Conheça o surpreendente trabalho dos cães das polícias do DF
Companheiro do ser humano no trabalho contra o crime, o dia a dia dos animais envolve operações arriscadas e treinamentos intensos
atualizado
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Falcão é um pastor-belga malinois de 1 ano e meio. Quando filhote, era o menor da ninhada, mas já chamava atenção pela persistência e determinação. “Apesar do tamanho, não desistia de brincar com os demais cachorros do canil”, conta o agente Sanlac Machado. O cão cresceu, ficou robusto, enérgico, e, em menos de dois meses de atuação na Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF), apreendeu mais de 40 quilos de drogas e duas armas de fogo.
Ele foi o primeiro, de três animais, a terminar o treinamento da sessão de cinofilia da Divisão de Operações Especiais (DOE) — outros três estão em formação. A unidade foi inaugurada em agosto deste ano e soma-se aos trabalhos realizados pelo Batalhão de Policiamento com Cães (BPCães) da Polícia Militar — que conta com 56 cachorros. Em reportagem, o Metrópoles acompanhou a rotina dos perros que realizam funções de grande importância nos órgãos de segurança pública do DF.
O momento decisivo para Falcão conquistar Machado — que é o chefe da sessão da DOE — foi quando, mesmo pequeno, conseguiu saltar até a mão do policial e dar-lhe uma mordida nos dedos. O animal foi levado para o canil da entidade. Cerca de 1 ano e 4 meses depois, teve sua primeira participação numa operação real.
Um dos casos marcantes do cachorro foi quando a PCDF prendeu um traficante de Brazlândia, em setembro. O homem aliciava menores para tráfico de drogas e prostituição, ameaçando as meninas de morte. Falcão foi o responsável por encontrar a arma do criminoso, feito fundamental para fechar o ciclo da investigação.
Os cães entram em cena quando o trabalho se mostra muito difícil de ser realizado por um policial. Além de atuarem em lugares tóxicos ou insalubres para pessoas, eles conseguem encontrar entorpecentes e munições em espaços que ultrapassam os limites da percepção humana.
Antes de adentrarem o ambiente, os agentes fazem uma verificação de segurança. A preocupação com a integridade física dos bichos é muito grande e não pode haver nada que cause dano.
O trabalho desses animais é fundamental. Um cachorro consegue identificar milhares de tipos de odores a mais que seres humanos. O tempo médio que levam para detectar drogas e munição nas buscas não é maior que cinco minutos, agilizando — e muito — o trabalho da polícia.
Ambas as forças de segurança do DF estão constantemente buscando aprimorar o conhecimento na área, participando de seminários e palestras pelo Brasil ou no exterior. Na Civil, os animais são especializados na busca de armas, drogas e munições. Na PM, as formações se estendem a controle de massas, policiamento, captura de pessoas e rastreamento de explosivos.
Nesse contexto, o convívio entre pessoas e cachorros é diário. “O policial tem que fazer parte da matilha”, resume o subtenente Ademar Barros, comandante da companhia de treinamento do BPCães. A relação acaba indo além da profissional e toma uma proporção afetuosa. “Conhecemos muito bem os cães e suas rotinas.” A unidade da PM foi fundada oficialmente em 2011, mas atua desde 1968.
Adaptação e treino
Os filhotes começam o treinamento aos 35 dias de idade, e os que estão aptos a se tornarem farejadores podem ser identificados no 10º mês de vida. São poucos. Mesmo entre os pastores-belgas, uma das principais raças utilizadas nessa função, o percentual é de apenas 8%. As características requeridas são muitas. Coragem, perseverança, foco e sociabilidade são indispensáveis.
A primeira fase do treinamento é crucial e dura aproximadamente um ano. O foco é fazer com o que o cachorro desenvolva um grande interesse em brincar, o que será útil posteriormente. “Para eles, é sempre uma brincadeira. Se não for algo prazeroso, o cão não vai querer fazer”, explica Sanlac. O estímulo por meio de atividades é constante e os exercícios físicos são puxados.
Nessa etapa, é feita também a adaptação a ambientes, pessoas, ruídos e objetos. Dessa forma, é possível prevenir imprevistos, como um cão se assustar com barulhos de tiro no meio de uma operação ou não querer entrar em lugares desconhecidos.
Ao atingir a maturidade, é hora de o cachorro ser preparado para a ação real. Passam meses aprendendo que, ao identificarem determinados odores, serão recompensados. Por exemplo: se o animal encontra a droga pelo cheiro, ele imediatamente recebe a bolinha com a qual está acostumado.
Daí surge um mito popular comum: o de que os cães seriam viciados nas substâncias. Na verdade, conforme destaca o subtenente Ademar, eles não têm nenhum contato direto com os entorpecentes, seja nos treinos ou nas operações.
Ele destaca ainda que o verdadeiro aprimoramento acontece nas ruas, diariamente, e que é fundamental que o policial entenda o comportamento canino. “Outra aspecto importante é que os nossos cachorros não atacam. Eles protegem e defendem. São coisas muito distintas.”
Aposentadoria
Depois de aposentados, os cachorros são doados aos policiais, que se comprometem a ter o máximo de cuidado com os animais. Com 8 anos de idade, Kaleo deve deixar em breve do BPCães, mas a contribuição que prestou à Polícia Militar ao longo do tempo de serviço é inestimável.
Kaleo atua principalmente na busca de entorpecentes. Só em setembro deste ano, apreendeu 100 quilos de maconha, um número muito acima da média. Assim como vários, ele é capacitado também para o policiamento.
Recuperação
O cão de faro Django não pertence à PCDF, mas auxilia nas buscas da 30ª Delegacia de Polícia (São Sebastião). Ele mora com o treinador Ricardo Textor desde que nasceu. Hoje, com 3 anos de idade, coleciona apreensões pela corporação. Só em 2018, foram 10.
Django teve destaque na mídia após ficar 18 dias desaparecido, quando fugiu do canil onde estava, em Sobradinho. O animal foi encontrado 11kg mais magro, desidratado e machucado. Segundo Textor, ele está se recuperando bem e deve ser liberado da internação em breve.
Aspirante
A cadela Suri, de 8 meses, está em treinamento. Ela veio para Brasília com o subtenente Araújo, do 16º Batalhão da Polícia Militar de Goiás, do município de Formosa, e os soldados Aurélio e Gabriel. No momento, a equipe realiza um curso em conjunto com a PMDF.
Em três semana de adaptação, Suri demonstrou um crescimento excepcional. Ela é capaz de focar na busca em diferentes tipos de ambientes sem se ater às distrações. Ruídos e movimentação não são obstáculos para que ela realize seu trabalho. “Está evoluindo a passos largos”, definiu o subtenente.
Assim que estiver apta, Suri retornará a Formosa e começará a atuar em operações no estado goiano.