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Do trote ao crime: ataque à UnB revela indústria das invasões a lives

Invasor que visa ofender pode responder a crime contra a honra e, em caso de ser feita em massa, ser enquadrado em formação de quadrilha

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O ataque com material pornográfico a uma palestra on-line na Universidade de Brasília apontou uma indústria que lucra com a invasão de lives. Em plataformas como TikTok, perfis divulgam vídeos com a reação das pessoas que ficam constrangidas em meio à interrupção jocosa e até agressiva que tem intuito de debochar dos demais participantes. Apenas uma das páginas tem mais de 4,8 milhões de visualizações totais.

A página, inclusive deixa fixada o passo a passo como fazer para encontrar uma live aberta e o que é necessário fazer para invadir. Em comentários, pessoas que acham engraçado o vídeo pedem para serem adicionadas a um grupo para receber os links das reuniões on-line.

As invasões ocorrem em lives de roda de oração, palestras, cultos e até mesmo em reuniões dos Alcoólicos Anônimos. Em cada situação, o modus operandi é o mesmo, mas a abordagem para chocar e constranger é diferente. Os invasores entram em algum grupo e começam falando no microfone frases desconexas, interrompendo a reunião. Nos encontros religiosos, eles colocam pentagramas, cenas de fogo fazendo alusão a inferno e representações de seres demoníacos.

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Plataforma ensina como invadir lives
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Em comentários, pessoas querem participar das invasões
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Publicação divulga o dia de uma live

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Em comentários, pessoas querem participar das invasões

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As páginas também não têm o menor pudor ao expor dependentes químicos em reuniões on-line dos Alcoólicos Anônimos. Os invasores participam desses encontros fingindo que também estão doentes para debochar da situação. “Estou sem beber corote há três dias”, diz um dos invasores em um dos vídeos. Na publicação, as pessoas riem da situação.

O rosto das pessoas foi borrado pelo Metrópoles por respeito a quem foi envolvido sem sequer ter o conhecimento da exposição.

Em rodas de conversa, os invasores passam trote fazendo comentários aleatórios no meio da apresentação das pessoas. Em um dos casos, um deles diz que o outro não pagou o carnê de uma loja. Nas palestras, é comum o uso de pornografia nas imagens. Foi o que aconteceu em Brasília, na apresentação “Road Movies em uma perspectiva de gênero”, que ocorreu em 28 de junho, Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+.

A professora responsável pela apresentação, Rose May Carneiro, abriu um boletim de ocorrência contra os invasores, que devem ser investigados na ação.

Crime

Quem pratica tais ações pode responder por crime contra a honra e pegar até 3 anos de reclusão. Em casos da ação ser feita em massa, com mais de três pessoas, os envolvidos também podem responder por formação de quadrilha, que resulta em até 5 anos de reclusão.

As ofensas também podem ser levadas para a área cível e terminar em indenização para as vítimas da ação.

Para o advogado Rafael Fernandes Maciel, especialista em Direito Digital e autor do livro Manual Prático sobre a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais”, a punição ocorre quando há o intuito de promover o ódio. “As pessoas dessas lives têm o interesse no constrangimento e podem ser responsabilizadas por isso”, alegou.

“Inclusive as pessoas que fazem comentários ofensivos podem responder por crime contra a honra”, completou. O especialista também reforçou a importância das instituições promoverem medidas de segurança para resguardar as pessoas envolvidas.

FBI

Na internet, com poucas palavras chaves, é possível encontrar grupos no Telegram que organizam os ataques em massa. Também encontros são feitos por meio do X, antigo Twitter, que avisam dias e links para entrar em lives abertas e começar a “trolagem” com os envolvidos.

As invasões se tornaram tão comuns durante e após e a pandemia que em 2020 o FBI, polícia federal dos Estados Unidos, alertou para o perigo do que chama “zoombing” (quando as videochamadas são sequestradas por hackers que veiculam vídeos pornográficos e insultos”. Na ocasião, o FBI notificou o Zoom – plataforma de reuniões on-line que deu origem ao nome da prática zoombing.

