GDF mantém abandonada obra que já custou R$ 17 mi ao contribuinte
Inauguração do centro para jovens infratores em Brazlândia estava prevista para 2014. Atual governo não investiu na construção
atualizado
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Às margens da BR-251, em Brazlândia, uma construção dá sinais de que abriga pessoas em conflito com a lei: guaritas, muros, arame farpado e localização isolada de áreas residenciais. Entretanto, o espaço, inabitado, remete a um cenário de filme de terror. Está cercado de mato alto, tem ferrugem e mofo na estrutura, resultados dos efeitos de sol e chuva após três anos e sete meses de abandono.
O local deveria ser o “lar” de até 90 adolescentes infratores do sistema socioeducativo do DF. Mas, hoje, apenas escancara desperdício de dinheiro público por parte do Governo do Distrito Federal (GDF). A inauguração da Unidade de Internação de Brazlândia (Uibra) estava prevista para junho de 2014. Quatro anos e quase R$ 17 milhões depois, a obra está deteriorada e ao léu.
A Uibra é uma das unidades que integram o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado em 2012 entre GDF, Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT), Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT).O problema, que vem desde a gestão de Agnelo Queiroz (PT), acentuou-se com Rodrigo Rollemberg (PSB). O atual governador não empenhou sequer um centavo na conclusão do centro de internação.
O documento determina a construção de sete locais de internação e 15 de sistema meio aberto, como parte do processo de desativação do Centro de Atendimento Juvenil Especializado (Caje). Sete anos depois, apenas seis unidades foram erguidas.
Atraso
A construção da Uibra está interrompida desde 29 de outubro de 2014, no fim da gestão Agnelo. Mais de um ano depois, em dezembro de 2015, a Construtora RV Ltda, responsável pela obra da Uibra, pediu recuperação judicial – medida legal utilizada para viabilizar superação de crise econômico-financeira e tentar evitar falência.
O TJDFT deferiu a solicitação em fevereiro de 2016 e determinou a suspensão das ações ou execuções contra a companhia. Desde então, o rombo nos cofres da RV só aumentou e, em agosto de 2017, a Justiça decretou a falência da empresa.
O Metrópoles foi ao local onde a construtora funcionava, no Lago Sul, mas não há vestígio de que um dia a companhia existiu ali. A reportagem também tentou contato por telefone, mas não logrou êxito.
Em novembro, três anos após a interrupção da obra, a Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil (Novacap) abriu novo edital de licitação para contratação da construtora: desta vez, da Engemega Ltda. O processo está em fase final, segundo a Novacap. A companhia acrescenta que o prazo para conclusão do empreendimento é de quatro meses, ao custo de R$ 3,5 milhões, após assinatura do acordo. Assim, a despesa total da construção vai ultrapassar R$ 20 milhões.
A falência da RV desencadeou atrasos em outras obras públicas no DF. Uma delas é a do novo prédio da Procuradoria-Geral do Distrito Federal (PGDF), localizado no Setor de Administração Municipal (SAM), atrás do Palácio do Buriti. A construtora tinha um contrato com o GDF de cerca de R$ 20 milhões. A RV também estava encarregada da construção da Penitenciária Federal de Brasília, no Complexo Penitenciário da Papuda. O custo total do empreendimento chegou a R$ 39 milhões.
Melhoria
Servidores socioeducativos avaliam que a inauguração da Uibra é urgente, traria benefícios e solucionaria uma série de problemas do sistema. “A nova unidade demandaria a nomeação dos aprovados no concurso de 2015. Somada à transferência de internos para a Uibra, amenizaria a desproporção de adolescentes para cada agente”, exemplifica um servidor da Unidade de Internação de Santa Maria (Uism), sob condição de anonimato, temendo retaliação.
O agente relembra o episódio mais recente de fuga do sistema, o qual poderia ter sido evitado, segundo ele, se houvesse menor disparate entre o número de internos e socioeducadores. Na ocasião, quatro adolescentes da Uism fugiram do Centro Olímpico de Santa Maria, em 21 de maio, quando disputavam torneio de futebol.
Doze internos da unidade eram monitorados por seis agentes, apesar de o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase) – que regulamenta como o poder público presta atendimento a crianças e adolescentes autores de ato infracional – recomendar dois socioeducadores para cada adolescente. Essa proporção deve ocorrer em casos que envolvem alto risco de fuga, de autoagressão ou violência contra outros.
Segundo a Secretaria de Políticas para Criança, Adolescente e Juventude do Distrito Federal (Secriança-DF), três das seis unidades abrigavam mais internos que a capacidade, até o último dia 24. Na de Planaltina (UIP), cabem 84 menores, mas hoje há 89. Na Unidade de Internação Provisória de São Sebastião (Uipss), 184 adolescentes ocupam espaço com lotação de 180.
Em Santa Maria (Uism), no módulo reservado para internos do sexo masculino, há 124 deles. Porém, o lugar deveria comportar apenas 100. Além disso, essa unidade abriga também 21 adolescentes infratoras e isso desrespeita norma do Sinase.
O texto veta que pessoas de gêneros diferentes sejam mantidas no mesmo local do sistema, ainda que ocupem módulos separados. Para solucionar esse problema, uma unidade está em construção no Gama e deve abrigar menores infratoras.