Decisão polêmica: mirando as eleições, Rollemberg abre torneiras do DF
A medida do governador de acabar com o racionamento a partir de 15 de junho é questionada por especialistas da área e até pela população
atualizado
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Com a mira voltada para a reeleição, o governador Rodrigo Rollemberg (PSB) anunciou, na quinta-feira (3/5), o fim do racionamento no Distrito Federal. Depois de 16 meses com rodízio no fornecimento de água, especialistas na área contestam a brevidade da medida e analisam que dois fatores deveriam ter sido aguardados antes da tomada de decisão: o fim da construção da Barragem de Corumbá IV, próximo a Luziânia (GO), e o término do período de seca na capital.
Assim, a decisão vem acompanhada de um misto de alívio e apreensão. Ao mesmo tempo, especialistas temem uma “rebordosa” com o fim do racionamento em 15 de junho. Afinal, ninguém sabe como estarão os reservatórios no fim da estiagem. Ao tentar agradar os brasilienses com o anúncio feito no momento em que Brasília começa a estação seca, Rollemberg apostou alto: no cálculo eleitoral, poderia até captar mais votos anunciando a normalização do fornecimento num momento mais próximo das eleições de outubro. Mas seria complicado implementar a medida no período em que os reservatórios estarão baixando de nível dia após dia.
Nessa equação, Rollemberg optou por tentar evitar a pecha de “governador do racionamento”. Divulgou o fim do rodízio com um mês de antecedência e às vésperas do período eleitoral.
Para embasar a decisão, Rollemberg considerou as ações tomadas ao longo dos três anos de gestão, como a construção dos sistemas de captação de água do Lago Paranoá e do Subsistema Bananal e o aumento nos índices da Barragem do Descoberto e de Santa Maria. Quando o racionamento teve início, na pior crise hídrica registrada no DF, os índices eram de 19,1% e 41%, respectivamente. No dia anterior ao anúncio da data para acabar com a medida, os sistemas tinham níveis de 90,9% e 56,4%.Para analistas ambientais, no entanto, a decisão foi precipitada. “O racionamento caminhava mesmo para o fim. No entanto, liberar agora os reservatórios sem esperar o fim da seca deixa uma margem muito pequena para que a situação se estabilize”, afirmou o doutor em recursos hídricos, Sérgio Koide.
A previsão do governo é que, em novembro de 2018, o reservatório do Descoberto esteja com 21,9%. “É uma margem muito pequena, muito perto do limite. Se houver qualquer problema, ela se frustra”, disse. A conclusão da barragem de Corumbá IV também deveria ter sido aguardada, analisa Koide: “Se a obra atrasar, o abastecimento pode ficar prejudicado. No entanto, acredito que o governador faz isso com o respaldo da Adasa [Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento do DF]”.
Decisão política
Em geral, analistas – tanto do setor político quanto de recursos hídricos – consideram a decisão muito mais amparada por pretensões de reeleição do que com o embasamento técnico.
“Essa atitude leva a crer que seja eleitoreira porque Corumbá IV ainda não está operando. Na minha visão, o racionamento nunca foi a melhor solução, mas o problema é que, dependendo de como forem as ações, a população vai esquecer que existe uma crise hídrica e ela vai voltar se não houver uma consciência coletiva”, afirmou o doutor em gestão de recursos hídricos e professor da Universidade de Brasília (UnB) Demetrios Christofidis.
Para ele, a superação da crise não se baseia apenas em contar com chuvas ou construir alternativas durante o problema: é preciso ter ações proativas, não reativas. “A população está inchada. Brasília não tem áreas de bacias suficientes para sustentar o pensamento de que o problema acabou. Não podemos pensar: acabou a dificuldade, vamos para a festa. Há a necessidade de mudar o coletivo a longo prazo”, concluiu.
Questionamentos
Na visão do GDF, a polêmica criada após o anúncio do fim do racionamento tem motivação política. “A discussão está contaminada por interesses políticos. Não faz sentido ficar contra o fim do racionamento quando, tecnicamente, todos os fatores determinantes permitem essa atitude”, afirmou o secretário de Comunicação do DF, Paulo Fona.
“O estranho é as pessoas defenderem a manutenção do rodízio sem considerar que a medida prejudica enormemente a população e, particularmente, proprietários de salões de beleza e restaurantes”, completou Fona.
Para ele, as pessoas que criticam a medida tomada pelo governador Rodrigo Rollemberg devem ser as mesmas que, em novembro de 2017, quando o reservatório do Descoberto chegou a 5%, queriam o segundo dia de racionamento. “Caíram do cavalo”, disse.
Ainda segundo o secretário, Rollemberg amparou-se em um estudo da Adasa que será divulgado nesta sexta-feira (4) pela agência. Na análise, foram sugeridas três datas para o fim do racionamento no DF: 1º de junho, 15 de junho e 1º de julho. Rollemberg optou pelo dia 15, quatro meses antes das eleições de outubro.
Enquete
Em meio à discussão, a população também tem opiniões diversas. Enquete realizada pelo Metrópoles no Facebook, com votação de 615 pessoas até as 23h de quinta (3), apontava que 66% dos participantes eram contra o fim da medida neste momento. Outros 34% se posicionavam a favor.
E nas ruas?
Alertas
Apesar de o governador receber os benefícios do fim do racionamento em um primeiro momento, o cientista político Aurélio Maduro de Abreu avalia que, a longo prazo, a medida pode se reverter negativamente, uma vez que os argumentos usados pelo GDF são frágeis.
“Será fácil provar, nas vésperas das eleições, por exemplo, que as barragens podem estar abaixo dos níveis previstos pelo governador, o que será facilmente explorado por adversários na campanha, principalmente sobre a falta de planejamento do governo em relação à questão hídrica no DF”, diz Abreu. Vale ressaltar que as eleições ocorrem em outubro, um mês depois do período mais severo de seca vivido historicamente no DF.
O professor do Instituto de Ciência Política (ICP) da UnB Ricardo Caldas não tem dúvidas que o anúncio do fim do racionamento é extremamente positivo para o governador do ponto de vista político. “Claro que a população vai ver com bons olhos. O que nós não sabemos ainda, e eu não tenho números para opinar, é qual será o impacto disso sobre a intenção de voto nele.”
Caldas acredita que haverá um impacto, mas é difícil prever qual. “Pode ser positivo, neutro ou até negativo, porque as pessoas podem achar que ele esperou ano eleitoral para acabar com o racionamento. Em Brasília, temos uma população crítica”.