Em 2021, uma das vitimas desse tipo de ataque foi o então ministro Paulo Guedes, que estava em sala virtual de transmissão do encontro Diálogos com a Indústria, realizado pela Coalizão Indústria e contou com a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

Em nota da Agência Brasil, portal de notícias do governo federal, por pouco mais de dois minutos houve várias invasões na sequência em inglês e em russo. “Além dos áudios com vozes e músicas, que impediram a compreensão do que o ministro estava falando, os invasores exibiram vídeos pornográficos”, completou o registro.

Após também passar por uma invasão como essa, a Universidade Federal de Goiás (UFG) desenvolveu um protocolo contra o ataque cibernético em lives. Na ocasião, os invasores distribuíram xingamentos de cunho racista, com a intenção de encerrar as atividades do evento, conforme publicou a instituição de ensino superior.

Pornografia em palestra da UnB

Na quinta-feira (4/6), veio à tona o ataque em massa, que sequestrou a live e  divulgou pornografia ainda no início da apresentação. A professora contou que ficou abalada com a situação e que chorou após receber o ataque.

“Foi violento como entrar em casa e dar um tiro. Ali era a minha pesquisa, algo que eu tenho o maior amor e entraram de uma forma orquestrada para tentar calar”, declarou a docente. A professora destacou que a intenção era desestabilizar quando invadiram e que não teve condições emocionais de continuar com a apresentação.

A palestra foi organizada pelo Grupo de Pesquisa Gênero, Comunicação e Sociabilidade (Gecoms) que repudiou as ações dos hackers.

Professora da UnB chora após ataque com fotos pornográficas: “Brutal”

“Iniciativas de promoção da igualdade de gênero são sistematicamente atacados por grupos que utilizam as redes sociais para calar vozes dissidentes, desestruturar debates construtivos e boicotar avanços em prol da justiça social e igualdade de gênero”, destacou a publicação.

O grupo reforçou a importância de um ambiente seguro on-line em que esses ataques não aconteçam. “Não nos calaremos. Continuaremos a lutar por um mundo onde todas as vozes possam ser ouvidas, respeitadas e valorizadas, independentemente de gênero, orientação sexual, cor ou corpo”.

TikTok derruba conta

Após a reportagem entrar em contato com o TikTok sobre o perfil, a plataforma derrubou a página que divulgava os vídeos com os ataques. A rede social entendeu que o conteúdo infringia as diretrizes, com comportamentos ou declarações de assédio, degradação ou bullying.

Veja o termo de uso da plataforma.

Google

Responsável pelo Google Meet, o Google Workspace respondeu que oferece uma série de recursos e segurança para evitar os ataques. A plataforma orienta a :

“Não compartilhar links de reuniões publicamente, apenas com os participantes convidados.

Os organizadores podem criar e compartilhar, apenas com os convidados, uma senha de acesso à reunião: Isso dificulta a entrada não autorizada.

Denunciar atividades suspeitas: se algo parecer errado, denuncie para que possamos tomar as medidas adequadas.

É recomendado que a pessoa crie uma lista antes para os interessados em participar e envie por e-mail apenas ao grupo específico. Também é possível que o moderador da página controle o compartilhamento de conteúdo e o acesso aos microfones. O passo a passo de como agir está neste link”.

UnB repudia

Em nota, a Universidade de Brasília (UnB) informou que tomou conhecimento do caso pela imprensa e entrou em contato com a docente para prestar apoio e orientá-la a tomar as medidas institucionais cabíveis para a apuração dos fatos.

“A UnB sempre apoiará grupos de pesquisa da instituição, tais como o GECOMS, para que possam se posicionar livremente sobre qualquer tema de pesquisa. Somos uma instituição educadora, que realiza pesquisa de excelência e defende a liberdade de cátedra”.

De acordo com a instituição, é recomendável o uso das plataformas digitais oficiais para a realização das atividades acadêmicas, uma vez que elas oferecem ferramentas para o controle dos participantes das salas virtuais.

“A UnB repudia qualquer forma de violência, agressão ou comportamento inadequado, reiterando seu compromisso com os direitos humanos, pautado pelo respeito mútuo e pela ética”, concluiu.

 

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