O que explica o DF eleger opostos como Fábio Felix e Bia Kicis? Entenda
DF elegeu para distrital o candidato de esquerda Fábio Felix em primeiro lugar. Já para federal, a mais votada foi Bia Kicis, de direita
atualizado
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Nesse domingo (2/10), o Distrito Federal elegeu deputados distritais e federais com orientações políticas extremamente opostas. De esquerda, Fábio Felix (PSol) foi o distrital reeleito com maior quantidade de votos na história da Câmara Legislativa do DF (CLDF). Do outro lado, brasilienses escolheram em primeiro lugar a candidata de direita Bia Kicis (PL-DF) para permanecer na Câmara dos Deputados.
Primeiro deputado da CLDF assumidamente gay, Felix é casado com o publicitário Leonardo Domiciano, 29 anos. Nesse domingo ele se tornou o parlamentar mais votado para a CLDF. Com 100% das urnas apuradas, o candidato do PSol somou 51.792, quantidade que representa 3,10% do total dos votos válidos.
Já Bia Kicis é apoiadora do presidente Jair Bolsonaro (PL) e atual presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara federal. A parlamentar foi reeleita com o maior número no favoritismo, obtendo 214.733 votos e atingindo o quociente eleitoral do partido sozinha.
O Metrópoles conversou com cientistas políticos que analisaram motivos para o DF eleger candidatos tão opostos para a Câmara Legislativa e para a Câmara dos Deputados.
A esquerda em um DF conservador
A doutora em ciências políticas pela Universidade de Brasília (UnB) Marcela Machado entende que Fábio Felix conseguiu atrair para si a maior parte dos votos da esquerda no DF, mesmo em meio a um eleitorado brasiliense de maioria conservadora. “Ele teve 51 mil votos, que é uma votação massiva para distrital, mas que nem chega perto da votação da Bia Kicis em uma unidade da federação que deu votação expressiva para o Bolsonaro em todas as regiões – e que elegeu a Damares com maioria dos votos em todas as zonas”, acrescenta.
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“Isso mostra que o distrital mais votado conseguiu canalizar a voz da esquerda, mesmo o DF tendo reeleito o atual governador contra um candidato de oposição expressamente apoiado por Lula”, assinala a doutora.
Já os votos da direita acabaram se dividindo entre mais distritais conservadores. “O PL, por exemplo, elegeu quatro. Não teve uma figura gigante, mas conseguiu quatro cadeiras, mesmo não concentrando em uma figura só”, pontua Marcela.
“Entregaram o que propuseram”
Para o advogado e cientista político Nauê Bernardo Azevedo, ambos os deputados entregaram aos seus eleitores aquilo o que propuseram no atual mandato. “A democracia é feita de dissonâncias, contradições. Então, da mesma forma que fico espantado, vejo com naturalidade esse tipo de resultado. São eleições com presenças diferentes, que tem a ver como cada um tocou seu mandato”, comenta.
“Bia Kicis fez aquilo que ela disse que ia entregar ao seu eleitor: cumpriu o que propôs. E o Fábio também. Então, foram pessoas eficientes em seus mandatos”, completa Nauê.
Segundo o especialista, as eleições de 2022 mostram que a população freou o desejo de renovação que havia se manifestado em 2018. “Em 2018, a população elegeu muita gente que não compreendeu o próprio papel e a tendência neste ano foi de as pessoas jogarem seguro e votarem em quem sabiam que iria entregar algo”, avalia.
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Nauê considera difícil comparar as câmaras distrital e federal, uma vez que “são dimensões diferentes”. “Na Câmara dos Deputados, o olhar é geral, uma macroanálise. Já a distrital é o campo do micro, do debate voltado para quem está mais próximo do eleitor. É quem vai ver um buraco na rua, problemas mais locais. Então a efetividade dos discursos muda muito”, explica.
“E a gente nunca pode esquecer que existem pessoas que fazem uma salada ideológica em seus respectivos votos. Pode ser fator religioso, fator mais racional, ou querer alguém que está ao lado do governo aqui ou outro que é antagonista ao governo lá”, acrescenta o cientista político.
Federações impactam nos votos
Para o advogado especialista em direito público Beethoven Andrade, nem sempre o voto do cidadão para distrital está alinhado com aquele para governador ou presidente. Outro ponto a ser considerado é que a atual legislação eleitoral, com a formação de federações, modificou os parâmetros para que um candidato alcance o cargo ao qual concorre.
“Podemos identificar que a expressiva votação para a candidata mais votada (Bia Kicis) se dá por sua proximidade com o presidente Bolsonaro, mas não se pode distanciar do avanço das pautas conservadoras, em que os eleitores do Distrito Federal, em sua maioria, vêm se alinhando”, pontua.
Ele observa que, por outro lado, a deputada Erika Kokay (PT) se mantém como uma das mais votadas para federal, também superando a votação de 2018. “A Federação Brasil da Esperança (PT/PCdoB/PV) conseguiu duas vagas, e quase garante por média o mandato de Ruth Venceremos, que perdeu a vaga para Rafael Prudente já nas últimas urnas apuradas.”
“A possibilidade de federação e proibição de coligações para eleições proporcionais, além da limitação de candidaturas aos números de vagas disputadas, acrescido de um, acabou por reduzir o número de candidatos. Por isso, o que veremos a partir dessas eleições é a concentração de votos em determinadas campanhas, como ocorreu com Bia Kicis, Fred Linhares (Republicanos) e Erika Kokay”, explica o especialista.
Na outra ponta, a candidatura para a CLDF demonstra uma segunda realidade. No entendimento de Beethoven, ainda que o avanço de pautas conservadores se replique em âmbito distrital, há uma concentração de votos em candidatos com pautas mais específicas. “O deputado Fábio Felix teve a votação mais expressiva da CLDF, superando todos os marcos históricos, com pautas contrárias ao conservadorismo. Para muito além disso, soube fazer uma boa campanha”, destaca.
Veja abaixo os eleitos para distrital e deputado federal pelo DF, respectivamente: