metropoles.com

“Se deixar de funcionar como OS, o Cebraspe fecha”, diz reitora da UnB

Centro foi excluído do Enem e deve R$ 59 milhões à universidade. Mas Reitoria tenta ajudá-lo a manter credenciais de organização social

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
Daniel Ferreira/Metrópoles
reitora UnB Márcia Abraão Abreu
1 de 1 reitora UnB Márcia Abraão Abreu - Foto: Daniel Ferreira/Metrópoles

Ao ser a primeira mulher a assumir a Reitoria da Universidade de Brasília (UnB), em novembro de 2016, a geóloga Márcia Abrahão Moura sabia que enfrentaria muitos desafios à frente de uma das 10 melhores instituições de ensino superior da América Latina. Mas os meses de março e abril do ano seguinte seriam festivos, esperava: se dedicaria aos preparativos dos 55 anos da UnB (celebrados em 21 de abril).

O que a geóloga graduada pela universidade (o mestrado e o doutorado também foram pela UnB) e professora da instituição desde 1995 não imaginava era que teria de encampar a defesa de um dos considerados filhos nobres da UnB: o antigo Centro de Seleção e Promoção de Eventos (Cespe). Márcia Abrahão acredita que a crise vivida pela entidade pode levá-la a fechar as portas.

Em 2013, por força de um decreto da então presidente da República Dilma Rousseff, a entidade foi transformada em organização social (OS), credenciada junto ao Ministério da Educação (MEC) e rebatizada de Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação, Seleção e Promoção de Eventos (Cebraspe). A realização do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem) era a principal razão de existir do novo centro.

“Em março (segunda quinzena), fui chamada pelo professor Paulo (Paulo Henrique Portela de Carvalho, diretor-geral do Cebraspe), que me mostrou um documento do MEC recomendando que o Cebraspe não fizesse mais o Enem e que fosse descredenciado como organização social junto ao ministério”, lembrou a reitora, durante entrevista exclusiva ao Metrópoles.

Ali começava a via-crúcis da reitora e do diretor-geral do Cebraspe para reverter a recomendação da secretaria executiva do ministério. Cartas foram enviadas e reuniões agendadas tanto com representantes do MEC quanto do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep). O objetivo era manter o Enem com uma das bancas mais bem conceituadas do país e também garantir o próprio funcionamento do Cebraspe.

Em 6 de abril, a diretora de Gestão e Planejamento do Inep, Eunice Santos, informou ao Metrópoles que a decisão de excluir o centro da organização do Enem era irreversível. A nova banca ainda não foi confirmada pelo instituto, mas a Fundação Cesgranrio, que realizou o exame com a entidade brasiliense nos últimos dois anos, será mantida. O Inep decide ainda se agregará novas instituições à coordenação-geral do exame: as mais cotadas são as fundações Getulio Vargas (FGV) e Vunesp.

Risco de acabar
A exclusão foi um duro golpe para o Cebraspe: segundo Márcia Abrahão, sem o Enem, o centro perde 80% de sua receita. Mas pode ser ainda pior, caso termine sem as credenciais para operar como organização social.

“Não conseguimos manter o Enem, mas pedimos a suspensão de todo o processo de descredenciamento para que tentemos garantir a manutenção do Cebraspe como OS, afinal, não houve o descumprimento de nenhuma cláusula que motive um descredenciamento. Se deixar de funcionar como OS, fica inviável, fecha o Cebraspe. Mas ainda estou trabalhando para não perder o credenciamento.”

Márcia Abrahão Moura, reitora da UnB

Cessão onerosa
Márcia Abrahão Moura explica que, ao contrário do Cespe, o Cebraspe não é parte da Universidade de Brasília. O vínculo foi desfeito quando a entidade ganhou status de organização social.

“Como o Cespe era uma espécie de ‘departamento’ da UnB, o Conselho Universitário, estância máxima de deliberação da universidade, teve que aprovar sua transformação em OS vinculada ao MEC. No contrato de gestão assinado no ato de credenciamento e com validade até 2019, tanto UnB quanto Inep são apenas intervenientes”, explicou a reitora.

Na prática, isso significa que a universidade não tem qualquer ingerência sobre decisões e atividades desempenhadas pelo Cebraspe, embora indique o diretor-geral, com mandato de quatro anos, e integrantes do conselho da entidade. “Mas é como a relação de um filho, que ficou adulto, mas tem que andar com as próprias pernas. E nós, nesse momento, estamos trabalhando fortemente para manter o Cebraspe”, pontua Márcia Abrahão.

