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“Ele continua livre para agredir”, diz vítima de diplomata demitido

Metrópoles ouviu a mulher que denunciou Renato de Ávila Viana, demitido nesta quinta-feira (20/9), após agredi-la e feri-la

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Rafaela Felicciano/Metrópoles
bianca, renato ávila, diplamata agressor
1 de 1 bianca, renato ávila, diplamata agressor - Foto: Rafaela Felicciano/Metrópoles

Uma mulher negra, jovem e da periferia contra um homem branco, rico e resguardado pelo status de diplomata. Assim Bianca* define a batalha que enfrentou em busca de punição para o ex-namorado, Renato de Ávila Viana, demitido do Itamaraty nesta quinta-feira (20/9), conforme noticiou o Metrópoles, após processo administrativo interno aberto no Ministério das Relações Exteriores (MRE) e motivado pela denúncia de agressão feita por ela.

“Eu gostaria de me sentir feliz, pois isso é uma vitória gigante para toda a sociedade, em especial para todas as mulheres desse país. Quando o denunciei, eu estava completamente sozinha, a advogada dele gritou comigo durante a audiência em que prestei meu depoimento no MRE. Tudo isso já me causou e ainda causa uma dor inexplicável”, desabafou.

Bianca sabe que a demissão de seu agressor dos quadros de uma das carreiras para imponentes no serviço público é importante. Mas reconhece que ainda tem um longo caminho a percorrer. O processo criminal está em fase final e a sentença deve sair em um mês. Ela é a quarta mulher de sua família a sofrer agressão de um companheiro. E espera ser a primeira a ver o autor do crime punido pela Justiça.

O que verdadeiramente eu sinto neste momento é muita tristeza e angústia. Esse homem já foi preso em flagrante, em mais de uma oportunidade, e é deveras assustador perceber que ele continua solto e livre para agredir, violando a integridade física e psicológica de mulheres. O Estado está sendo conivente com o comportamento criminoso e reiterado dele

Bianca

Nessa quarta (19), Renato foi detido após vizinhos ouvirem gritos de socorro da atual namorada dele, em um apartamento na 304 Norte. De acordo com os policiais, a vítima apresentava vários ferimentos nos braços.

Rafaela Felicciano/Metrópoles
Bianca não quis mostrar o rosto: “Estou refazendo a minha vida”

 

Para ela, agredir mulheres deveria ser crime inafiançável: “Eu permaneço sonhando com o dia em que prisão não seja só lugar para preto, pobre e favelado. Será que ele precisará matar alguém para sair de circulação?”

Veja depoimento enviado por Bianca ao Metrópoles nesta quinta (20/9):

 

 

Em 17 de dezembro de 2017, o Metrópoles mostrou o envolvimento de Viana em episódios de agressão contra mulheres. Na ocasião, Bianca disse ter perdido o dente da frente ao ser espancada pelo então namorado, Renato de Ávila Viana, de acordo com ocorrência registrada na Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (Deam). “Ele estragou o meu riso”, afirmou.

Bianca teve de colocar um dente provisório por não ter condições de pagar por um implante. O tratamento ortodôntico foi orçado em R$ 56 mil, pois houve entortamento da mordida e outros danos. Ela entrou na Justiça, em janeiro de 2017, para que Renato Viana arcasse com as despesas.

Em 18 de novembro de 2016, Bianca e Viana brigaram em um motel de Brasília. Eles conversavam sobre a possibilidade de reatar a relação, marcada por abusos e ocorrências policiais. Ela relatou ter se recusado a voltar, então ele a agrediu com chutes e uma cabeçada na boca. Funcionários do estabelecimento constam como testemunhas no processo que corre na Justiça.

Não foi a primeira vez que Bianca registrou uma ocorrência contra o diplomata. Em outra ocasião, ele a agarrou pelos seios, deixando-os roxos, e lhe causou diversos hematomas nos braços, pernas e pescoço, como mostra o laudo do Instituto Médico Legal (IML) incluído em outra ação pela qual o homem responde judicialmente. O crime ocorreu dentro do apartamento funcional ocupado pelo servidor, na 304 Norte.

Demissão
A demissão de Renato de Ávila Viana foi publicada no Diário Oficial da União (DOU) dessa quinta (19/9). Ele ocupava o cargo de primeiro-secretário. A medida é resultado de processo administrativo disciplinar (PAD) aberto após denúncias de Bianca. Conforme consta em ação judicial, o servidor do MRE arrancou o dente da companheira com uma cabeçada. O funcionário público poderá recorrer da decisão na Justiça.

O passado do servidor é marcado por denúncias de crimes. Ele já respondeu a três PADs na Corregedoria do Serviço Exterior do Ministério das Relações Exteriores, após registros de ataques a duas mulheres em outros países e a mais duas no Brasil. Em território estrangeiro, Renato Viana desfrutou da imunidade diplomática: as autoridades locais não puderam investigá-lo, precisando recorrer ao Itamaraty.

Veja a publicação no DOU:

DOU/Reprodução

 

Em 2002, investigou-se agressão do homem a uma terceira-secretária do MRE. A ação terminou arquivada com uma observação: o diplomata deveria controlar suas emoções e impulsos. No ano seguinte, Renato Viana envolveu-se em agressão a uma namorada brasileira, de quem levou uma facada durante briga em seu apartamento.

Outra sindicância, em 2006, apurou violência contra uma cidadã paraguaia. Junta médica avaliou Viana e concluiu que, do ponto de vista neurológico, ele estava apto para exercer suas funções. A punição foi apenas uma advertência.

