Coronavírus: sem clientes, motoristas de app migram para delivery
Transporte de passageiros teve queda de 80% durante isolamento social, mas serviço de entregas não fecha as contas dos trabalhadores
atualizado
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Para pagar as contas durante a crise do novo coronavírus, motoristas de aplicativo passaram a fazer delivery. O isolamento social derrubou o faturamento com traslados de passageiros em 80%, segundo estimativas do Sindicato dos Motoristas Autônomos de Transporte Privado Individual por Aplicativos do DF (Sindmaap-DF). Mas as entregas em domicílio, embora sejam uma alternativa neste momento de crise, rendem pouco dinheiro.
Casado e pai de quatro filhos, o motorista de aplicativo Paulo Oliveira, 43 anos, começou a fazer entregas em domicílio há duas semanas. Antes da crise, batia a meta de faturamento diário de R$ 350 para o sustento da família.
“Optei pela minha saúde. Escolhi as entregas. Mas o faturamento é baixo, ganho em média R$ 50 por dia com delivery. Não posso sustentar isso por muito tempo. Vou acabar voltando para os passageiros, mas não tem ninguém na rua”, lamentou.
Na manhã de terça-feira (31/03), ele faturou somente R$ 23,05. Segundo Paulo, os serviços de entrega priorizam motoboys e ciclistas. Quem dirige carro geralmente é preterido.
A crise atinge vários outros setores. O turismo, por exemplo, parou no DF. Bares, hotéis, restaurantes e demais comércios também sentem a queda vertiginosa no número de clientes.
Veja história do motorista de aplicativo:
“Governo e empresas precisam encontrar o meio-termo. É necessário cuidar da saúde, mas é preciso cuidar dos empregos. Ou as pessoas vão morrer do vírus ou vão morrer de fome”, acredita Paulo Oliveira.
Para o motorista, desde que com respaldo técnico de especialistas, o governo poderia permitir a reabertura de parte do comércio e serviços. As portas seriam abertas com ações de prevenção contra a disseminação da doença. “Queremos voltar a trabalhar”, enfatizou.
Crise
A motorista de aplicativo Ana Claudia Andrade, 39, também trocou as rotas com passageiros pelo delivery. Mãe solteira de quatro meninas, ela buscou nas entregas uma alternativa para a crise. No entanto, em três dias de trabalho, faturou só R$ 136.
Ana Claudia conta que clientes também acionam os aplicativos para atuar com serviço delivery. “Fui chamada para fazer uma entrega da Asa Sul para o Jardim Botânico. Mas, na volta, não temos chamadas. Ou seja, perdi metade do meu lucro”, pontuou.
“Só está na rua quem precisa. Se ficar em casa, vai dar o quê para os seus filhos comerem? O rico fica fazendo pedidos, e o pobre, com fome”, desabafou. A doença também afeta a segurança pública. Uma onda de furtos assusta comerciantes.
Ovos de Páscoa
A motorista de aplicativo Ana Maria dos Santos, 49, interrompeu as viagens. Ela tem pressão alta e faz parte do grupo de risco de pessoas que estão mais vulneráveis ao novo coronavírus. Para conseguir comprar comida e alimentar os dois filhos, decidiu preparar ovos de Páscoa.
“Vou fazer ovos de Páscoa e entregá-los também”, disse. Segundo Ana, os colegas que estão trabalhando com passageiros têm sofrido bastante. “Tenho um amigo que volta do trabalho e não abraça o próprio filho. Fica confinado no quarto.” E conclui: “Nós temos que cuidar da higienização, sim, mas as pessoas precisam trabalhar”.
35 mil pessoas
Segundo o presidente do Sindicato dos Motoristas Autônomos de Transporte Privado Individual por Aplicativos do DF (Sindmaap-DF), Marcelo Chaves, existem 35 mil trabalhadores registrados no serviço no Distrito Federal.
De acordo com Chaves, o Governo do DF (GDF) está correto em adotar medidas para conter e enfrentar a Covid-19. Mas ele cobra um pacote de ações para assegurar a renda dos trabalhadores.
Motoristas de aplicativo pedem socorro:
“O motorista de aplicativo pode ser contratado para transporte dos servidores para hospitais, evitando o risco de contágio em viagens pelo transporte público. A França fez isso. Também trabalhar com viagens pré-contratadas pelo GDF como um todo”, sugeriu.
Mais uma sugestão é a liberação de linha de financiamento para os condutores de app pelo Banco de Brasília (BRB). Como grande parte dos motoristas não é microempreendedor individual (MEI), o dinheiro seria liberado após a apresentação do contrato de prestação de serviço por aplicativo.
Questionado pela reportagem, o GDF não havia se manifestado até a última atualização deste texto.