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Escola pública no DF atua para prevenir depressão e automutilação

Projeto se destina a alunos “invisibilizados”, afirmou Cleison Leite, coordenador do projeto do Centro Educacional Gesner Teixeira

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Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil
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1 de 1 escola_gesner_teixeira_suicidio20190227_1134 - Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Sarah de Aguiar tinha 13 anos quando começou a se cortar. A automutilação teria seguido se ela não tivesse sido surpreendida pela mãe, Weslayne de Aguiar. Depois de prometer à mãe que não se cortaria mais, Sarah pediu ajuda na escola. Foi assim o início do Projeto Asa, implantado em 2014 no Centro Educacional Gesner Teixeira, escola pública na Cidade Nova DVO, no Gama, a 42 Km do centro de Brasília.

“Quando se está nesse mundo, a gente pensa que não tem ninguém ao redor que ame a gente”, disse. “Eu não comia mais, ficava dentro do quarto, sempre com o celular na mão, conversando com essas pessoas em grupos de Facebook e WhatsApp que tratavam do assunto. Achava que elas um dia podiam me ajudar”, relatou.

Foi assim até a mãe a surpreender. Sarah procurou, então, a orientadora educacional da escola, Raquel Guimarães. Mostrou à orientadora que o seu caso não era isolado: outros estudantes também se cortavam, inclusive dentro do colégio. “Depois que minha mãe descobriu, eu não fiz mais, porque eu prometi para ela que não ia mais fazer”, afirmou.

A estudante passou a colaborar com o projeto. “Entrei para o projeto e falei para a Raquel que queria ajudar. Trouxe várias meninas que eu conhecia e incentivei a parar.”

Terapia de roda
O Projeto Asa reunia esses estudantes em uma terapia de roda. As reuniões foram se expandindo e começaram a envolver também as mães e responsáveis por elas. Além das rodas, as meninas tinham aulas de dança, artesanato e teatro.

A orientadora educacional envolveu a rede de saúde, preocupada porque as meninas, muitas vezes, compartilhavam as lâminas, aumentando o risco de contraírem doenças. Raquel também procurou a Polícia Civil. A apuração revelou que os grupos online dos quais as meninas participavam tinham maiores de idade que se passavam por menores e as incentivavam a se cortar e a compartilhar as fotos.

A iniciativa deu tão certo que, em 2018, as práticas integrativas em saúde entraram no projeto político-pedagógico da escola. Hoje, em parceria com a Secretaria de Saúde, a escola oferece também meditação, reiki e automassagem. Em 2017, o Centro Educacional recebeu o Prêmio Escola de Atitude, promovido pela Controladoria-Geral do Distrito Federal.

Saúde e aprendizagem
Logo após a experiência inicial, as rodas foram ampliadas. Começaram a participar alunos que precisavam de alguma ajuda, como estudantes com bulimia. Ingressaram também estudantes que queriam participar dessa inciativa pelos mais diversos motivos, como a então tímida Rebeca Barbosa, que queria dançar. Ela tinha apenas 8 anos quando começou a frequentar o grupo.

“Eu não era muito de conversar com as pessoas. Eu era muito tímida. Agora, eu sou bem aberta”, afirmou Rebeca, que também superou problemas com a própria aparência. “Hoje em dia, eu me vejo maravilhosa, eu sou linda”.

A escola pública fica em um local onde há registros de tráfico de drogas e violência e onde isso impacta o cotidiano dos alunos e das famílias. “Eu tento mostrar que eles podem mudar a realidade deles e que somente eles podem fazer isso”, diz a orientadora educacional da escola.

Esse tipo de cuidado e atenção melhorou também o desempenho dos estudantes. “O foco da escola é aprendizagem. O projeto mexeu com a aprendizagem. Incluiu alunos que antes eram invisibilizados”, disse o assessor técnico de inovação e projetos da Coordenação Regional de Ensino do Gama, Cleison Leite.

Até o ano passado, ele trabalhava na escola e fez parte da construção do projeto político-pedagógico. “Aspectos emocionais estavam interferindo também nas relações. Alguns conflitos que existiam na escola passaram a ser mediados. As rodas de terapia, colocaram em foco problemas de relacionamento. Além da automutilação, as rodas ajudaram nas questões interpessoais”, afirmou.

Abandono familiar
Raquel explica que casos de automutilação podem, em última consequência, levar ao suicídio e que a depressão precisa de atenção. Algumas das estudantes foram encaminhadas à rede de saúde, quando se percebia que era necessário um acompanhamento psiquiátrico.

“Todos os casos estavam ligados à depressão. Pelo que eu constatei, a automutilação era consequência da depressão e esse quadro era gerado por abandono familiar, por casos de abuso sexual”, disse.

No último dia 27, a escola abriu as portas para profissionais da saúde, para educadores e para quem quisesse conhecer a experiência. A analista técnica de políticas sociais do Ministério da Saúde, Marina Rios, estava presente. “A gente veio conhecer, acompanhar, conhecer a iniciativa para poder replicar em outros contextos”, disse a analista, que integra o Comitê Nacional de Prevenção ao Suicídio.

Casos de depressão
De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o número de pessoas que vivem com depressão aumentou 18% entre 2005 e 2015. No Brasil, a depressão atinge 11,5 milhões de pessoas, o equivalente a 5,8% da população. Distúrbios relacionados à ansiedade afetam mais de 18,6 milhões de brasileiros, ou seja, 9,3% da população.

A depressão pode levar a um grande sofrimento e disfunção no trabalho, na escola ou no meio familiar e pode levar ao suicídio. Segundo a OMS, cerca de 800 mil pessoas morrem por suicídio a cada ano em todo o mundo. Trata-se da segunda principal causa de morte entre pessoas com idade entre 15 e 29 anos.

“Os jovens estão todos na escola. Às vezes, a gente tem dificuldade de chegar a eles pelo serviço de saúde. A escola tem acesso a todos os casos e pode, inclusive notificar o sistema de saúde, quando necessário. Pode notificar casos de violência e de tentativa de suicídio”, disse Marina Rios.

Sarah é prova da importância da escola. “Na época, ninguém falava disso. A depressão era uma coisa que ninguém levava a sério. A escola foi o lugar que mais me abriu fronteiras. Ninguém imagina esse como um papel da escola, mas foi maravilhoso”, disse.

Hoje, com 17 anos e já com o ensino médio concluído, ela ainda participa do projeto, ajudando a divulgar a iniciativa e a mostrar aos estudantes que outras pessoas passam pelo que estão enfrentando. A estudante conta que não se sente mais só como chegou a se sentir.

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