metropoles.com

Deputada quer revogar lei que reserva espaço para crianças em pilotis

Júlia Lucy (Novo) afirma que a legislação sobre o tema é inócua e teme que donos de imóveis sejam prejudicados

atualizado

Compartilhar notícia

Google News - Metrópoles
Felipe Menezes/Metrópoles
pilotis Brincalhaço no bloco H da 312 sulL
1 de 1 pilotis Brincalhaço no bloco H da 312 sulL - Foto: Felipe Menezes/Metrópoles

Uma lei de 1998 sobre uso do vão livre dos pilotis no Distrito Federal está na mira da Câmara Legislativa. A deputada distrital Júlia Lucy (Novo) protocolou o Projeto de Lei nº 325/2019 a fim de revogar a legislação que destina parte dos prédios residenciais para recreação infantil. A justificativa da parlamentar é dar mais liberdade aos donos de empreendimentos – no entanto, especialistas alertam para a possibilidade de privatização de área que deveria ser pública.

A Lei nº 2.245, de 31 de dezembro de 1998, de autoria do ex-deputado Edimar Pirineus (PSDB), prevê que “fica destinado à recreação infantil um espaço no vão livre dos pilotis dos blocos das quadras residenciais das regiões administrativas”. A norma proíbe nessas áreas a realização de ações estranhas à recreação infantil, jogos de futebol, passeios de bicicleta e “atividades que possam danificar as instalações prediais ou comprometer o sossego dos moradores”.

“Revogar isso abre um precedente para chegar ao ponto que muitos querem: transformar as quadras em condomínios”, opina o arquiteto Cássio Araújo Monteiro. Para ele, o PL da deputada impacta diretamente no tombamento da capital. “Isso pode encaminhar a expansão das cercas. Abre brecha para construírem o que quiserem embaixo dos blocos, como guaritas, salões de festas, etc”, critica.

A parlamentar do Novo reconhece que sua proposta pode, de fato, servir para os prédios instalarem estruturas nos pilotis. E trata isso, contudo, como algo positivo, além de chamar a legislação de inócua. “O empreendedor poderia colocar uma guarita, um alojamento, alguma coisa que já teria de instalar para o funcionamento do prédio”, defende.

Segundo Júlia Lucy, deixar os espaços livres apenas para recreação cria áreas vazias que deixam de gerar renda para o prédio. “Isso se chama custo de oportunidade”, explica, evocando o linguajar de empreendedores.

A distrital afirma ainda que a obrigatoriedade de se ter um lugar para crianças nas estruturas contraria o princípio do livre mercado. “Se o construtor decidir erguer um bloco pensando só em quem não tem filhos, porque deveria ser obrigado a abrir uma área desse tipo?”, questiona.

Felipe Menezes/Metrópoles

Outra preocupação expressa pela parlamentar é a possibilidade de multa, pois, segundo a deputada, são poucos os prédios que cumprem a legislação. “Se o empresário descumpre, apesar de ser inócua, a fiscalização pode aplicar uma sanção. Não é tão simples deixar uma lei vigente no mundo jurídico sem aplicabilidade. É uma armadilha”, frisa.

Outros casos
O urbanista Frederico Borba Andrade critica tanto a norma original quanto o projeto protocolado por Júlia Lucy. “Não sei ao certo como a lei antiga deveria ser aplicada, se era para existir alguma zona de diversão, cercadinho, mas em Brasília já existe o uso livre dos pilotis, independentemente de regras”, esclarece. Ele ainda questiona o motivo de ir atrás de algo do século passado. “Acho delicado mexer com alguma coisa do fundo do baú como essa. Parece mexer com interesses mais profundos.”

Já o professor de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília (UnB) Frederico Flósculo aprova a iniciativa da distrital. “É uma lei inócua e esse projeto merece até elogio, porque mostra um tipo de rara seriedade na Câmara, que tem muitas peças de qualidade horrorosa que jamais são criticadas”, ressalta.

Para o docente, na época em que Pirineus surgiu com sua lei, não houve o diálogo adequado com a população. “Até coisas com boas intenções podem resultar em coisa ruim. É um caso de infelicidade legislativa. É um exemplo de tolice política”, critica.

Iphan neutro
O uso das áreas comuns embaixo dos blocos do Plano Piloto já suscitou diversas discussões e desavenças na cidade. Em janeiro de 2017, por exemplo, o Metrópoles noticiou em primeira mão o desabafo de uma mãe do Bloco H da 312 Sul que se revoltou com a síndica de seu prédio. A gestora invocou o regimento interno para restringir o direito dos filhos da mulher de brincarem no pilotis.

Giovanna Bembom/Metrópoles

Em dezembro de 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) obrigou a retirada de cercas de ferro dos blocos residenciais no Cruzeiro, o que gerou reclamações de moradores preocupados com a segurança dos locais. A antiga Agência de Fiscalização (Agefis), recém-convertida em DF Legal, também fez diversas ações de retiradas de grades na Asa Sul, em 2012 e 2013, e a reação da comunidade foi similar.

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), responsável por fiscalizar o cumprimento do tombamento de Brasília, alegou que não cabe ao órgão “avaliar as iniciativas legislativas de deputados distritais”. “Nossa atuação ocorre preventivamente quando em situações de ameaça concreta à preservação de bens do patrimônio cultural brasileiro”, complementou, por meio de nota.

O Iphan, contudo, rechaça a ideia de novas estruturas no térreo dos prédios do perímetro tombado, mesmo no lugar onde deveria haver recreação. O órgão fez referência à Portaria nº 166/2016, que delimita o máximo de 30% da área dos pilotis “para portarias, zeladorias, cômodos técnicos e equipamentos de uso coletivo do condomínio.”

Quais assuntos você deseja receber?

Ícone de sino para notificações

Parece que seu browser não está permitindo notificações. Siga os passos a baixo para habilitá-las:

1.

Ícone de ajustes do navegador

Mais opções no Google Chrome

2.

Ícone de configurações

Configurações

3.

Configurações do site

4.

Ícone de sino para notificações

Notificações

5.

Ícone de alternância ligado para notificações

Os sites podem pedir para enviar notificações

metropoles.comDistrito Federal

Você quer ficar por dentro das notícias do Distrito Federal e receber notificações em tempo real?