Em 2018, sete administrações não gastaram nem R$ 1 em infraestrutura
Levantamento feito pelo Metrópoles mostra que em outras 12, os aportes para essa finalidade não chegaram a 10% do orçamento repassado
atualizado
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Não é preciso muito esforço para encontrar, no Distrito Federal, cidades tomadas pelo mato alto, vias esburacas, bocas de lobo entupidas e lixo em locais inadequados. Tais problemas poderiam ser minimizados caso as administrações regionais (RAs) fossem mais eficientes e direcionassem melhor seus recursos.
Levantamento feito pelo Metrópoles com base em informações colhidas no Portal da Transparência do DF aponta que as RAs têm histórico de investimento irrisório em urbanismo. Neste ano, em sete delas, não houve um só real gasto em infraestrutura. Em outras 12, os aportes para essa finalidade não chegaram a 10% do orçamento repassado.
O resultado da baixa execução orçamentária em serviços que impactam a vida da população pode ser sentido no dia a dia.
Em 2018, algumas RAs se limitaram a pagar salários de servidores e promover eventos culturais. As unidades do Jardim Botânico, Lago Norte, Lago Sul, Núcleo Bandeirante, Park Way, Sobradinho II e Sudoeste/Octogonal não destinaram recursos para a área de urbanismo.
O bairro mais nobre da capital do país, o Lago Sul, por exemplo, recebeu repasses da ordem de R$ 3.386.965 até o dia 23 de novembro, mas usou 3.177.984 só para quitar os proventos dos cerca de 120 servidores. O resquício está lançado na contabilidade como “encargos pessoais”.
Incoerência
Os números do Núcleo Bandeirante também contribuem para reforçar um clichê: de que as administrações regionais só funcionam como cabide de emprego. A cidade que abrigou os operários da construção de Brasília torrou R$ 4.529.998,35 em 2018. Desse total, destinou R$ 5.575 para a realização de eventos culturais. Por outro lado, não destinou nenhum centavo à realização de serviços de infraestrutura.
A incoerência na utilização do dinheiro público também se aplica às maiores cidades. Com 258 mil habitantes, Samambaia figura como a quarta mais populosa região administrativa do DF. Numa breve volta pela localidade, é possível observar toda sorte de problemas. Mesmo assim, os serviços de infraestrutura significaram somente 0,13% do total de R$ 8,1 milhões gastos pela administração regional.
Na vizinha Taguatinga, o cenário não é muito diferente. Considerando os 326 dias de 2018 – até 23 de novembro –, a administração aportou somente R$ 523,79 por dia na melhoria de serviços à população. Dos R$ 12.891.606,94 recebidos, insignificantes R$ 170.456,87 acabaram, de fato, se transformando em benefícios.
A destinação diminuta para áreas essenciais se reflete em cenas que o brasiliense se acostumou a assistir. No último dia 20 de novembro, por exemplo, o Corpo de Bombeiros precisou interditar o trânsito na via de ligação Taguatinga-QNL, ao lado do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai).
Segundo a corporação, várias depressões e rachaduras surgiram na pista. Em um dos pontos, abriu-se uma cratera, que só foi tapada dois dias depois. No Gama, onde a RA destinou só 7,68% aos serviços públicos, a chuva forte arrancou parte do asfalto, invadiu lojas e chegou a arrastar um motociclista na rua que fica às margens da Quadra 32 do Setor Leste.
Gerente de uma borracharia, o comerciante Antônio Geraldo Pereira, 56 anos, disse que, devido à força das águas, algumas pessoas desviaram seus veículos e desceram dos automóveis à procura de abrigo no estabelecimento. O local chegou a ser invadido pela água.
“É a primeira vez que vejo algo assim acontecer. Acredito que tenha sido a força da natureza somada ao fato de que aqui não tem escoamento. Ficou parecendo um rio. Muitas pessoas ficaram assustadas”, relata.
A situação nas cidades só não é pior em razão da Companhia Urbanizadora da Nova Capital (Novacap), que faz praticamente 100% dos serviços de tapa-buraco e poda de árvores, que poderiam ser divididos com as RAs.
Veja alguns exemplos nas imagens abaixo:
Em nota, o GDF informou que investimentos em obras de urbanismo e infraestrutura nas regiões administrativas são feitos pelas secretarias, empresas públicas e autarquias. “As administrações regionais, até por recomendação dos órgãos de controle, fazem a gestão de pequenos valores para manutenção e pagamento de pessoal.”
Ibaneis quer mais concursados
Ao se eleger governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB) assegurou que irá trabalhar para que 70% dos cargos públicos sejam ocupados por funcionários efetivos. A tarefa exigirá coragem para pôr fim à uma cultura já enraizada na capital: de os políticos usarem a nomeação de cargos em comissão para conseguirem favores.
O Metrópoles mostrou em janeiro último que, nas 31 administrações regionais, o menor índice de comissionados é de 74,51%, registrado em Vicente Pires. No Cruzeiro, 95% das vagas na RA são ocupadas por pessoas que não passaram em concurso público.
Professor de finanças públicas da Universidade de Brasília, Roberto Piscitelli defende que as unidades sejam descentralizadas para se tornarem mais eficientes. Segundo ele, o atual modelo contribui para gastos exorbitantes e retornos inexpressivos à população.
“Com uma profunda descentralização, os administradores responderiam mais rapidamente a pequenas demandas, pois teriam autonomia para gerir um suborçamento definido para atividades específicas. Do jeito que está, só serve como cabide de emprego mesmo. São praticamente inúteis”, analisa o docente.