DF: Don Juan é investigado por propina quando trabalhava na Vara da Infância
Marcelo Neves teria cometido uma série de crimes na época em que foi agente de proteção da VIJ. Polícia Civil investiga o caso
atualizado
Compartilhar notícia
A Coordenação de Repressão a Fraudes (Corf) da Polícia Civil apura uma nova denúncia envolvendo o estelionatário Marcelo José Neves (foto em destaque), 39 anos. A especializada investiga se o Don Juan, acusado de aplicar golpes que somam R$ 2 milhões, cometeu crimes quando exerceu o posto de agente de proteção na Vara da Infância e da Juventude (VIJ) entre 2015 e 2017. Apesar de a função ser voluntária, o golpista cobraria propina de organizadores de festas e de outros eventos que eram fiscalizadas pelo comissariado da VIJ.
De acordo com a denúncia protocolada na Corf, o golpista teria formado um grupo entre integrantes do comissariado da Vara para visitar os eventos realizados em diversas cidades do DF. Ao vistoriarem o público frequentador e identificar adolescentes, ocorreria a extorsão cometida contra os organizadores das festas. Eles eram convencidos a pagar entre R$ 1,5 mil e R$ 3 mil para evitar a suspensão da festa e o início de processo na VIJ.
O Metrópoles entrou em contato com a VIJ para confirmar as informações apuradas pela Polícia Civil. De acordo com a Vara, Marcelo Neves não integra mais o quadro de agentes de proteção do órgão, tendo exercido sua última atividade voluntária no ano de 2017. Sobre os motivos da exclusão, a VIJ disse apenas que o golpista foi desligado. “O ato não vem motivado, é discricionariedade do juiz”, ressaltou, em nota.
A suspeita envolvendo Marcelo Neves se soma ao suposto rastro de golpes deixado pelo homem, que seduzia mulheres para ter acesso aos bens delas. Na última quinta-feira (19/09/2019), mais duas vítimas do estelionatário procuraram a Corf para registrar ocorrência. Uma delas é uma empresária, que preferiu não se identificar. Ela teria sofrido um golpe de Marcelo Neves, ainda em 2012, quando perdeu todos os equipamentos que eram usados em sua clínica de estética, em uma das quadras comerciais da Asa Norte.
Segundo a mulher, o suspeito seduziu sua sócia para conseguir ter acesso a uma série de informações particulares do estabelecimento, como o local onde era guardada a chave para abrir a empresa. “Ele se aproximou, pois era amigo do meu ex-marido, e disse que poderia nos ajudar com a burocracia da clínica. Ele começou ajudando aos poucos, até fazendo pequenas benfeitorias no imóvel e alugando alguns aparelhos que usávamos”, explicou, em entrevista ao Metrópoles.
De acordo com a empresária, em alguns meses ele começou a se relacionar com sua sócia, até conseguir informações privilegiadas. “Ele queria ter acesso às contas da clínicas, o que eu sempre neguei. Mas minha sócia ficou apaixonada, e isso facilitou a ação dele. Um dia eu cheguei para trabalhar e ele havia ‘limpado’ a clínica”, disse.
A vítima explicou que o golpista usou um caminhão para transportar todos os equipamentos, retirando, inclusive, os aparelhos de ar-condicionado da parede. “Quando ouvi o síndico do prédio falar que Marcelo esteve durante a madrugada na clínica, afirmando que estava fazendo uma suposta mudança para outro local, percebi que havia levado o golpe. Logo em seguida, ele desapareceu”, disse.
A empresária entrou na Justiça e conseguiu penhorar valores das contas do golpista, reavendo cerca de R$ 150 mil. No entanto, segundo ela, ainda faltam R$ 100 mil para que todo o prejuízo seja ressarcido. “Eu estava conduzindo esse processo na esfera cível, mas agora quero que ele seja responsabilizado criminalmente”, afirmou.
