“Filhos” do bispo são acusados de violência doméstica e estupro
Rapazes sustentados por dom José Ronaldo Ribeiro, preso na Operação Caifás, colecionam histórias de barbaridade por onde passam
atualizado
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Na cadeia há 22 dias sob acusação de liderar uma organização criminosa que desviou cerca de R$ 2 milhões da Igreja Católica, dom José Ronaldo Ribeiro, bispo de Formosa (GO), coleciona histórias polêmicas no município goiano distante 100km de Brasília. No episódio mais recente, um de seus “filhos” é suspeito de espancar uma mulher em Sobradinho. Até fevereiro deste ano, o rapaz identificado como Maurício Martins Alves morava com o religioso na casa episcopal da Diocese de Formosa.
Em desabafo no Facebook, a jovem agredida narra como teve o nariz quebrado após levar uma cabeçada de Maurício. “Peço que denunciem esse verme. Hoje, ele me agrediu dentro da minha casa. Estou com o nariz quebrado. Tem várias passagens, inclusive por agressão à esposa e tráfico de drogas”, relatou a vítima.
Na ocorrência registrada na 13ª DP (Sobradinho), o delegado responsável pelo caso requereu medidas protetivas de urgência para a mulher, como determinar ao autor manter-se distante da vítima. Segundo apurou o Metrópoles, o suspeito acompanhava o bispo desde quando ele dirigia a Diocese de Janaúba, no interior de Minas Gerais.
Maurício teria se casado, mas, pouco tempo depois, se separou e voltou a morar com o bispo na casa episcopal. “Ele passou a vida inteira sustentado pelo padre, apesar de nunca ter frequentado as missas”, disse uma moradora de Formosa, que preferiu não se identificar.
Ao intimar o acusado para depor no episódio de agressão, os policiais da 13ª DP descobriram a existência de um mandado de prisão em aberto contra o jovem, também com base na Lei Maria da Penha.
Outro “filho” acusado de estupro
Um outro “filho” de dom José Ronaldo Ribeiro também está encrencado com a Justiça. Em fevereiro do ano passado, em Caldas Novas (GO), Wellington Floro, 27, foi detido sob acusação de estuprar uma criança de 11 anos. Ele teria cometido o abuso junto com o padrasto da menina, que também se encontra preso. Em uma rede social, moradores o reconheceram como um dos protegidos do religioso.
“Esse cara é filho do bispo, sim. Há um tempo, comprei uma moto dele e o bispo estava presente na negociação”, escreveu no post um morador do município mineiro. Veja:
Carros de luxo e bebidas
Na segunda-feira (2/4), o Metrópoles mostrou que, além do gosto peculiar por carros de luxo, relógios de grife e joias, dom José Ronaldo Ribeiro aparentava ter apreço por bebidas, e não era vinho. Investigação conduzida pela Polícia Civil de Goiás apura denúncia de que o líder religioso teria usado uma espécie de cartão corporativo da Igreja para comprar cerveja e uísque.
O caso chegou ao conhecimento das autoridades policiais por meio de um dos “filhos” do bispo de Formosa. Raimundo Cruz Souza integrava o grupo de homens que moravam com a autoridade religiosa. A maioria deles acompanhava o clérigo há mais de uma década, desde quando dom José Ronaldo era titular da Diocese de Janaúba. Na pequena cidade mineira, 15 “filhos” passaram a ser malvistos após se envolverem em brigas, furtos, assaltos e tráfico de drogas. Um deles chegou a assaltar uma ministra dentro da Igreja.
Em 21 de fevereiro de 2017, um dos apadrinhados de dom Ronaldo registrou ocorrência na 2ª Delegacia Distrital de Polícia de Formosa. Tido como braço direito do religioso, o homem ganhou emprego no setor administrativo da Catedral Nossa Senhora da Imaculada Conceição. Além de auxiliar nos trabalhos burocráticos, cabia ao “filho” fazer as compras da entidade.
No Registro Policial nº 2274386, ao qual o Metrópoles teve acesso, Raimundo narra que alguém falsificou sua assinatura e usou mais de R$ 4 mil para adquirir produtos em um mercado do município goiano, situado a cerca de 100km de Brasília. Entre os itens, havia uísque e cerveja. Segundo o jovem, apenas ele, o bispo dom José Ronaldo, e o secretário da cúria, Guilherme Frederico Magalhães – também alvo da Caifás –, tinham a senha do cartão e o número de um código para validar as transações nos estabelecimentos.
“Gastaram R$ 4 mil em janeiro (de 2017) com compras que não foram feitas para a Igreja”, disse Raimundo, em depoimento. O caso foi tipificado como estelionato, crime previsto no artigo 171 do Código Penal Brasileiro (CBP). Nove dias depois, o “filho” do bispo voltou à unidade policial e pediu a retirada da queixa. Ao justificar a decisão, alegou que, “por trabalhar na instituição”, prefere “evitar qualquer tipo de escândalo”.
Apesar de Raimundo ter voltado atrás, o inquérito avançou. Fontes ligadas à Igreja contaram que dom José Ronaldo ficou furioso com a denúncia feita por um de seus protegidos. Ele teria coagido o rapaz a desmentir seu próprio depoimento à polícia, mas como a investigação permaneceu em curso, o líder da Diocese de Formosa demitiu o jovem do emprego e o expulsou da cidade.
A diligência foi remetida para a Subdelegacia de Cabeceiras (GO), distante 140km do DF. Conforme informou a unidade policial, todas as partes foram ouvidas, o inquérito concluído e enviado ao Ministério Público de Goiás (MPGO) em 21 de março deste ano. O promotor responsável pelas investigações da Caifás, Douglas Chegury, disse esperar que o documento chegue até suas mãos para que ele possa “analisar se será oferecida denúncia contra o responsável indiciado pela Polícia Civil”.
Os investigadores querem saber quem falsificou a assinatura de Raimundo. Segundo contou um policial, pairam suspeitas sobre dom José Ronaldo. “O bispo controlava a senha e o código. É possível que ele tenha usado as informações para comprar itens estranhos à Igreja. Caso alguém descobrisse o esquema, ele ficaria isento, pois não teria nada de anormal registrado em nome dele”, disse a fonte, sob condição de anonimato.
Operação Caifás
O bispo e outros religiosos foram detidos em 19 de março, no âmbito da Operação Caifás, deflagrada pelo Ministério Público de Goiás, com o apoio da Polícia Civil do estado. Entre os encarcerados, estão o monsenhor Epitácio Cardoso, além dos padres Moacyr Santana e Mário Vieira de Brito. Os advogados deles já impetraram habeas corpus em várias instâncias da Justiça, mas tiveram todos os pedidos negados até a última atualização deste texto.