“Evidenciou-se, ao exame psíquico, que o servidor apresenta traços de personalidade denotando certa instabilidade emocional, com forte investimento pessoal na área cognitiva, sem, contudo, configurar uma patologia psíquica. Desta forma, as reações emocionais reveladas pelo servidor não chegam a caracterizar, em termos psicopatológicos, alterações de comportamento significativas”, diz o laudo.

Em 2015, a Embaixada do Brasil em Caracas encaminhou ao MRE denúncia de uma venezuelana que alegava ter “sofrido ameaças, maltrato psicológico e tentativa de sequestro por parte de Renato de Ávila Viana”, como consta na sindicância à qual o Metrópoles teve acesso. A vítima enviou uma cópia da medida cautelar expedida contra o diplomata pela Divisão de Investigações e Proteção à Mulher da Venezuela.

A mesma investigação apurou comportamento agressivo do brasileiro em um evento no Instituto Cultural Brasil-Venezuela, quando ele agrediu verbalmente colegas e prestadores de serviços, durante uma festa após um jogo do Brasil na Copa do Mundo de 2014. O processo concluiu que não havia provas suficientes para puni-lo sobre a agressão à venezuelana. O servidor do Itamaraty ficou afastado das funções por 10 dias, pelo comportamento inadequado no evento diplomático.

Com esse histórico, Viana, que era primeiro-secretário, perdeu cargos de confiança no Itamaraty e foi alocado em uma seção conhecida como “depósito” de servidores, o Departamento de Assistência Administrativa e Operacional (Gaoa).

Prisão
Nessa quarta-feira (19/9), Renato foi detido após vizinhos ouvirem gritos de socorro da atual namorada dele, em um apartamento na 304 Norte. De acordo com os policiais, a vítima apresentava vários ferimentos nos braços. Autuado por dano ao patrimônio, desacato, lesão corporal e violência doméstica, Viana foi liberado horas depois de ser levado para a 5ª Delegacia de Polícia (área central). Ele pagou cerca de R$ 1 mil de fiança.

O Metrópoles apurou que Renato teria tido um ataque de ciúmes por causa de mensagens e ligações no celular da namorada. Ele teria jogado o aparelho no chão, agarrado a vítima pelos braços e a sacudido. Em seguida, ela teria se debruçado na janela e gritado por socorro.

Quando chegaram ao apartamento, os policiais teriam sido recebidos com xingamentos. Entres eles, “safados” e “vagabundos”. Como nem o diplomata nem a namorada abriram a porta, os PMs arrombaram o lugar com um pontapé.

“Ouvi os gritos e ela [a namorada] pedindo socorro, mas não sei quem acionou a polícia. Provavelmente foi um vizinho que viu a confusão”, disse um dos moradores do bloco onde o diplomata mora, que preferiu não se identificar.

Vídeo mostra momento da prisão:

 

Advogada de Viana, Dênia Érica Gomes Magalhães assegurou que o episódio com a namorada não envolveu violência doméstica. Tanto que o acusado pagou fiança e foi liberado, disse a defensora. Logo após ser solto, o diplomata foi visto no prédio. A reportagem interfonou três vezes para o apartamento dele, mas o sinal só dava ocupado.

Veja as imagens da prisão:

6 imagens
Entres eles, gritos de “safados” e “vagabundos”
Como nem o diplomata nem a namorada abriram a porta, os PMs arrombaram a entrada com um pontapé
De acordo com os policiais, a vítima apresentava vários ferimentos nos braços
Autuado por dano ao patrimônio, desacato, lesão corporal e violência doméstica, o diplomata foi liberado horas depois de ser levado para a 5ª DP (área central)
Ele pagou cerca de R$ 1 mil de fiança
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Ao chegarem no apartamento, os policiais teriam sido recebidos com xingamentos

Material cedido ao Metrópoles
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Entres eles, gritos de “safados” e “vagabundos”

Material cedido ao Metrópoles
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Como nem o diplomata nem a namorada abriram a porta, os PMs arrombaram a entrada com um pontapé

Material cedido ao Metrópoles
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De acordo com os policiais, a vítima apresentava vários ferimentos nos braços

Material cedido ao Metrópoles
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Autuado por dano ao patrimônio, desacato, lesão corporal e violência doméstica, o diplomata foi liberado horas depois de ser levado para a 5ª DP (área central)

Material cedido ao Metrópoles
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Ele pagou cerca de R$ 1 mil de fiança

Material cedido ao Metrópoles

 

Novo problema
Em março de 2018, Viana teve de se explicar novamente para a polícia. A moradora da Asa Norte Jobeniva Melo, 60, registrou ocorrência na 1ª DP (Asa Sul), na qual acusa o servidor do Itamaraty de manter a filha dela, de 35 anos e com supostos problemas psiquiátricos, em cárcere privado. Pela segunda vez, Jobeniva procurou ajuda policial por temer pela vida da familiar.

Após o registro da ocorrência, Viana esteve na Deam, ao lado da filha de Jobevina, para prestar depoimento. Na ocasião, a mulher, que não teve o nome revelado, negou as agressões.

Essa mesma vítima estaria com Viana nessa quarta (19/9). Ela não quis fazer exame de corpo de delito no IML, embora apresentasse lesões nos pulsos. Primeiro, disse ter sido agredida. Depois, mudou a versão. Ressaltou que pediu socorro porque estava com medo de ser espancada. Mas, como ele não a teria agredido, a mulher não quis representar contra o diplomata. O Metrópoles não conseguiu contato com a defesa do ex-servidor.

*Nome fictício, a pedido da vítima

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