Fazenda
Outra vítima, representada por um advogado, também esteve na delegacia. De acordo com o advogado Paulo Cesar de Almeida Filho, a cliente dele é uma mulher idosa, que mora no Rio de Janeiro. Atualmente, com valores corrigidos, o prejuízo totaliza cerca de R$ 1,2 milhão.
“Minha cliente levou esse golpe do Marcelo em 2008, após ele se envolver amorosamente com uma das filhas dela. Em seguida, após conseguir a confiança da sogra, fez com que ela colocasse dinheiro em um fundo de investimento que nunca existiu. Logo depois, ele desapareceu”, contou à reportagem.
De acordo com o advogado, o processo já dura anos e só agora ele conseguiu identificar uma fazenda que estaria em nome do golpista. “As contas bancárias dele estavam sempre zeradas e não havia qualquer tipo de patrimônio no nome de Marcelo Neves. Apenas agora conseguimos identificar essa propriedade que fica no Pará. Vamos tentar bloquear essa fazenda para que minha cliente seja ressarcida”, ressaltou.
A operação
Durante a operação contra o Don Juan, deflagrada em 13 de setembro, os investigadores da Corf cumpriram mandado de busca e apreensão em um apartamento na Quadra 307 da Asa Sul, onde mora a mãe do suspeito, e na casa dele, na 705 Norte. Os policiais precisaram de um caminhão para transportar todos os produtos de luxo comprados pelo criminoso com o dinheiro de uma das denunciantes, que perdeu patrimônio avaliado em R$ 600 mil.
De acordo com as diligências, que correm em sigilo, Neves se aproveitou da vulnerabilidade da mulher, divorciada há pouco tempo, para seduzi-la. Com lábia afiada, o Don Juan convenceu a vítima de que era expert em operações do mercado financeiro, sendo um grande investidor. Em seguida, o estelionatário fez com que a vítima se desfizesse de carros, apartamento e joias. Assim, com o dinheiro, ela investiu em fundos supostamente administrados por Marcelo.
Durante o envolvimento com a vítima, até a mãe do fraudador se aproveitou da situação. Ambos usaram os cartões de crédito da mulher, provocando rombo de R$ 166 mil, e ainda realizaram empréstimos bancários que somaram R$ 54 mil. Depois que se apossaram do patrimônio, os golpistas alegaram que não havia nem mais um centavo no fundo. Assim, cortaram relações com a denunciante.
Segundo o delegado Miguel Lucena, a investigação está em andamento, em segredo, conforme despacho da Justiça. “Vamos continuar a apurar o caso, mas não podemos dar detalhes por conta da decisão judicial em manter o caso sob sigilo”, resumiu.
Confira bens comprados com o dinheiro do golpe e apreendidos pela PCDF:
Bebidas sofisticadas
Durante o cumprimento de busca, os investigadores recolheram dezenas de garras de vinhos sofisticados, uísques e espumantes de marcas famosas. Entre os rótulos, havia um vinho estimado em R$ 3 mil. Os policiais também apreenderam móveis, eletrodomésticos, perfumes e cosméticos importados, além de bolsas e carteiras de grife.
Todos os produtos foram transportados em um caminhão até as dependências do Departamento de Polícia Especializada (DPE). Os itens ficarão apreendidos até a conclusão do inquérito policial. Os investigadores pediram à Justiça a quebra dos sigilos fiscal e bancário do estelionatário. O objetivo é apurar o caminho percorrido pelo dinheiro da vítima.
Além disso, a polícia quer identificar outras mulheres que, supostamente, tenham caído no golpe de Marcelo Neves e perdido grandes quantias em dinheiro.
O suspeito, que segue solto, já tinha passagem pela polícia por aplicar golpe semelhante contra uma idosa. O Metrópoles tentou contato com o denunciado, mas não havia conseguido resposta até a última atualização da reportagem. Tampouco localizou algum advogado que seja responsável por representá-lo.