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Desigualdade no centro da capital: 36% dos moradores de rua do DF vivem no Plano Piloto

Hoje, existem mais de 2,1 mil sem-teto no DF. Apenas o Plano Piloto são mais de 780 pessoas em situação de rua

atualizado

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JP Rodrigues/Especial Metrópoles
Barracos de madeira
1 de 1 Barracos de madeira - Foto: JP Rodrigues/Especial Metrópoles

Em cima de uma prateleira improvisada com pedaços de madeira, uma pequena vasilha com arroz e três panelas vazias refletem a realidade de Maria Cruz de Oliveira, 44 anos. Mãe de 11 filhos e avó de nove crianças, a matriarca cria a família em barracos de madeira construídos no Parque da Cidade, no centro da capital federal, sob condições precárias.

Às margens do Cemitério Campo da Esperança, na Asa Sul, a família tenta sobreviver com o pouco que arrecada com a venda de materiais recicláveis. Eles, contudo, são apenas alguns entre as mais de 2,1 mil pessoas que vivem nas ruas do Distrito Federal atualmente, em ano de pandemia do novo coronavírus.

De acordo com a Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes), 2.181 pessoas declararam morar nas ruas do DF em outubro deste ano. No mesmo período de 2019, esse número era de 1.959. Isso significa que, em um ano, mais 222 informaram ter ficado desabrigadas no DF, um aumento de 11,3%.

Ainda conforme a Sedes, apenas o Plano Piloto reúne 36% do total da população de rua do DF: são 787 sem-teto na região.

Veja, abaixo, os números em cada região administrativa:

A pasta informou que “a população em situação de rua é flutuante”; por isso, trabalha com números mensais. Uma vez que os dados da secretaria são baseados apenas na quantidade de pessoas que se declaram sem-teto, os números reais podem ser maiores.

Somente no Setor Comercial Sul, vivem cerca de 100 pessoas, de acordo com o Instituto No Setor. Conforme avalia Felipe Velloso, diretor social da entidade, a quantidade de população de rua muda diariamente e, portanto, é provável que haja uma subnotificação.

Para ele, um dos principais problemas que leva esta população a permanecer nas ruas é a falta de opções de moradia oferecidas pelo governo. “Infelizmente, hoje, a gente não tem a oferta suficiente para a demanda que existe. O GDF deveria oferecer uma gama mais variada de modelos de alojamento. O que temos é uma opção que muitas vezes é pior do que a rua”, analisa.

“Eu acredito que a política pública de acolhimento é fundamental. Agora, ela só precisa ser pensada com maior variedade de modalidades de moradia para as pessoas se adequarem”, completa Felipe.

Luta por habitação

No local onde vive a família de Maria Cruz, caixas de papelão, lonas de plástico e outros materiais recicláveis se espalham por uma longa extensão de chão de barro. Basta um carro estacionar próximo ao local que as crianças correm em direção ao veículo, na expectativa de receber alguma doação de roupa, calçado, brinquedo ou comida.

Vivendo há mais de 20 anos no local, Maria conta que tentou residir em outros lugares, mas não vê segurança nas opções oferecidas pelo governo. “O albergue é muito ruim, não tenho como colocar as minhas filhas lá. Não vou levá-las para ficar com um monte de homens que não conheço. São locais perigosos”, comenta.

Natália Cruz de Oliveira, 27, é uma das filhas de Maria. Ela aguarda há meses em uma fila para conseguir um apartamento no Bairro Crixá, em São Sebastião. Mesmo com a documentação aprovada pela Companhia de Desenvolvimento Habitacional do DF (Codhab), a jovem está na posição 138 para garantir a residência.

“A gente sabe que logo o governo vem tirar a gente daqui de novo. Eles tacam o trator e derrubam tudo. Mas a gente não tem para onde ir”, lamenta.

Natália conta que, uma vez que a família não sabe ler nem escrever, a dificuldade de encontrar um emprego é grande. “Faltam alternativas para nós. É um problema da geração da minha mãe que chegou na da minha filha”, conta.

