Risco de fuga de bispo para Itália embasou pedido de prisão preventiva
Em diálogos interceptados com autorização da Justiça, um dos envolvidos no suposto esquema de desvios de dízimos fala dessa possibilidade
atualizado
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Um dos motivos que levaram o Ministério Público de Goiás a pedir a prisão preventiva dos suspeitos de participação no suposto esquema de desvio de dinheiro de Igreja Católica no Entorno do DF é o risco de fuga dos envolvidos. Isso porque, nas intercepções telefônicas feitas pelos investigadores com autorização da Justiça, os interlocutores falam nessa possibilidade.
Em um dos diálogos, o contador da Cúria Diocesana, Darcivan da Conceição, revela o temor em relação às investigações do MP a um padre identificado como Romilson. “Eles estão chamando pouco a pouco”, diz ele. Do outro lado da linha, Romilson indaga: “Será que vão me chamar?”.A conversa, do dia 7 de março deste ano, continua e, em determinado momento, Darcivan, um dos presos na Operação Caifás, afirma que “o pessoal está com medo de o bispo [José Ronaldo, de Formosa] fugir”. “O pessoal tava falando o seguinte: que está com medo de ele fugir para não ser preso”, revela um dos trechos. E completa: “Estão de olho nele porque se ele falar em sair, o pessoal vai acionar a Justiça.”
Conforme pontuou um dos promotores que conduzem as investigações, esse trecho da conversa é revelador e ajudou a embasar o pedido da preventiva. “Identificamos nas transições telefônicas a possibilidade de fuga do bispo para a Itália. Foi um dos motivos para o pedido de prisão preventiva dele”, afirmou Douglas Chegury, em entrevista ao Metrópoles.
Segundo o promotor, durante os depoimentos, os presos tiveram “amnésia seletiva”. Ouvido na quinta-feira (22), o bispo José Ronaldo foi o único a ficar completamente calado durante a oitiva. “Todos os outros falaram, mas quando eram confrontados usavam respostas evasivas, tipo: ‘Não sei’ ou ‘não lembro'”, ressaltou.
Nesta sexta (23/3), a Justiça decretou a prisão preventiva de oito presos na Operação Caifás. Entre os que ficaram encarcerados no presídio de Formosa, está dom José Ronaldo. Ao todo, 11 pessoas passaram a ser réus perante a 2ª Vara Criminal do município goiano. Elas responderão por delitos como associação criminosa, falsidade ideológica, apropriação indébita e lavagem de dinheiro.
Para o juiz Fernando Oliveira Samuel, da 2ª Vara Criminal da Comarca de Formosa, há motivos suficientes para manter os acusados presos de forma preventiva. Entre eles, o fato de as interceptações telefônicas mostrarem que os denunciados intimidam e coagem os padres não envolvidos nas atividades ilícitas. “Uma vez soltos, poderão efetivamente intimidar testemunhas nessa apuração”, disse, em sua decisão.
Chegou-se ao ponto de os representantes maiores da Cúria Diocesana convocarem o agora réu e padre Thiago Wenceslau, morador de distante localidade, a se dirigir nesta diocese, sob o título de juiz eclesiástico, com o único e sombrio propósito de julgar os padres que estavam a criticar ou questionar a forma de administração por parte da administração da Cúria, composta essencialmente pelo bispo José Ronaldo, pelo vigário-geral Epitácio e pelo ecônomo Mário Vieira
Fernando Oliveira Samuel, juiz da 2ª Vara Criminal da Comarca de Formosa
Entre as provas materiais apontadas pelo juiz para embasar o acolhimento da denúncia do MP, estão R$ 75 mil achados na residência paroquial de Epitácio, pelo menos 12 recibos que podem demonstrar a forma de atuação do grupo e declarações diversas apreendidas nos autos. “Ainda constam o Comunicado à Sociedade e ao Povo de Deus da Diocese de Formosa e o Relatório Contábil, que aparentemente constam informações falsas sobre a contabilidade da Mitra Diocesana de Formosa”, destacou o magistrado da 2ª Vara Criminal de Formosa.
Os suspeitos foram encarcerados durante a operação deflagrada na segunda-feira (19), com o apoio da Polícia Civil de Goiás. A Justiça decretou a prisão temporária dos acusados, que vencia nesta sexta (23). Eles são acusados de desviar ao menos R$ 2 milhões de recursos da Igreja Católica.
Confira os crimes que os acusados vão responder na Justiça:
Bispo José Ronaldo Ribeiro: associação criminosa, falsidade ideológica e apropriação indébita
Monsenhor Epitácio Cardozo Pereira: apropriação indébita e associação criminosa
Moacyr Santana (pároco da Catedral Nossa Senhora Imaculada Conceição, Formosa): associação criminosa, lavagem de dinheiro e apropriação indébita
Edimundo da Silva Borges Júnior (advogado da Cúria): associação criminosa e falsidade ideológica
Darcivan da Conceição (contador da Cúria): associação criminosa e falsidade ideológica
Guilherme Frederico Magalhães: associação criminosa e apropriação indébita
Mário Vieira de Brito (pároco da Paróquia São José Operário, Formosa): associação criminosa, lavagem de dinheiro e falsidade ideológica
Thiago Wenceslau de Barros (juiz eclesiástico): associação criminosa e falsidade ideológica
Waldson José de Melo (pároco da Paróquia Sagrada Família, Posse): apropriação indébita e associação criminosa
Antônio Rubens Ferreira e Pedro Henrique Costa (empresários apontados como laranjas no esquema): lavagem de dinheiro