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Empresa vai indenizar homem trans por não chamá-lo pelo nome social

Instituição financeira terá de indenizar a vítima em R$ 10 mil e corre o risco de ser multada caso não corrija o erro no sistema cadastral

atualizado

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1 de 1 Cartão - Foto: Gui Prímola / Metrópoles

A Justiça do DF condenou a Porto Seguro Cartões a indenizar um homem transexual por não reconhecer o nome social do cliente, morador da capital federal. A vítima realizou tratamento hormonal e trilhou todo caminho jurídico em busca dos documentos para conseguir ser reconhecido como homem trans. Apesar disso, sem explicações ou aviso prévio, a operadora voltou a chamá-lo pelo nome antigo, chegando a tratá-lo como “senhora”.

Em busca de reconhecimento e respeito, o homem entrou com uma ação judicial. Em 28 de maio deste ano, o Tribunal Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) condenou a Porto Seguro Cartões, em 1ª instância, a pagar a indenização de R$ 10 mil à vítima, por danos morais.

O Metrópoles entrevistou o cliente, mas a pedido dele sua identidade será preservada. Tanto para evitar eventuais perseguições preconceituosas, quanto para resguardar a intimidade da própria família.

“Sou um homem transgênero, transexual. Me compreendi como uma pessoa trans com quase 40 anos. Então isso foi uma questão para mim. Foi um processo intenso. A partir do momento em que eu fui aceitando a minha realidade, aceitando minhas questões de transexualidade, fui ficando mais feliz, menos adoecido. Eu era uma pessoa que vinha muito adoecida”, contou.

A princípio, ele não vivenciou problemas com a instituição financeira. Cliente de longa data, tinha os pagamentos em ordem. Mas durante uma viagem, a entidade deixou de reconhecer a identidade de gênero do cliente, o que passou a ser um pesadelo para ele.

Constrangedor

“Não sei foi algo no sistema, não sei o que aconteceu. Eles retomaram todo o nome antigo, do dia para noite, todo o meu o registro”, lamentou.

“Foi constrangedor. Eu estava de férias com outras pessoas”, relembrou. Quando ele foi fazer um pagamento o “nome morto” apareceu. “E alguém que estava segurando para mim [a máquina] olhou, estranhou. Foi horrível”, afirmou.

O homem, então, entrou em contato com o banco. Segundo o relato, inicialmente a instituição insinuou o registro de nome errado no Cadastro de Pessoa Física (CPF). Depois aventaram a possibilidade de ele não ser o titular da conta.

Desgaste emocional e familiar

Mesmo diante das explicações, o problema não foi resolvido. A situação chegou ao ponto de dificultar, inclusive, pagamentos.

“Só de pensar em ligar para operadora eu tinha crise de ansiedade”, afirmou. A fatura do cartão era encaminhada para a casa da mãe dele. “Estava chegando com o meu nome até então. E quando isso mudou foi tão constrangedor. Porque tem sido um processo de aceitação muito difícil com a minha família”, desabafou.

“É como se alguém fosse lá e dissesse: realmente vamos invalidar junto com a família essa identidade”, argumentou. Sem solução, ele decidiu entrar na Justiça. Segundo o homem, a instituição se recusou a devolver todas gravações.

Aviso

Para o autor da ação, a sentença foi um grande aviso. “Contra descaso contra as identidades transexuais, dessa inviabilização da nossa existência, das violências estruturais que a gente sofre. Isso não dá mais. As pessoas precisam ser vistas nas suas peculiaridades, nas suas subjetividades”, ponderou.

Pessoas transexuais enfrentam dificuldades no acesso ao mercado de trabalho e aos estudos. “Eu espero que as instituições se sintam menos encorajadas a serem tão displicentes e violentas. Espero desencorajar as instituições a fazerem o que fazem tanto com homens, mulheres trans, travestis e outras da sigla LGBTQIA+“, assinalou.

Orgulho LGBTQIA+

Na Justiça, o homem foi representado pela advogada Mônica Santos e pelo advogado Rafael Lima. Segundo a defensora, o caso tem um peso simbólico. “Estamos no mês em que é celebrado o Orgulho LGBTQIA+. Portanto, a decisão é muito mais importante pela mudança de consciência do que pela efetiva indenização. Ela prestigia as pessoas que lutaram e ainda lutam pelo direito de ser, amar e de existir, e de usar o próprio nome”, pontuou. Em relação à decisão do TJDFT, ainda cabe recurso.

Confira a sentença:

1. CONDENAR a parte requerida na obrigação de alterar o nome da parte requerente perante os cadastros cadastrais da ré, a fim de constar o nome alterado conforme o Provimento 73/2018 do CNJ, e, por conseguinte, alterar o nome de tratamento da parte autora na emissão de faturas, documentos e em quaisquer outras as comunicações com a parte requerente, sob pena de multa, que fixo em R$ 10.000,00 [dez mil reais], por mês de descumprimento, limitada a R$ 30.000,00 [trinta mil reais].

2. CONDENAR, a parte requerida ao pagamento de R$ 10.000,00 [dez mil reais], título de danos morais, corrigida monetariamente desde o arbitramento [súmula 362 do STJ], conforme índice do INPC, acrescidos de juros de 1% [um por cento] ao mês, contados desde o fato danoso [súmula 54 do STJ]. 

Outro lado

O Metrópoles entrou em contato com a Porto Seguro. Segundo a empresa, houve falha humana no caso. A operadora não pretende recorrer da sentença, a princípio.

Leia a nota da empresa na íntegra:

Esclarecemos que, apesar do cliente ter recebido seu cartão de crédito constando o novo nome, houve falha humana na Central de Atendimento ao realizar tratativas com o cliente utilizando o nome antigo.

A companhia aguarda o recebimento da intimação por parte da Justiça e informa que não pretende recorrer da decisão.

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