Reforço no pessoal
Mediante autorização do Conselho Universitário, a universidade repassou ao centro recursos humanos (cerca de 60 pessoas, entre professores e servidores, todos pagos pela UnB), marca e expertise antes pertencente ao Cespe/UnB.

“Em contrapartida, a UnB receberia uma taxa mensal, a partir de 2014, de 6% da receita líquida mensal do Cebraspe, pela cessão onerosa da marca. Não sei como chegaram a esse percentual, pois foi antes da nossa gestão. O que sei é que os repasses seriam iniciados em 2014 e só agora começarão a ser feitos”, diz Márcia Moura. Assim, a UnB tem R$ 59 milhões em retroativos a receber do Cebraspe.

Segundo a reitora, o centro e a universidade ainda não chegaram a um acordo sobre o valor a ser pago pelo espaço utilizado (o Cebraspe fica em terreno da UnB), maquinário e equipamentos cedidos também desde 2014. “De nossa parte, estamos em dia com nossas obrigações. Contratamos e pagamos o centro pela organização de nossas seleções, como o PAS (Programa de Avaliação Seriada) e vestibular, que acabamos de divulgar edital. Algumas são cobertas pelas taxas de inscrição, como as provas de habilidades específicas de música e arquitetura, mas o resto pagamos”, relatou.

Cobertor curto
Os valores ainda devidos pelo Cebraspe fazem falta. As universidades públicas do país têm amargado sucessivos cortes de orçamento, por imposição do governo federal. A nova gestão assumiu a UnB praticamente sem orçamento. A matriz orçamentária para a manutenção da instituição neste ano é de R$ 105,9 milhões — 43,7% menor do que em 2016, quando o valor foi R$ 188 milhões. Os investimentos também sofreram forte redução, de R$ 46,4 milhões em 2016 para R$ 24,6 milhões, neste exercício. A estimativa de déficit anual gira em torno de R$ 105,6 milhões.

Reitores de instituições federais de todo o país estão em contato com o MEC na tentativa de recompor o orçamento (a última reunião ocorreu semana passada), ao mesmo tempo em que fazem contas para decidir onde poupar. No caso da UnB, o arrocho só não é mais grave porque a instituição conta com recursos próprios, referentes a aluguéis de seus imóveis, terrenos e até horário em laboratórios e taxas cobradas por serviços prestados, como consultorias e acordos de cooperação, entre outros.

De acordo com a reitora, “a previsão de nossa própria receita neste ano é de R$ 100 milhões, R$ 30 milhões de investimentos e R$ 70 milhões de custeio”, detalhou. “Mas isso está sujeito a corte. Se arrecadarmos mais, o recurso fica retido com o governo federal. É como ter dinheiro no banco, mas não poder usar”, comparou Márcia Abrahão.

Concurso suspenso
O início de 2017 não tem sido tranquilo para o Cebraspe. Desde fevereiro, o Ministério Público de Goiás investiga possíveis fraudes no concurso para delegado de polícia realizado no estado. Funcionários da OS brasiliense, que organizou o certame, são suspeitos de ter envolvimento no suposto esquema de venda de gabarito.

Devido aos indícios de irregularidades, a seleção pública foi suspensa pela Secretaria de Planejamento de Goiás, por meio de decisão administrativa. Já o MP-GO pediu à Justiça o cancelamento do concurso.

Por meio de nota, o Cebraspe reiterou “a absoluta legalidade das atividades desenvolvidas por este centro” e reforçou que “não há, nem nunca houve, qualquer ilegalidade em suas atividades”.

“Além do amparo jurídico sobre a regularidade das ações desenvolvidas, o centro ainda trabalha contínuas iniciativas para buscar melhorias e inovações, a fim de que a organização social esteja operando sempre com as melhores práticas de gestão existentes, em todas as suas esferas de atuação”, disse a nota, publicada em 9 de abril.

Sobre a perspectiva de não ter condições de se manter com a retirada do Enem, o Cebraspe ressaltou que “possui, hoje, aproximadamente 80 contratos para a execução de seleções, avaliações e certificações, que garantem, com tranquilidade, a estabilidade desta organização”.

Compartilhar notícia

Quais assuntos você deseja receber?

sino

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

sino

Mais opções no Google Chrome

2.

sino

Configurações

3.

Configurações do site

4.

sino

Notificações

5.

sino

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comDistrito Federal

Você quer ficar por dentro das notícias do Distrito Federal e receber notificações em tempo real?