Diretor da UnB é ameaçado após fechar praça usada por traficantes
O argumento para demolir a “Pracinha da FAU” foi a insegurança. No entanto, estudantes protestam contra o fim do espaço de convivência
atualizado
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A demolição da conhecida “Pracinha da FAU”, localizada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB), provocou reações de diversos tipos na comunidade acadêmica e fora dela. Pessoas ligadas ao diretor da FAU, Marcos Tadheu Magalhães, denunciaram que, desde a ação para acabar com a praça, no fim de fevereiro, ele vem sofrendo ameaças de morte.
Em redes sociais, internautas dizem que querem vê-lo morto e o chamam de fascista e autoritário (veja imagens abaixo). A Polícia Federal será acionada para investigar o caso.
Por outro lado, um grupo de alunos ouvidos pela reportagem reclama da ação e também diz sofrer ameaças. No caso dos estudantes, a pressão, segundo eles, é para obedecer as regras, sob pena de serem jubilados.
A confusão em torno do espaço de convivência começou com a reclamação de professores acerca da segurança deles em sala de aula. As informações são de que o local, construído há cerca de 20 anos, havia virado um ponto de tráfico de drogas e abrigo para moradores de rua.
Conforme o Metrópoles mostrou em reportagens publicadas ao longo dos últimos anos, a UnB acumula casos de violência que têm como pano de fundo o tráfico e o uso de entorpecentes em suas dependências.
Dois professores relataram, em cartas enviadas ao diretor da FAU, terem presenciado a entrada de usuários de drogas no meio de suas aulas no período noturno. Além disso, computadores, instrumentos de medição e outros equipamentos foram roubados da FAU após as grades serem quebradas. O prejuízo é estimado em R$ 15 mil.
“A praça era uma ameaça. Além disso, a porta que dá acesso ao Instituto Central de Ciência (ICC) foi fechada, pois 2 mil pessoas passavam por ali diariamente. Entre elas, estudantes e pessoas de fora também. Visualmente, parecia a cracolândia”, disse um dos professores da UnB, que pediu para não ser identificado.
Veja publicações na internet sobre a situação:
Informativo
Em circular sobre o tema, de 2 de março, data posterior à demolição, a direção da FAU fixou informativo nas portas das salas de aula. O documento afirma que as ações são para garantir a segurança dos alunos.
“Foi dado amplo conhecimento e ciência a esta comunidade sobre os problemas de segurança enfrentados pela FAU, informações estas veiculadas na Circular 43 de 6 de setembro de 2019, em reunião com os servidores realizada no Auditório da Faculdade de Arquitetura e em Reunião do Conselho da Faculdade de Arquitetura”, diz o documento.
Ainda segundo o informativo, “a Direção da FAU tem mantido constante contato com as instâncias responsáveis pela segurança e gestão dos espaços externos à Faculdade de Arquitetura e Urbanismo sobre a evolução do caso”.
Na circular, é mostrado, ainda, o pedido de autorização à Administração da UnB para demolir a praça e recuperar o jardim que existia na área. “Venho, muito respeitosamente, solicitar a Vossa Senhoria providências no sentido de recuperar integralmente o espaço de jardim externo do Instituto Central de Ciências, adjunto ao espaço físico que abriga a nossa Faculdade de Arquitetura e Urbanismo.”
O texto trata da recuperação pedindo a remoção “das pequenas intervenções em alvenaria e outros materiais, como muretas e pisos precários, fornos e o que parecem ser churrasqueiras e outros acréscimos de péssima aparência na atualidade”, descreve o pedido.
Cartas
As cartas dos professores da FAU foram anexadas ao pedido de demolição enviado à Administração da UnB. Nelas, os docentes afirmaram que a praça permitia “a aproximação e permanência de pessoas estranhas às atividades universitárias”.
Além disso, reclamaram da interferência que as atividades na praça provocavam nas salas de aula. “Geram conversas em voz alta, queima de ervas diversas, poluição sonora e do ar de forma a interferir seriamente nas aulas que ministro no subsolo desse mesmo trecho do ICC”, informa uma das cartas.
A outra carta afirma que “por diversas vezes tenho que parar as atividades de ensino para solicitar aos usuários de drogas que se retirem da área conhecida como ‘Pracinha da FAU’, que fica em frente à fachada leste da faculdade, uma vez que o mau cheiro provocado pela queima de ervas impede a realização de qualquer atividade nesse ateliê”, reclamou o docente.
Polêmica
Parte dos estudantes e o Centro Acadêmico da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (Cafau) se posicionaram contra a demolição da praça. Para eles, o ato ocorreu sem transparência, de maneira autoritária e retirou uma área de convívio dos alunos.
Nota do Centro de Ação Social em Arquitetura Sustentável questiona a ação. “A Universidade de Brasília perdeu um espaço público e
democrático. Durante o feriado de Carnaval, foram destruídas as construções da Pracinha da FAU. O espaço construído por inúmeras mãos, durante décadas, foi demolido, descaracterizado. E por que isso? Porque espaços democráticos são um risco para governantes/dirigentes déspotas”, diz o documento.
Veja:
Sobre a Pracinha da FAU-UnB… by Metropoles on Scribd
Universitários da instituição falam da dimensão afetiva que o espaço tinha. “É um espaço histórico e de alteridade, referência para a FAU e para UnB, além de um espaço simbólico de vivência”, lamentou uma das estudantes ouvidas pelo Metrópoles, que também pediu para não ser identificada.
Segundo ela, o fechamento do acesso, assim como das janelas, piorou a salubridade de toda a FAU, “tendo em vista o desconforto térmico ambiental que os alunos passaram com o fechamento das passagens de ar e ventilação”.
Veja fotos da construção do espaço:
Outro questionamento é a retirada de mobiliário não patrimoniado das dependências da FAU. A direção recolheu sofás, camas e micro-ondas que estavam no local. “Era o espaço que usávamos para descansar e esquentar comida. Tiraram nosso patrimônio sem nem sequer nos comunicar”, afirma outra estudante, que também preferiu não se identificar.
A justificativa da direção para a retirada é a sujeira dos móveis e a ocorrência de pragas, como piolho e sarna. Depois de recolher os móveis, a direção da FAU proibiu a entrada de objetos não patrimoniados.
Posição da UnB
Por meio de nota, a Administração da Universidade de Brasília afirmou que não foi formalmente notificada de ameaças sofridas pelo diretor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Entretanto, repudia quaisquer atos violentos ou de vandalismo praticados nos campi da instituição.
A UnB informou que a limpeza da área adjacente ao ICC Norte foi autorizada e as ações foram tomadas pela Prefeitura da UnB após pedido da direção da FAU. “Havia, na área, árvores frondosas, cujas folhas estavam causando entupimento de calhas no ICC.”
Além disso, a UnB enfatizou que “não compactua com nenhum tipo de prática ilícita e tem trabalhado para o aprimoramento de suas estratégias de segurança”, informou.
Entre as medidas colocadas em prática, após aprovação do comitê permanente para a gestão da segurança da UnB, está a instalação de 350 câmeras de segurança e a colocação de cadeiras elevadas nos estacionamentos.
A instituição ressalta que o campus Darcy Ribeiro é aberto e integrado à Asa Norte. “Há um posto da Polícia Militar nas proximidades do ICC Norte [local onde está a FAU]. Os agentes realizam rondas regulares e também são acionados pela segurança da universidade sempre que há necessidade”, destaca a nota.
Procurado pela reportagem, o diretor da FAU, Marcos Tadheu Magalhães, preferiu não se manifestar.