em Brasília em que se pode encontrar ajuda de graça. Cerca de 50 voluntários atendem 24 horas por dia a quem precisa.

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