Escola interditada há 4 anos na Estrutural prejudica estudantes
A Escola Classe 01 está desativada desde 2012, quando foi interditada por conta do forte cheiro de gás. Com isso, estudantes foram deslocados para unidades no Guará e no SIA, o que contribuiu para a evasão escolar. Desde então, não há plano de recuperar o colégio
atualizado
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Quase metade da população da Estrutural (45,21%) não tem sequer o nível fundamental completo, segundo a Pesquisa Distrital por Amostra de Domicílios (PDAD) de 2015. Apesar de alarmante, o dado não é surpreendente, uma vez que a região é uma das que têm menor poder aquisitivo na capital federal. O que espanta mesmo é a falta de vontade política em reverter a situação. Um exemplo do descaso do poder público pode ser visto na prática. A Escola Classe 01, que atendia mais de 500 alunos da região administrativa, está interditada há quatro anos.
Para aprender a ler e escrever, as crianças precisam ir até outras localidades, como o Guará e o Setor de Indústria e Abastecimento (SIA). São pelo menos seis quilômetros de distância, que contribuem para a evasão escolar. O prédio onde funcionava a escola está abandonado desde 2012, cinco anos depois de ser construído. Um forte cheiro de gás levou a Defesa Civil a determinar a interdição. Mas, até hoje, não há um laudo conclusivo sobre as causas do odor, que gerava enjoos nos alunos e nos professores. Ao que tudo indica, o problema teria sido causado pelo Lixão da Estrutural.
Desde então, os pais dos estudantes enfrentam dificuldades e dúvidas sobre o destino escolar dos filhos, que, para estudarem em outras regiões administrativas, precisam do transporte oferecido pelo governo, que também é precário e chegou a ser suspenso. Oito ônibus levam e trazem os alunos e o serviço exige um desembolso de R$ 103 mil mensais por parte dos cofres públicos.Segundo a Secretaria de Educação, em matéria publicada em sua página, com a interdição do colégio na Estrutural, a medida encontrada pelo governo foi dividir os 1,2 mil alunos matriculados na época em duas unidades – a Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação (Eape) e a Escola Classe 315 Sul, ambas no Plano Piloto, onde permaneceram até setembro do ano passado.
Na ocasião, a pasta reconheceu que a distância e as condições não adequadas, principalmente na Eape, contribuíam para a evasão escolar. A mudança para o SIA, mais perto, foi justamente para estimular os alunos a voltarem para a sala de aula.
Dificuldades
O problema, entretanto, continua. Mãe de Paulo Emanuel, 7 anos, e Paola, 2, a dona de casa Josileide da Cruz, 47, gasta pelo menos duas horas do dia para levar e buscar o filho até a praça central da Estrutural. O tempo inclui os minutos que eles ficam embaixo do sol esperando o transporte escolar oferecido pelo GDF. Como Paola é especial, nem sempre Josileide consegue chegar a tempo do embarque de Paulo. Quando isso acontece, há duas alternativas: pegar um ônibus normal ou ter que ver o filho faltar aula.
Eu me sinto impotente de olhar para a escola aqui na minha frente, abandonada, e eu enfrentando essas dificuldades.
Josileide da Cruz, mãe de aluno
A artesã Aline de Sousa, 29 anos, também reclama da distância que o filho João Victor Queiroz, 6, percorre todos os dias para estudar. Para ela, o mais difícil é quando ele fica doente. “Nem sempre tenho dinheiro para pegar ônibus e buscá-lo no colégio. É muito ruim saber que a escola está abandonada, que estão gastando com aluguel e não temos qualquer resposta do governo para saber se meu filho voltará a estudar perto de casa”, diz.
O Governo do Distrito Federal tem terrenos para construir uma nova escola na Estrutural, mas ainda não há prazo para que isso ocorra. Procurada pelo Metrópoles, a secretaria informou, por meio de nota, que o projeto está em elaboração. Enquanto não resolve o problema, a pasta gasta, em um ano, R$ 1.208.400 com o aluguel de um prédio no SIA, onde estão 730 alunos. É um edifício comercial de quatro andares, que teve a estrutura adaptada para receber os estudantes em 18 salas de aula.
O Sindicato dos Professores do DF (Sinpro) acredita que a distância da escola para a casa dos estudantes acarreta inúmeros prejuízos aos alunos.
O rendimento com certeza seria melhor se estudassem perto de casa, em uma escola definitiva e com estrutura física adequada. A demora para a solução desse caso da Estrutural contribui, e muito, para a evasão escolar. Em 2012, eram 1,2 mil aluno. Hoje, são pouco mais de 700.
Samuel Fernandes, diretor do Sinpro
Proposta
Integrante da bancada da educação na Câmara Legislativa, o deputado Reginaldo Veras (PDT) defende que crianças estudem perto de onde moram. Ele diz que acompanha a situação da Estrutural e cita um projeto do Instituto Federal de Brasília (IFB). “Como não será construída uma escola, diante da crise, o IFB fez uma análise para recuperar a que tem lá. No projeto, eles propõem que o GDF faça doações de aparelhos a eles. Em troca, o instituto faria a captação de todo o gás. Mas, até hoje, não houve um acordo entre o IFB e o GDF”, afirma.
De acordo com Veras, o valor para a compra dos aparelhos seria de R$ 800 mil. O Metrópoles procurou o IFB para comentar o assunto, mas não teve resposta até a publicação desta reportagem.
Transporte garantido
No começo deste mês, a Justiça garantiu o transporte escolar aos moradores da Estrutural que estudam nas escolas do Cruzeiro e do Guará. O juiz do Trabalho Gustavo Carvalho Chehab cassou a suspensão do serviço. A medida, segundo a decisão, visa evitar a evasão escolar, que pode ensejar o acirramento de conflitos e o aumento do trabalho infantil na região, na qual está localizado o maior lixão ativo da América Latina — tema que é alvo de ação civil pública do Ministério Público do Trabalho do Distrito Federal.
Segundo o magistrado, o problema não é a dificuldade do GDF em fornecer o transporte escolar, mas uma interpretação de que o Tribunal de Contas teria decidido priorizar o transporte público em detrimento ao escolar. O juiz Gustavo Chehab lembrou que estudos e diversos atores sociais são unânimes em apontar a dificuldade de acesso ao ensino como uma das principais causas do trabalho infantil.