“Eu nunca tive condição de dar um presente de Natal para os meus filhos. Às vezes, eu tenho de ir para a rua pedir para me darem um saco de arroz. É constrangedor viver assim”, desabafa a jovem.

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Netos de Maria brincam no chão de barro
Maria e a família vivem no Parque da Cidade
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Crianças vivem no local sob duras condições

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Netos de Maria brincam no chão de barro

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Maria e a família vivem no Parque da Cidade

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Maria mostra vasilhas com poucos alimentos

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Fila recebeu mais 20 mil solicitações em apenas dois meses

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DF tem 83,3 mil pessoas esperando por atendimento socioassistencial

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Procurada, a Codhab informou que “o dossiê da Natália foi enviado à Caixa Econômica Federal e, agora, é necessário aguardar resposta da análise”.

Doações para o Natal

Do outro lado do Plano Piloto, centenas se espalham em puxadinhos de lona fixados em terrenos públicos. Próximo à Universidade de Brasília (UnB), na L4 Norte, mais de 10 barracas com famílias estão instaladas atualmente. Algumas dessas pessoas chegaram no último mês, na tentativa de arrecadar doações antes do Natal.

Moradora de Planaltina de Goiás, no Entorno do DF, Maria Mesquita, 58, montou a própria tenda no gramado da via pública, em outubro, com a filha, o genro e cinco netos. Ela está desempregada e tem poucas chances de conseguir doações na região onde mora. “Aqui é mais fácil de conseguir ajuda. Então, viemos tentar”, afirma.

“Estou com uma neta que precisa de um exame que custa R$ 1,3 mil, e não temos condições. Pretendemos ficar até o Natal, porque, assim, temos mais chances de receber ajuda”, ressalta.

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Eles pedem doações
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Famílias montaram árvore de Natal em frente às barracas

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Eles pedem doações

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Outro grupo de moradores se instalou próximo ao Deck Norte

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No Setor de Embaixadas Norte, próximo à Embaixada da Armênia, estão instaladas nove famílias. Para uma das moradoras do local, Helen de Souza, 23, “o governo não nos dá opções”.

“A gente vai ao Cras (Centro de Referência de Assistência Social), mas tem de dormir na porta para conseguir alguma ajuda e, ainda assim, sai sem nada.”

Conforme a irmã dela, Carolina de Souza, 26, a dificuldade em viver desabrigada ficou maior durante a pandemia. “Ficamos mais vulneráveis à doença. As doações que recebemos são poucas, então, está cada vez mais difícil”, detalha. “E, pior, é que não tem o que fazer. Eu não vou para albergue com a minha filha nunca. Prefiro viver na rua do que levar a minha filha para local de criminalidade”, enfatiza.

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Carolina de Souza e a filha, de 5 anos
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Família está instalada no Setor de Embaixadas Norte

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Carolina de Souza e a filha, de 5 anos

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O que diz o GDF

Procurada para comentar ações voltadas à população de rua do DF, a Sedes informou que, desde abril, mantém alojamentos provisórios no Plano Piloto e em Ceilândia para acolher as pessoas em situação de rua que querem ficar isoladas durante a pandemia.

“O Governo do Distrito Federal (GDF) vem realizando operações de retiradas de invasões de áreas públicas por toda a cidade. Os 180 servidores das equipes de abordagem social realizam, diariamente, das 7h às 22h, abordagens para explicar os riscos da permanência na rua, os programas, serviços e benefícios socioassistenciais e ainda a condução das pessoas que desejarem seguir para uma das 15 unidades de acolhimento voltadas para s pessoas em situação de rua no DF”, destaca a secretaria.

A pasta ressalta que população em situação de rua, desde maio, pode retirar gratuitamente marmitas em um dos 14 restaurantes comunitários do DF. “As duas unidades dos Centros POP estão funcionando, todos os dias da semana, distribuindo café da manhã e almoço”, informa.

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