Cooperativa dá calote no GDF e quer expulsar moradores de condomínio
Ao descobrirem que dinheiro repassado à entidade não era usado para quitar IPTU do parcelamento, condôminos suspenderam pagamento
atualizado
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O Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), o Ministério Público Federal (MPF) e a Polícia Civil investigam dirigentes de uma cooperativa suspeitos de desviar dinheiro do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) de centenas de moradores do Condomínio Monte Verde, no Incra 9, em Ceilândia. Segundo a denúncia, os proprietários dos terrenos pagaram, por anos, o tributo via boleto bancário, mas a Cooper Monte Verde, que administra o setor habitacional, não repassou os valores à Secretaria de Fazenda.
Sem considerar juros e correções monetárias, a dívida com o Governo do Distrito Federal (GDF) gira em torno de R$ 4 milhões. Ao descobrir que as prestações não estavam sendo usadas para quitar o tributo dos cerca de 400 lotes, a maioria dos condôminos suspendeu os pagamentos. A medida, no entanto, causou reação imediata da entidade. Em uma assembleia com apenas 10 membros – todos ligados à gerência da Cooper Monte Verde –, a direção expulsou cerca de 100 pessoas do quadro de cooperados. Por ironia, alegou “inadimplência”.
Pela proposta dos dirigentes, esses moradores teriam de deixar o condomínio, mas só iriam ser ressarcidos em 50% do que investiram nos imóveis, ainda assim, desde que apresentassem as notas fiscais dos materiais comprados para construir as casas.
O policial militar Raimundo Evangelista Filho, 44 anos, recorreu à Justiça quando percebeu que havia uma dívida de IPTU no valor de R$ 34,5 mil. Embora tenha efetuado o pagamento de todas as parcelas do terreno e do tributo, ele foi incluído no rol de inadimplentes e excluído da cooperativa. Apesar de ter saído vitorioso no processo judicial, o PM teme por novos prejuízos. “Ainda cabe recurso e, se a Justiça me acionar, terei de quitar essa dívida imediatamente. Ou seja, vou pagar por algo que já paguei. É um desrespeito.”
O terreno onde fica o condomínio era uma fazenda de 47 hectares. Em 2007, foi comprada pela Cooper Monte Verde, fracionada e vendida. Os lotes têm mais de 500 metros cada e abrigam, em sua maioria, servidores públicos. O aposentado Nauiles Ramos de Jesus, 67 anos, adquiriu uma gleba no local, pagou todas as prestações e honrou religiosamente o IPTU. Mesmo assim, foi excluído da cooperativa e, agora, teme perder a propriedade. “Não tem diálogo. Simplesmente estão exigindo que a gente continue pagando por algo que não é repassado ao governo. Estamos muito inseguros com esse processo todo”, lamenta.
O Metrópoles teve acesso a um relato encaminhado ao MPF. Veja:
A fim de acompanhar o imbróglio, um grupo criou a Associação dos Moradores do Condomínio Monte Verde (AMCMOVE). Nomeado presidente da entidade, Rogério Ferreira, 38 anos, diz que os moradores procuraram a Secretaria de Fazenda e solicitaram que o IPTU seja transferido do nome da cooperativa para cada um deles. “A transferência é possível, mas teríamos de pagar todo o débito do IPTU do lote.”
Rogério reclama da falta de transparência com as finanças da cooperariva por parte da administradora e da ausência de diálogo com os responsáveis.
Não tem livro de prestação de contas e a sede da diretoria só fica fechada. Eles simplesmente deixaram de dar satisfação aos moradores
Rogério Ferreira, presidente da Associação dos Moradores do Condomínio Monte Verde
O delegado-chefe da 24ª Delegacia de Polícia (Setor O), Ricardo Viana, disse que os responsáveis pela Cooper Monte Verde, testemunhas e moradores começaram a ser ouvidos no inquérito policial, mas preferiu não revelar detalhes a fim de não atrapalhar o andamento das investigações. O promotor de Justiça Ericson dos Santos Cerqueira afirmou, por meio da assessoria de comunicação do MPDFT, que só se manifestará quando o inquérito retornar ao Ministério Público.
A reportagem do Metrópoles ligou e deixou recados para o presidente da cooperativa, Alair Gonzaga, mas ele não atendeu nem retornou os contatos. A Sefaz disse não poder comentar o caso em razão do “sigilo fiscal”, mas orientou os condôminos lesados a solicitar o parcelamento administrativo do débito nas agências da Receita ou por meio do portal da pasta
Caso semelhante
No último dia 30 de julho, os administradores da Construtora Aires Costa e da Cooperativa Habitacional e de Serviços Nacionais (CSN) foram condenados pelos crimes de gestão temerária e contra a economia popular. A sentença, proferida pela 3ª Vara Criminal de Taguatinga-DF, mostra que, de 2001 a 2013, Ricardo Martins Moreira Júnior e Cláudia Rossane Neiva Martins prejudicaram mais de 380 famílias no DF.
Os dois proprietários das empresas são casados. Ricardo foi condenado a 5 anos e 4 meses de detenção e Rossane a 2 anos e 6 meses mais multa. Eles cumprirão a pena em regime semiaberto. A denúncia foi apresentada pela 4ª Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor (Prodecon).
Segundo o Ministério Público, Ricardo e Cláudia receberam os pagamentos dos consumidores referentes à construção dos empreendimentos imobiliários Cristal do Parque, Portal do Parque, Mirante do Parque, Golden Parque e Quálitas. No entanto, eles não cumpriram com as obrigações financeiras junto à Terracap e a Secretaria de Fazenda do DF e nem cadastraram as incorporações perante o registro de imóveis. Com isso, as famílias não puderam obter as escrituras públicas de suas propriedades.