Coronavírus: Brasília completa 60 anos entre o medo e a esperança
Neste 21 de abril, o Metrópoles traz histórias de quem superou a Covid-19 e de pessoas que ainda lutam contra a doença
atualizado
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Brasília completa 60 anos neste 21 de abril de uma maneira que Juscelino Kubitschek, Lucio Costa e Oscar Niemeyer jamais poderiam imaginar. Com as ruas tão vazias quanto na época da inauguração, desta vez não é a dificuldade de se chegar ao centro do Brasil que espanta as pessoas, mas uma doença nova e mortal: a Covid-19.
Apesar de registrar 24 mortes e 879 infectados até a noite dessa segunda-feira (20/04), há motivos para acreditar que a sexagenária capital voltará ao habitual “caos” urbano, com muitos trabalhadores e veículos nas ruas, pois um outro dado traz esperança: 466 pessoas estão recuperadas da Covid-19.
O ex-combatente do Exército durante a 2ª Guerra Mundial Ermando Armelino Piveta, 99 anos, emocionou a cidade na última semana ao deixar o Hospital das Forças Armadas (HFA) plenamente livre do mal que tirou a vida de 2.575 brasileiros até essa segunda-feira.
O tenente reformado é considerado, pelo Ministério da Saúde, o paciente mais velho do Brasil e se curar da Covid-19. Pioneiro de Brasília, Ermando pisou em solo candango em 1958, quando passou a morar em Luziânia (GO) e trabalhou com nivelamento de terra na área onde foi erguida a Esplanada dos Ministérios. Isso, depois de ter enfrentado campos minados na Segunda Guerra Mundial, que terminou em 1945.
Depois de uma breve passagem pelo Mato Grosso em busca de diamantes no garimpo, Ermando voltou novamente para a cidade que ajudou a construir. Trabalhou na antiga Fundação Hospitalar até passar no concurso para o Ministério da Agricultura, onde ficou lotado até se aposentar.
Conforme conta uma das filhas dele, Grace Piveta, 61, Brasília se tornou parte indissociável da família. “A gente viu toda a transformação da cidade. A Catedral nem tinha vidro ainda, a Torre de TV não tinha todo aquele glamour e as feiras ocorriam embaixo dela, bem diferente de hoje”, lembra.
Para ela, a recuperação do pai, quase centenário, de uma doença ainda pouco conhecida pela medicina, pode ser um sinal de dias melhores para a capital que chega aos 60 anos. “A gente espera um futuro esplendoroso. Amo meu país e amo Brasília, assim como meu pai”, resume.
Ermando contou as lembranças dele da construção da capital e fez um pedido nas comemorações dos 60 anos, confira:
“Vamos sair mais fortes”
Outro que chegou a Brasília nos primeiros anos da sua fundação e se recuperou da Covid-19 é José Celso Gontijo, 75, dono de uma das principais construtoras da cidade. Ele foi contaminado após participar de uma reunião com o presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (DEM-AP)
Apesar de ainda estar assustado com a agressividade da doença, ele diz manter a esperança de poder voltar a ajudar a reerguer a capital do país, que teve sua economia fortemente desestabilizada após a pandemia.
“Nunca faltei um dia de trabalho, mas, com esta doença, fiquei com febre, dores no corpo, mal-estar e perdi o paladar, mas ainda bem que passou para mim e tenho certeza que Brasília vai sair mais fortalecida desta crise. Sou otimista”, afirma.
Mais jovem, mas não menos ligado à capital, Caio Quemel, 24, também sofreu com o coronavírus. O brasiliense precisou ficar três semanas afastado de familiares. No período mais difícil, ficou internado na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI).
Feliz por estar recuperado, o personal trainer aguarda o dia em que poderá voltar a trabalhar na cidade que nasceu e que tanto ama. “Sinto falta de fazer exercícios ao ar livre e voltei a treinar em casa. Eu passei por essa e a cidade vai passar também. Tenho fé”.
O medo
Enquanto centenas de pessoas demonstram alívio por se recuperar da Covid-19, outras tantas ainda sentem dor e medo. É o caso da publicitária Luciana Campos, 36. Ela e o marido, que é técnico em enfermagem de um hospital particular, foram diagnosticados na semana passada com Covid-19.
Luciana diz que o marido está melhor, mas ela ainda segue prostrada na cama. “É uma doença que suga todas as suas forças. Sinto muita dor no corpo e a tosse não passa. O meu maior medo é piorar e parar em uma UTI, mas peço a Deus todos os dias que isso não aconteça.
Um mês longe dos filhos
Na linha de frente no combate à Covid-19, a enfermeira Gabriela Alves Rodrigues tomou uma atitude ainda mais severa: está longe do marido e dos filhos há um mês. Ela está em casa, sozinha, enquanto o restante da família foi morar com a sogra. “Não tem sido fácil”, destaca.
Ela conta que, no trabalho, muita coisa também mudou. Além dos treinamentos constantes, o medo e a angústia passaram a fazer parte da rotina. “Pensamos, o tempo todo, que nossos familiares e colegas de trabalho podem adoecer e até morrer por isso”, destaca ela, dizendo que tem recebido apoio psicológico no Hospital de Base, onde trabalha.