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Coronavírus: os desafios de pais separados com a guarda na quarentena

O Metrópoles conversou com ex-casais para saber como está a convivência com os filhos em tempos de pandemia do novo coronavírus

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O isolamento social motivado pela pandemia do novo coronavírus exigiu uma radical alteração do modo de vida de todos. Para alguns, uma rotina que exigia esforço se torna ainda mais complicada. Caso de casais separados que compartilham a guarda dos filhos pequenos.

Acostumados a ter direitos amparados pela Justiça, os tutores foram obrigados a rever a tradicional divisão de tarefas entre eles para respeitar a quarentena por causa da Covid-19.

E nem todos têm a sorte de uma solução amigável. O motorista Wendel Vinícius Souza Alencar, de 25 anos, considera mais saudável, tomadas todas as precauções, o revezamento entre os pais. Ele e a ex-mulher, entretanto, ainda não alcançaram um acordo de guarda compartilhada na Justiça.

Com o isolamento, um conflito que já se arrastava piorou. Agora, ambos encontram dificuldade para conciliar a divisão no cuidado com a filha de apenas 1 aninho.

Wendel não vê Ágatha há mais de dois meses. Ele conta que a bebê comemorou o primeiro aniversário em 4 de março. Pelo acordo, a partir de então, poderia passar um dia inteiro com ela.

“Passei cerca de quatro horas com a Ágatha no dia 7 de março, quando a encontrei. Depois disso, não consegui mais vê-la”, lamenta Wendel.

De acordo com o pai, o isolamento social não afeta o direito de ele ver a garotinha. “A mãe dela está dificultando as coisas. Não permite que eu a encontre e usa o argumento de que está em casa com a família, em quarentena, e não pode correr o risco de uma possível contaminação. Só me disse que, na casa dela, ninguém sai e nem entra”, explica.

“E se esse vírus durar mais um ou dois anos? Vou ficar todo esse tempo sem ver ela?”, questiona. O medo de Wendel é não acompanhar o crescimento e a fase de descobertas da criança.

“Desde que a gente se separou, eu sempre quis estar presente o máximo possível. Isso pode causar consequências no futuro. Os filhos crescem com traumas por não ter tido a presença do pai ou da mãe. A minha família também está sendo privada do convívio com a Ágatha e quero os meus direitos de pai. Estou sofrendo.”

O jovem pretende procurar apoio de um advogado. “Se hoje eu tivesse a oportunidade de entrar com uma ação, eu faria. Quero um advogado que realmente aceite me ajudar a resolver tudo isso. Me sinto muito frágil e prejudicado com essa situação”, desabafa.

Veja o depoimento do pai:

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Wendel não quer perder a fase de descobertas da pequena
Nascimento de Ágatha
Wendel com Ágatha
Ágatha tem um ano e dois meses
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Pai fala que, com a pandemia, não consegue ver a filha há mais de dois meses

Material cedido ao Metrópoles/Arquivo pessoal
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Wendel não quer perder a fase de descobertas da pequena

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Nascimento de Ágatha

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Wendel com Ágatha

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Ágatha tem um ano e dois meses

Material cedido ao Metrópoles/Arquivo pessoal

Visita liberada

Sem querer se identificar para preservar as famílias e não gerar atrito nas relações pessoais, uma mãe de duas crianças com pais de relacionamentos distintos, de 4 e 8 anos, também falou ao Metrópoles sobre os desafios em tempos de pandemia.

De acordo com ela, desde que os decretos com as regras para ficar em casa foram publicados, os pais das duas crianças não foram mais visitar os filhos.

“Não houve combinado de que eles não poderiam vir por medo de contaminação ou algo relacionado ao coronavírus. Um deles comunicou que não viria pela segurança da filha. O outro, pai do menor, faz chamada de vídeo para vê-lo, vez ou outra.”

Ainda segundo a mulher, a situação é complicada porque ela gostaria que os pais estivessem ajudando nas tarefas e mantendo contato com as crianças.

“A gente poderia dividir 14 dias (período para a doença se manifestar) em cada casa. Eles perguntam pelos pais, sentem saudades. Tenho medo de abalar o emocional das crianças. Poderiam vir também para dar um tchau pela janela. Ou se mostrar presente. Não acho ideal isolar”, opina a mãe.

