Dupla jornada: delegado da PCDF é vereador em município de Goiás
Laércio de Carvalho Alves tem residência nas duas unidades da Federação e concilia a rotina na polícia com a atividade de parlamentar
atualizado
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O delegado-chefe da 35ª Delegacia de Polícia (Sobradinho 2), Laércio de Carvalho Alves (Patriota), tem uma rotina curiosa: divide a atividade de policial com a de vereador em Água Fria de Goiás, município do Entorno distante cerca de 150 km do centro de Brasília. Eleito em 2016, Dr. Laércio, como era chamado nas urnas, obteve 235 indicações e foi o segundo mais bem votado na cidade naquele ano.
Na Câmara Municipal, o delegado preside a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que apura “supostas irregularidades na emissão de licenças ambientais pelo município de Água Fria”. Mas conciliar as duas atividades nem sempre é fácil.
Na última quarta-feira (05/06/2019), por exemplo, Alves ouviria uma testemunha referente às apurações da CPI. A oitiva estava marcada para as 17h, na Casa. A reportagem ligou para a Câmara de Água Fria de Goiás entre as 17h e as 18h, mas foi informada pela atendente que o vereador não havia chegado ainda.
Alves justificou ao Metrópoles que foi à sede do Legislativo, mas o intimado não o esperou. “Inclusive, cheguei atrasado por conta do [outro] trabalho”, disse.
O titular da 35ª DP contou que tem residência nas duas unidades da Federação e garantiu que cumpre as duas funções integralmente. O delegado parlamentar disse ainda que não há incompatibilidade de horários, pois no dia a dia da PCDF não há rotina estabelecida e na Casa Legislativa de Goiás, as sessões são às 20h das terças-feiras.
“Tem dia que chego às 5h para uma operação e saio a hora que termina. A gente não tem um horário rígido e estabelecido. A polícia não trabalha como repartição pública comum. Atendemos as demandas conforme a necessidade”, assinalou. “Primeiro, cumpro as responsabilidades de polícia. À noite, vou cuidar dos afazeres de vereador.”
Perda de mandato
Atualmente, o parlamentar enfrenta pedido de perda do mandato feito pelo Partido Trabalhista Cristão (PTC). A solicitação é baseada em condenação em segunda instância por crime ambiental, conforme anunciado na sessão da Casa dessa terça-feira (04/06/2019). O vereador se defendeu na tribuna, dizendo tratar-se de perseguição.
À reportagem, Alves classificou como “embate político” o requerimento que pretende tirá-lo da Câmara. “Alguém acha que eu tenho uma boa projeção, aceitação dentro do município e consigo exercer o mandato com boa visibilidade e fica com ciúme, procurando motivo para polemizar”.
Para o delegado e vereador, o pedido também é motivado pela CPI a qual preside. “Esses temas giram em torno do inconformismo dessas pessoas que estão recebendo processo grave, de danos ambientais de alta monta”. Sobre a condenação, Alves argumentou que ainda está em fase de recurso.
Remuneração
Alves disse que é delegado da PCDF há 21 anos. Pela primeira vez, em 2019, o policial assumiu a chefia de uma delegacia. A nomeação dele como titular da 35ª DP foi publicada no Diário Oficial do DF (DODF) em 25 de janeiro.
Segundo mostra o Portal da Transparência do DF, ele recebeu R$ 17.459 líquidos referente a abril de 2019. Em outro contracheque, aparece a gratificação pela função de chefia, de R$ 2.447, já contabilizados os descontos obrigatórios. A reportagem não encontrou os dados de remuneração dos vereadores de Água Fria de Goiás.
Na Polícia Civil, Alves recentemente coordenou as investigações que levaram à prisão, por associação para o tráfico e venda de drogas, da mulher de um preso que comandava a venda de entorpecentes de dentro da cadeia em Planaltina de Goiás. Ele também foi responsável pela apuração referente ao feminicídio de uma jovem de 23 anos.
Legalidade
Questionado sobre a legalidade da ocupação dos dois cargos pelo funcionário público, o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) informou, em nota, que, “de acordo com o artigo 94 da Lei nº 8.112/1990, é permitido ao servidor acumular o mandato de vereador se houver compatibilidade de horário”.
A Subsecretaria de Relações com a Imprensa do GDF declarou que a Polícia Civil está analisando a situação. A PCDF, por outro lado, disse que há permissão constitucional para a situação de Alves. “Assim, a princípio, não há ilegalidade na acumulação das funções”, concluiu. A Controladoria-Geral do DF afirmou que não há manifestação a respeito do servidor.
O Ministério Público de Goiás não havia retornado contato até a última atualização deste texto.