Assim, ela fica em casa sozinha com as crianças. “Amo os meus filhos e jamais iria brigar por isso, mas lidar com as responsabilidade de casa, trabalho remoto e do cuidado integral deles não é missão fácil”, argumenta.

“A crise mexe com o nosso emocional e, em certos momentos, eu me sinto exausta. Além da rotina de um lar, tem comida, cuidados com a higiene. Você precisa criar condições, atividades, e as opções vão ficando escassas. Dividir a responsabilidade seria razoável”, completa.

Direito da família

A especialista em direito da família Renata Gonçalves e Silva diz que, de fato, o contexto atípico da pandemia não costuma estar previsto em nenhuma negociação de guarda ou convivência. “Por essa razão, a gente tem visto uma maior movimentação dos pais sem saber como lidar com essa situação”, argumenta a advogada.

“É claro que para o antigo casal que já tinha uma situação muito litigante e aguerrida, a tendência é que se agrave”, acrescentou a defensora.

A especialista lembra que muitos pais não têm diálogo. E ela revela que muitos se aproveitam da situação para praticar a alienação parental, proibindo até ligações.

“Nesses casos, o Judiciário terá que ser buscado. Se o direito de visita em período de quarentena não foi exercido, aquele pai ou mãe que se sentiu prejudicado terá que fazer valer seus direitos. Se já possuir direito de convivência regulamentado, por decisão ou acordo, poderá cumprir a decisão.”

Segundo Renata, é mais conveniente que se tente uma divisão dos cuidados com os pequenos. E recomenda, em qualquer situação, mas principalmente nesta situação difícil de pandemia, o bom senso.

“Também seria bom avaliar se algum dos responsáveis mora com alguém nos principais grupo de risco. Nesses casos, a orientação, em geral, é que um dos genitores deverá suportar o cuidado integral com os filhos até o fim das medidas de isolamento”, exemplifica.

A advogada afirma que, se não houver exposição a grupo de risco, o ideal é que se busque assegurar o direito da criança e do adolescente à convivência com ambos os pais. “De uma forma geral, crianças maiores podem permanecer mais tempo em cada casa, como no período de férias. Isso diminuirá o trânsito delas.”

Suspensão

Em decisão no último dia 24 de abril,  a 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) suspendeu o direito de um pai visitar os filhos, que estão sob a guarda da mãe, em decorrência do novo coronavírus. De acordo com a assessoria do TJDFT, a determinação vale até junho. O processo segue em segredo de Justiça.

Segundo a Corte, o pai das crianças havia pedido a guarda alegando abandono por parte da mãe. Conseguiu, em primeira instância, o direito à guarda compartilhada. Após a decisão ser revista por um desembargador – não revelado pela assessoria –, o direito voltou para a mãe.

Com isso, as visitas foram marcadas apenas para os sábados, sempre em horário combinado. Entretanto, em decorrência da pandemia, o desembargador determinou que os encontros presenciais só voltem a acontecer a partir de junho. Até lá, o pai terá que se contentar a ver os filhos por videochamadas.

“Entretanto, em virtude das medidas sanitárias atualmente adotadas pelas autoridades governamentais na tentativa de impedir a disseminação do Covid-19, evitando expor as crianças ao risco de contaminação, as visitas paternas presenciais ficarão suspensas até junho de 2020, devendo ocorrerem via videoconferência, pelo menos, por uma hora uma vez por semana, de preferência aos sábados ou domingos, cabendo a mãe, ajustada com o pai quanto à data e ao horário, disponibilizar os contatos virtuais por whatsapp, skype, zoom etc”, disse o magistrado na decisão.

Também em abril, outra decisão da Justiça suspendeu as visitas de outro pai à filha, mas a pedido do próprio pai. Em decisão liminar, a 8ª Turma Cível do TJDFT determinou a suspensão temporária durante o período de isolamento social determinado pelo Governo do Distrito Federal.

O pai fez a solicitação com o argumento de que vive com os pais idosos, incluídos, portanto, no grupo de risco. Por isso, teve receio de que o contato com os filhos, que convivem com outras pessoas, pudesse levar perigo aos avós.

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